A aquisição de imóveis por meio de cessão de direitos é uma prática recorrente no mercado imobiliário brasileiro, e a subsequente regularização para obtenção do Registro Geral de Imóveis (RGI) é um passo indispensável para alcançar a propriedade plena. A Cessão de direitos, em sua essência, formaliza a transferência de uma “expectativa de direito” sobre um bem, e não a transferência da propriedade plena em si, ato este que se perfaz apenas com o registro do título translativo no Cartório de Registro de Imóveis competente, como dita o art. 1.245 do Código Civil. O cessionário, ao adquirir tais direitos, assume a posição jurídica do cedente na relação obrigacional originária, podendo com isso praticar os atos necessários para, ao final, obter a titularidade do imóvel, porém alguns detalhes precisam ser considerados.

A formalização da Cessão, a depender do tipo de direito negociado, pode ocorrer por duas vias distintas: a Escritura Pública, lavrada perante um Tabelião de Notas, ou o Instrumento Particular. Não restam dúvidas que a transação realizada por Escritura Pública confere maior segurança já que se trata de documento dotado de fé pública, lavrado por Tabelião de Notas que justamente, por Lei, tem atribuição de conferir e garantir maior segurança jurídica e eficácia aos atos jurídicos. O instrumento particular, embora possa documentar a transação (a depender do tipo de direito transacionado), carece dessa solenidade, podendo – justamente pela possibilidade de ser feito sem assistência de alguém que conheça do assunto (como um Advogado, por exemplo) – apresenta maior insegurança, fragilidade probatória e consequentemente, comprometer a transação. Manter o imóvel em situação irregular, amparado apenas por um contrato de Cessão não levado a registro, expõe o adquirente a riscos enormes, muitas vezes nem conhecidos e considerados no momento da compra, como a possibilidade de o imóvel ser penhorado por dívidas do antigo proprietário (cedente), a contestação do negócio por terceiros de boa-fé, e a impossibilidade de alienar, dar em garantia ou mesmo de obter financiamentos utilizando o bem, o que podem com certeza ocasionar a perda do bem e do valor investido. A máxima “quem não registra não é dono” reflete com precisão a vulnerabilidade de tal posição. Nesse sentido o referido artigo 1.245 do Código Civil deixa claro:

“Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”.

Na hipótese de uma Cessão de Direitos Hereditários – que só pode ser feita por Escritura Pública – a regularização está intrinsecamente ligada ao processo de Inventário dos bens deixados pelo falecido, que pode ser resolvido tanto de forma judicial quanto extrajudicial (desde que, é claro, preenchidos os requisitos legais). O cessionário, munido da Escritura Pública de Cessão (requisito formal exigido pelo art. 1.793 do CCB), deverá requerer sua habilitação nos autos do inventário, seja ele judicial ou extrajudicial. Uma vez deferida, o bem poderá ser adjudicado diretamente ao cessionário ao final da partilha, quando as dívidas deixadas pelo morto não consumirem a herança (e isso é um risco que deve ser considerado nesse tipo de Cessão de Direitos), expedindo-se o respectivo formal de partilha ou a carta de adjudicação, que constituem os títulos hábeis para o registro da propriedade em seu nome. Como já falamos aqui, quando o Inventário não está em curso o Cessionário tem total legimidade para requerer sua abertura, conforme regra do art. 616, inc. V do Código Fux.

Tratando-se de Cessão de Direitos Aquisitivos, normalmente defluente de uma promessa de compra e venda, o cessionário sub-roga-se no direito de exigir do promitente vendedor originário a outorga da Escritura Definitiva de compra e venda. Havendo recusa ou impossibilidade de localizar o vendedor, a via adequada é a Ação de Adjudicação Compulsória, nos termos dos arts. 1.417 e 1.418 do Código Reale. Cabe salientar que hoje em dia, com o advento da Lei nº 14.382/2022 já e possível a Adjudicação Compulsória Extrajudicial, realizada diretamente no Cartório de Registro de Imóveis, com assistência de ADVOGADO, quando preenchidos os requisitos legais, sendo uma via mais célere, tal como já acontece com o INVENTÁRIO e a USUCAPIÃO extrajudicializados.

Por fim, quando o objeto da cessão são os Direitos de Posse, a situação pode ser ainda mais complexa, pois não se transfere um direito à propriedade, mas sim o exercício fático dos poderes de proprietário. A cessão da posse pode ser entabulada tanto por Escritura Pública quanto por Instrumento Particular e tem base legal no Código Civil (art. 1.206, 1.207 e 1.243). A solução jurídica para consolidar o domínio é, tipicamente, a Ação de Usucapião (mas que, como falamos, também pode ser resolvida em Cartório, sem processo judicial, através da Usucapião Extrajudicial, desde que preenchidos os requisitos legais). O cessionário poderá somar o tempo de posse do cedente ao seu (“accessio possessionis”), desde que a espécie de usucapião autorize, ambas as posses sejam contínuas, pacíficas e com “animus domini”, para comprovar o lapso temporal reclamado por lei para a modalidade de usucapião escolhida para tratar o caso (extraordinária, ordinária, especial urbana, etc.).

Como se vê, diante da multiplicidade de cenários e da complexidade das normas de direito notarial, registral e civil, a contratação de um Advogado Especialista em Direito Imobiliário é mais do que recomendada: é de suma importância. Este profissional detém a expertise necessária para realizar um diagnóstico preciso da situação do imóvel, identificar a melhor estratégia de regularização – ou a combinação delas – , mitigar riscos e conduzir o processo, seja ele judicial ou extrajudicial, com a segurança jurídica que não se pode arbir mão. Atualmente, o ordenamento jurídico oferece soluções extrajudiciais, como a usucapião, o inventário e a adjudicação compulsória realizadas diretamente em cartório, que se destacam como alternativas mais vantajosas em relação à via judicial tradicional, primando pela celeridade principalmente e pela desjudicialização dos conflitos, desde que haja consenso entre os envolvidos e a documentação esteja em ordem.

Fonte: Julio Martins

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