Da reforma tributária ao desejo de paz e conforto: o que tem levado os brasileiros a buscar um planejamento patrimonial e sucessório?
Janeiro é o mês em que as pessoas costumam programar seus planos para o ano que se inicia e, ao que parece, a procura por estratégias de planejamento patrimonial e sucessório estará em muitas das resoluções de 2024.
Isso porque, cada vez mais, os brasileiros estão pensando, falando sobre, e inclusive planejando a própria sucessão. Mas, por que?
O que hoje desponta com o nome de planejamento patrimonial e sucessório nada mais é do que um conjunto de estratégias jurídicas que permitem a alguém programar o exato destino que deseja para seu patrimônio.
Seja por meio de testamentos, doações, planos de previdência ou mesmo através das famosas holdings familiares, o ato de planejar uma sucessão consiste em cuidar para que a passagem do patrimônio de uma pessoa a seus herdeiros ocorra da maneira mais bem administrada e resolvida possível1.
Em termos mais informais, o objetivo de um planejamento como esse é deixar “tudo certo”, evitando gastos futuros, e conflitos emocionais e familiares.
O curioso, porém, é que os instrumentos usados para tanto são antigos, mas o movimento jurídico e cultural que faz com que os brasileiros pensem cada vez mais sobre o tema é consideravelmente recente.
Não há como não pensar em algo mais clássico que um testamento, ou algo mais comum que doações de pais para filhos. Por que então, somente nos anos recentes, esses instrumentos têm registrado recordes nos cartórios?2
É claro, algumas situações, mais do que outras, nos instigam a refletir.
Um aspecto relevante sempre será o patrimonial. Afinal, num país que tanto se paga, é sempre delicado aceitar as significativas despesas que podem acompanhar um processo de inventário e partilha de bens de um ente querido.
Aí que o planejamento sucessório surge como uma excelente estratégia para diminuir ou, ao menos, calcular e programar os custos e encargos de uma sucessão, especialmente em se tratando de impostos.
Bastante revelador desse panorama é o fato de que a recém-promulgada reforma tributária tem acelerado (e muito) o número de planejamentos de heranças e doações no Brasil3.
Embora focada no consumo, a reforma trouxe mudanças que oneram o imposto cobrado sobre heranças e doações, o ITCMD, que terá uma alíquota obrigatória de até 8% sobre o patrimônio recebido, em todos os estados brasileiros.
É fácil perceber que estados como São Paulo ou Minas Gerais, que possuem uma alíquota de até 4% e 5%, sofrerão um impacto considerável.
Espera-se que os novos projetos de lei sobre o ITCMD sejam apresentados no decorrer de 2024. Aprovadas, as leis passarão a valer em 2025, o que explica e justifica a iminente procura por planejar heranças e doações com as alíquotas atuais.
Mas há outros aspectos que não dizem respeito somente ao patrimônio, ao menos não diretamente.
Muitas pessoas buscam planejar sua sucessão após percorrer um conflituoso e desgastante processo de inventário de um pai ou de uma mãe, por exemplo.
Fato é, os brasileiros não conhecem os pormenores de uma sucessão legal antes de integrar um processo de inventário: existem regras e custos que hoje são criticáveis e, num momento delicado, podem provocar desavenças indesejadas.
Neste aspecto, o objetivo de um planejamento sucessório pode ser, única ou principalmente, evitar que conflitos e desgastes emocionais aconteçam.
A prevenção de conflitos, aliás, é uma excelente medida de proteção patrimonial. Dados interessantes mostram que 65% das falências ocorrem por conflitos familiares, e não por problemas de mercado4 – pelo que, de forma ou de outra, a proteção da família e do patrimônio parecem caminhar juntas.
Mas, indo além, os cuidados ganham destaque ainda maior quando se está diante da necessidade de proteção de um filho, um neto, um pai em situação de vulnerabilidade, qualquer que seja.
Natural e razoável que exista uma maior preocupação com um filho com deficiência grave ou desenvolvimento atípico.
De igual modo, natural e razoável que essa preocupação também se aplique aos filhos cujos pais passaram por um processo de adoecimento e que, por isso, demandam cuidados no fim da vida.
Essas são situações que exigem um planejamento igualmente cuidadoso, no qual se possa estruturar uma série de disposições para assegurar moradia, sustento e atenção àqueles que, por suas singulares razões, o requerem de quem os cuida.
Veja-se que, as reflexões aqui expostas não são próprias de sujeitos com patrimônio complexo ou grandioso.
Ao contrário, tratam da vida comum, do desejo compartilhado de tranquilidade e conforto nas relações patrimoniais e emocionais.
Por mais intricado que o nome planejamento patrimonial e sucessório possa soar, seus instrumentos tratam, seja de forma simples ou extraordinária, de reflexões comuns a todos, o que é importante e muito significativo.
Inclusive porque traz paz às pessoas, e isso deve ser celebrado.
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1 BALERONI, Marina. Holding familiar e planejamento sucessório: o que é e por que se tem falado tanto nisso? Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/396318/holding-familiar-e-planejamento-sucessorio.
2 ANOREG. Cartórios registraram número recorde de testamento, inventário e partilha em 2022. Disponível em: https://www.anoreg.org.br/site/cartorios-registraram-numero-recorde-de-testamento-inventario-e-partilha-em-2022/; IRIB. Doações a herdeiros aumentam 22% em decorrência do medo da Reforma Tributária. Disponível em: https://www.irib.org.br/noticias/detalhes/doacoes-a-herdeiros-aumenta-22-em-decorrencia-do-medo-da-reforma-tributaria.
3 BALERONI, Marina. Redução de custos e corrida aos cartórios: afinal, vale a pena antecipar a herança? Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/397945/reducao-de-custos-e-corrida-aos-cartorios.
4 SILVA, Rosi (Jornal Bom Dia). Brigas levam à falência 65% das empresas de gestão familiar. Disponível em: https://administradores.com.br/noticias/brigas-levam-a-falencia-65-das-empresas-de-gestao-familiar.
Fonte: Migalhas
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