STF, em decisão unânime, permite que maiores de 70 anos escolham regime de bens na união, afastando imposição do Código Civil

 

O Código Civil impõe às pessoas com mais de 70 anos o regime patrimonial da separação de bens para o casamento (art. 1.641, II). Tal imposição também vinha sendo aplicada à união estável, por força de precedentes do STJ.

 

Entretanto, no dia 01 de fevereiro deste ano de 2024, o STF ao julgar o tema de repercussão geral 1.236 no Recurso Extraordinário com Agravo – ARE 1.309.642, em decisão unânime, definiu que a exigência legal da separação de bens pode ser afastada pela expressa manifestação de vontade do casal. Dessa forma, agora o(a) cônjuge/companheiro(a) maior de 70 anos pode optar por qualquer um dos regimes de bens previstos pela legislação brasileira: comunhão parcial, comunhão universal, participação final nos aquestos ou até mesmo a separação convencional de bens.

 

A decisão também foi expressa ao definir que esta possibilidade de afastamento do regime obrigatório é igualmente aplicável à união estável, reiterando assim, entendimento já consolidado pelo STJ e pelo STF no sentido de que as pessoas que vivem em união estável têm mesmos direitos que as pessoas casadas (RE 878.694, rel. min. Luís Roberto Barroso, j. em 10.5.17).

 

Na prática, os nubentes poderão afastar o regime da separação obrigatória por meio de pacto antenupcial, no caso de celebração de novo casamento e nos termos dos arts. 1.653 e seguintes do Código Civil, ou no caso de união estável, por escritura pública ou termo apresentado perante o registro civil, oportunidade em que deverão prever expressamente o regime de bens adotado. Nos casos em que os cônjuges/companheiros não escolham um outro regime, será aplicada a regra da separação de bens nos moldes do art. 1.641, II, do Código Civil.

 

As pessoas já casadas pelo regime da separação obrigatória também podem afasta-lo, por pedido de alteração do regime. Nestes casos, a alteração produzirá efeitos somente para o futuro, não sendo reconhecido efeitos retroativos.

 

O caso tem repercussão geral, ou seja, a decisão será aplicada para todos os processos semelhantes que estejam tramitando nas demais instâncias da Justiça brasileira, entretanto, para fins de modular os efeitos deste novo entendimento, o STF determinou que a decisão proferida no dia 01 de fevereiro tem efeitos somente prospectivos, não afetando as situações jurídicas já definitivamente constituídas. Dessa forma, em respeito ao princípio da segurança jurídica, não há possibilidade de rediscussão de casos em que bens já foram partilhados a partir do regramento do regime de separação obrigatória (seja em razão de divórcio/dissolução de união estável ou sucessão, decorrente do falecimento de um dos cônjuges/companheiros).

 

Assim, o novo entendimento repercute diretamente nas questões de planejamento patrimonial e sucessório, uma vez que, nos termos do art. 1.829, I do Código Civil, o cônjuge/convivente sobrevivente que mantinha relação conjugal sob o regime da separação obrigatória não tem direito à herança quando o falecido deixa descendentes, o que pode ser agora alterado, uma vez que com afastamento da exigência legal, o cônjuge/convivente sobrevivente pode ter garantido seu direito à herança, dependendo do regime escolhido pelo casal.

 

Segundo o ministro relator Luís Roberto Barroso, “a exigência de separação de bens nos casamentos com pessoa maior de 70 anos viola o princípio da dignidade humana, porque impede que pessoas conscientes de suas escolhas decidam o destino que querem dar aos seus bens; e desvaloriza os idosos, tratando-os como instrumentos para assegurar o interesse dos herdeiros pelo patrimônio”, complementando que “a regra cria, ainda, discriminação em razão da idade sem fundamento razoável, violando o art. 3º, IV, da Constituição”. Diante disto, a decisão proferida pelo Supremo respeita a dignidade da pessoa humana, a autonomia privada das pessoas idosas e limita o intervencionismo do Estado nas relações familiares.

 

Portanto, agora, os idosos que já mantinham relacionamentos conjugais sob o regime da separação obrigatória de bens, podem realizar a alteração do regime patrimonial vigente e, com isso, garantir o direito de meação e/ou de sucessão aos seus cônjuges/companheiros.

 

A tese de repercussão geral fixada para Tema 1.236 ficou assim constituída: “Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime de separação de bens previsto no art. 1.641, II, do Código Civil, pode ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura pública”.

 

Fonte: Migalhas

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