Primeiro, redação traz obrigatoriedade da progressividade e, na sequência, diz que para estas transferências alíquota será única de 8%

 

O ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), que incide na transferência de patrimônio por doação ou em razão de falecimento, tem estado cada vez mais no radar da fiscalização. Com o objetivo de aumentar a arrecadação tributária, os fiscais estaduais e até mesmo o legislador têm se mostrado atentos a este tributo.

 

No estado de São Paulo, por exemplo, sete são as operações de fiscalização relacionadas ao imposto, sendo que todas elas possuem como objetivo verificar a correta declaração, apuração e pagamento do imposto ao fisco paulista.

 

No legislativo, no contexto da reforma tributária, o projeto de lei complementar nº 108/2024 (“PLP 108/24”) traz alguns dispositivos visando alterar as regras atualmente vigentes para o ITCMD. Alguns destaques são o alargamento das bases de cálculo, a incidência sobre planos de previdência privada e a fixação da progressividade da alíquota.

 

O que chama a atenção é que, especialmente no que diz respeito à alíquota do ITCMD, a Constituição Federal impõe ao Senado a competência para fixá-la. Foi devidamente fixada em no máximo 8%, possibilitando que se tenha alíquotas progressivas, levando-se em consideração qual o valor da transferência realizada.

 

E, ao contrário do esperado, o parágrafo único do artigo 178, que trata da nova alíquota do ITCMD no PLP 108/24, traz a possibilidade de a alíquota ser única e a máxima fixada (8%) para a tributação dos grandes patrimônios. O conceito e a definição de grandes patrimônios será objeto das legislações estaduais.

 

Ou seja, primeiro a redação traz a obrigatoriedade da progressividade de alíquotas e logo na sequência diz que para estas transferências de grandes patrimônios a alíquota será única de 8%. Parece um tanto quanto peculiar esta flexibilização de norma.

 

Este tema já foi muito debatido e ainda é, por exemplo, em relação ao estado do Rio de Janeiro que não segue a progressividade gradual e, apesar de ter faixas e alíquotas progressivas, calcula o percentual indicado na faixa de incidência sobre toda a base de cálculo. Em relação ao ITCMD deve ser observada a alíquota gradual, dado que é aquela que melhor respeita a capacidade econômica do contribuinte, regra constitucional base para o ordenamento jurídico tributário.

 

A progressividade simples só deve ser admitida quando existir expressa autorização na Constituição Federal e para concretizar efeitos extrafiscais desejados pelo constituinte. Não é o caso —nem no estado do Rio de Janeiro e nem no contexto da reforma tributária.

 

Considerando o entendimento sedimentado no Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (RE 562.045), no sentido de que o fundamento para a progressividade do ITCMD está basicamente relacionado ao caráter pessoal e à graduação segundo a capacidade econômica do contribuinte, resta ratificado que não há espaço para a adoção da forma de cálculo do ITCMD perpetrada pelo fisco do estado do Rio de Janeiro e que —surpreendentemente— se pretende fazer na reforma tributária.

 

Fazendo remissão ao título, nos parece que o que se pretende com a manutenção desta redação é apenas arrecadar, independentemente dos princípios constitucionais e das limitações por eles imposta. Este tipo de imbróglio posto antes mesmo da aprovação final do texto reforça a desconfiança do contribuinte e, além disso, parece deixar engatilhada uma discussão no contencioso. Mas, não se quer diminuir o contencioso? Nos resta esperar e acompanhar o desenrolar desta e outras proposições.

 

Fonte: Folha de S.Paulo

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