Descubra no artigo de hoje quais são as regras para fazer um inventário extrajudicial com herdeiros incapazes

 

Inicialmente é preciso relembrar que desde 2015 a questão da incapacidade de que trata o código civil sofreu uma verdadeira revolução por ocasião da lei 13.146/2015 – estatuto da pessoa com deficiência. Como alertam os ilustres professores Stolze e Pamplona (novo curso de direito civil. 2022),

 

“(…) a partir de sua entrada em vigor, a pessoa com deficiência – aquela que tem impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, nos termos do art. 2º – não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz, na medida em que os arts. 6º e 84, do mesmo diploma, deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa.”

 

Absolutamente incapazes e relativamente incapazes

 

Como se vê dos arts. 3º e 4º do código civil, agora só podem ser considerados absolutamente incapazes os menores de 16 (dezesseis) anos e relativamente incapazes os:

 

  1. Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
  2. Os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
  3. aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade, e
  4. os pródigos.

 

Possibilidade da realização do Inventário Extrajudicial vetava

 

A Lei 11.441/2007 ao inaugurar no ordenamento brasileiro a possibilidade da realização do Inventário Extrajudicial vetava os casos onde houvesse interessado/herdeiro incapaz.

 

A vedação foi mantida no CPC/2015 (art. 610) e não foi a Resolução 35/2007 (que regulamentou o procedimento) quem autorizou a realização do Inventário Extrajudicial com herdeiros incapazes.

 

A jurisprudência evoluiu (o que é muito louvável e esperado) e com isso diversos Códigos de Normas Extrajudiciais passaram a admitir a realização do ato.

 

Recentemente por ocasião do Provimento CGJ/RJ 87/2022 (Novo Código de Normas Extrajudiciais do Rio de Janeiro) a realização de tais atos no Rio de Janeiro passou a receber um tratamento expresso que urge ser conhecido pelos colegas advogados já que a solução extrajudicial revela-se medida muito acertada: pela via cartorária é possível resolver casos complexos como inventários, de forma muito mais célere e também por isso, de forma mais econômica e satisfatória.

 

Inventário extrajudicial com testamento

 

Como já acontece com o inventário extrajudicial com testamento válido (que já explicamos aqui também, inclusive) o procedimento extrajudicial com herdeiro incapaz exigirá prévia autorização judicial – o que em nada deverá prejudicar a solução da demanda; para o mais rápido desfecho.

 

Sendo assim, deve o advogado agir com estrita observação às novas regras – obtendo-se alvará judicial, nas regras do art. 725, inc. vii do CPC/2015 c/c art. 447 do NCN.

 

Gratuidade de justiça

 

Ponto importante, inclusive destacado no art. 450 do NCN, como se verá diz respeito à necessidade do recolhimento de custas judiciais para o alvará. Como sabemos, sendo o caso, preenchidos os requisitos legais.

 

A gratuidade de justiça pode ser obtida na via judicial e da mesma forma, para a via extrajudicial, na forma do ato normativo conjunto TJRJ/CGJ 27/2013 – o que também vai englobar os inventários extrajudiciais com herdeiros incapazes.

 

Escritura Pública de Proposta de Inventário e Partilha

 

Conforme as regras do NCN, primeiro os interessados através do advogado deverão obter o alvará perante o juízo orfanológico competente (art. 48, CPC) embasado na minuta de inventário e partilha (art. 448, NCN) – que, na verdade receberá o título de “escritura pública de proposta de inventário e partilha” – produzida pelo tabelião de notas.

 

Ouvido o MP o magistrado homologará ou não a proposta, conforme o caso autorizando ou não, respectivamente a lavratura do ato notarial.

 

Dando sequência, caberá às partes (através do seu advogado) dar solução ao que faltar para a lavratura da escritura de inventário em definitivo (certidões, quitação do imposto causa mortis etc) agora autorizada – que deve fielmente espelhar aquela minuta aprovada judicialmente.

 

Divisão dos bens entre os herdeiros

 

É importante considerar que segundo as regras atuais, nesse tipo de inventário, como regra a divisão dos bens entre os herdeiros deverá ser em frações equânimes, incluindo a meação do cônjuge, se houver – sendo proibida a atribuição de bem individual a quaisquer herdeiros, ainda que de valores idênticos.

 

Para que então esse “condemônio”, ou melhor, condomínio não seja formado obrigatoriamente deverá haver justificativa de forma a evidenciar que não haverá prejuízo ao incapaz, inclusive com juntada de documentos aptos a comprovar o alegado.

 

Esse ponto merece nossas críticas já que não de hoje sabemos que o condomínio pode ser a razão de inúmeras discórdias e conflitos entre os herdeiros no futuro.

