Muita gente ainda confunde Herança e Meação e a possibilidade da coexistência de tais institutos em favor da mesma pessoa – viúva(o), no caso – quando se trata de um Inventário. Em se tratando de regras do direito sucessório brasileiro, é importante distinguir os conceitos de Meação e Herança para a melhor compreensão da partilha, ou seja, da divisão de todo o patrimônio apurado em um inventário depois do falecimento do seu titular. A meação refere-se à METADE dos bens adquiridos durante o casamento celebrado sob o regime de comunhão (parcial ou total, por exemplo), que pertence ao cônjuge sobrevivente. A herança por sua vez é a OUTRA METADE, ou seja, a parte dos bens do falecido que é transmitida aos herdeiros legais ou testamentários, nos termos do art. 1.784 do CCB.

Não se discute que meação é um direito que se origina do DIREITO DE FAMÍLIA e decorre do regime de bens adotado no casamento (pode haver também meação em sede de União Estável, como já falamos aqui). No regime da comunhão parcial de bens, por exemplo, todos os bens adquiridos onerosamente durante o casamento são considerados comuns ao casal, independentemente de quem os tenha adquirido, salvo as exceções legais. Nesse caso, com o falecimento de um dos cônjuges, o sobrevivente tem direito à metade desses bens, a título de meação.

Doutro turno, “herança” é direito egresso deo DIREITO DAS SUCESSÕES e abrange todos os bens deixados pelo falecido que não sejam objeto de meação. No caso do cônjuge sobrevivente, ele pode ser também herdeiro, dependendo do regime de bens e da existência de outros herdeiros, como descendentes ou ascendentes e também de como foi adquirido esse bem, conforme regras do CCB. No regime de comunhão parcial, por exemplo, pelas regras atuais do CCB, o cônjuge é herdeiro concorrente com os descendentes, o que significa que ele participará da divisão da parte que cabe ao falecido, após a separação da meação.

É muito importante saber que existem situações em que a viúva pode ser contemplada tanto com a meação quanto com a herança. Isso ocorre, por exemplo, quando o casal estava casado sob o regime de comunhão parcial de bens, e o falecido deixou bens que eram comuns ao casal e BENS PARTICULARES. A viúva receberá a meação dos bens comuns e, adicionalmente, poderá herdar uma parte dos bens particulares do falecido, conforme a ordem de vocação hereditária estabelecida pelo Código Civil. A doutrina ainda hoje pode vacilar nesse entendimento porém a jurisprudência já esclareceu essa situação comum por diversas vezes, servindo como exemplo a jurisprudência do TJMG que aplica com acerto a regra referida inclusive para caso de União Estável:

“TJMG. 10145140340111001. J. em: 26/10/2021. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVENTÁRIO. HOMOLOGAÇÃO DE PARTILHA. UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTE DO COMPANHEIRO FALECIDO. INEXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES. MEAÇÃO. ACERVO HEREDITÁRIO. NÃO CONCORRÊNCIA DA COMPANHEIRA SOBREVIVENTE. RECURSO PROVIDO. I. Inexistindo contrato escrito entre os companheiros, observa-se, na união estável, o regime da comunhão parcial de bens, ex vi art. 1.725, do CC/2002. II. No regime da comunhão parcial, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento, portanto, o cônjuge sobrevivente será meeiro dos bens adquiridos conjuntamente, e será herdeiro dos bens particulares adquiridos antes do casamento, tão somente pelo falecido. III. O artigo 1.829, I, do CC/02 só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) serem partilhados exclusivamente entre os descendentes.”
Outra não é a direção do Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil da Justiça Federal que assenta:

“O art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aqüestos, o falecido possuísse BENS PARTICULARES, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes”.
Portanto, com base nas sofisticadas regras de Direito Sucessório, afirmar que a viúva pode receber 75% da herança pode ser uma simplificação inadequada. A porcentagem que a viúva receberá depende de vários fatores, incluindo o regime de bens adotado no casamento, a existência de outros herdeiros e a natureza dos bens deixados pelo falecido e sua forma de aquisição. Mesmo sendo possível existir casos onde ela possa ser contemplada com meação (50%) e herança (25%), é mandatório analisar cada caso concreto para determinar a correta divisão dos bens entre meação e herança, garantindo que os direitos do cônjuge sobrevivente e dos demais herdeiros sejam devidamente respeitados.

Fonte: Julio Martins

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