 

Como recomenda a boa doutrina, o ideal sempre que possível é atribuir a cada um dos herdeiros bens individualizados na herança, evitando-se a formação de condomínios (“communio est mater discordiarum”) afinal de contas, “condomínio é a mãe da discórdia” como já diziam os romanos…

 

Nova possibilidade e suas regras

 

De toda forma, muito importante conhecer essa nova possibilidade e suas regras:

 

“Art. 447. Em havendo herdeiro incapaz, a lavratura de escritura de inventário e partilha fica sujeita à autorização judicial prévia, a ser processada na forma do artigo 725, VII, do CPC.

 

Art. 448. A escritura de inventário e partilha prevista no caput exige a elaboração prévia de minuta de “inventário e partilha” que deverá conter:

 

I – menção expressa de se tratar de “escritura pública de proposta de inventário e partilha”;

II – declaração expressa dos interessados de que o ato notarial de inventário somente será lavrado após autorização judicial;

III – pedido dos interessados, representados pelo advogado assistente, dirigido ao juízo com competência orfanológica, de alvará autorizando a lavratura do ato;

IV – assinatura dos interessados e do representante legal ou assistente do incapaz; e

V – assinatura do advogado assistente.

  • 1º. A minuta da partilha deverá prever a divisão dos quinhões em frações equânimes, incluindo a meação do cônjuge, se houver, vedada a atribuição de bem individual a quaisquer herdeiros, ainda que de valores idênticos.
  • 2º. A minuta da partilha não equânime e a atribuição de bem individual a quaisquer herdeiros deverá ser devidamente justificada, para demonstrar que não há prejuízo ao incapaz, inclusive com juntada de documentos aptos a comprovar o alegado.
  • 3º. A minuta elaborada dispensa distribuição, sendo necessária apenas a apresentação dos documentos de identificação dos interessados, certidão de óbito e certidões de nascimento ou casamento, comprovando o parentesco.

Art. 449. Elaborada a minuta em duas vias, sendo uma arquivada física ou eletronicamente em pasta própria na serventia, o documento será assinado pelo tabelião e por todos os interessados, os representantes ou assistentes legais do incapaz e respectivos advogados, sendo encaminhada à distribuição perante o juízo orfanológico competente, na forma do artigo 725, VII, do CPC.

 

Art. 450. O procedimento, previsto no artigo 725, VII, do CPC ensejará o recolhimento de custas judicias referentes ao procedimento de alvará judicial.

 

  • 1º. Após oitiva e parecer do Ministério Público, o juízo competente homologará ou não a proposta de inventário e partilha, expedindo o respectivo alvará autorizando a serventia indicada a lavrar o ato notarial, tendo por base a minuta de inventário e partilha apresentada e eventuais acréscimos e observações do juízo competente.
  • 2º. Não sendo homologada a proposta, o tabelião será comunicado para as devidas anotações.
  • 3º. Homologada a proposta, o alvará será apresentado ao tabelião que a lavrou, devendo os interessados providenciar a apresentação das certidões cabíveis, o pagamento do imposto causa mortis e a emissão da declaração de herança por escritura pública expedida pela repartição fiscal.

Art. 451. Estando em ordem a documentação, o tabelião lavrará a escritura de inventário e partilha observando rigorosamente a proposta encaminhada à homologação, com os acréscimos e observações do juízo competente, se houver, a qual deverá ser assinada por todos os herdeiros, incluindo os representantes ou assistentes dos incapazes e do advogado indicado como assistente jurídico.

 

  • 1º. A escritura de inventário e partilha deverá fazer menção expressa à aprovação do juízo sucessório, consignando o juízo e o número do procedimento judicial que autorizou a sua lavratura e a data da decisão e nome do seu prolator.
  • 2º. Em havendo herdeiro único e incapaz, proceder-se-á à adjudicação, seguindo-se o mesmo procedimento do caput.

Art. 452. Os emolumentos devidos serão recolhidos da seguinte forma:

 

I – para a elaboração da minuta será devido o valor de 15% dos emolumentos correspondentes ao inventário e partilha; e

II – além do pagamento referido no inciso I, os interessados deverão realizar o depósito prévio na conta do cartório, referente aos emolumentos do inventário.

  • 1º. Em caso de indeferimento da autorização para lavratura do inventário, o depósito prévio (inciso II) será integralmente restituído aos interessados, mediante recibo.
  • 2º. Deferido o alvará, a escritura deverá ser lavrada perante o notário que confeccionou a proposta de inventário no prazo de 45 dias.
  • 3º. Ultrapassado o prazo, considerar-se-á o ato notarial incompleto, com a perda pelo interessado de 1/3 (um terço) dos emolumentos mantidos em depósito prévio (inciso II)”.

Por fim, não podemos deixar de recordar que inventário extrajudicial não está sujeito a regras de competência tratadas pelo CPC, dessa forma, ainda que o alvará de que trata o referido art. 447 esteja sujeito à distribuição ao juízo orfanológico competente nada impede que a postulação seja feita para que a lavratura da escritura de inventário, seja realizada por qualquer tabelionato do rio de janeiro (já que, recordemo-nos, as regras do NCN valem apenas no estado do rio de janeiro – art. 1º do NCN).

 

Fonte: MV Meu Valor Digital

Deixe uma resposta