Mandado de Segurança – Imunidade tributária – ITCMD – Entidade Religiosa – Instituição sem fins lucrativos – Pretensão de não recolhimento do ITCMD sobre imóvel recebido em doação – Imunidade tributária reconhecida – Art. 150, inciso VI, alínea “b” da Constituição Federal e do artigo 9º, IV, “b”, do Código Tributário Nacional – Comprovada a finalidade religiosa sem fins lucrativos e de ação social, cf. art. 4º, §1º do Estatuto Social – Bens imóveis, objetos de doação estão essencialmente vinculados às suas finalidades – Obrigações acessórias que não constituem requisitos para usufruir o benefício – Precedentes – Sentença mantida – Reexame necessário e recurso improvidos. (Nota da Redação INR: ementa oficial)

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1024793-80.2022.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é apelante ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado MITRA DIOCESANA DE SANTOS.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao apelo e ao reexame necessário. V.U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores CLAUDIO AUGUSTO PEDRASSI (Presidente), CARLOS VON ADAMEK E RENATO DELBIANCO.

São Paulo, 20 de março de 2023.

CLAUDIO AUGUSTO PEDRASSI

Relator(a)

Voto nº 26083

Apelação Cível nº 1024793-80.2022.8.26.0562

Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo

Apelada: Mitra Diocesana de Santos

Interessado: Delegado Regional Tributário da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo

Vara de origem: 3ª Vara da Fazenda de Santos

MANDADO DE SEGURANÇA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ITCMD. Entidade Religiosa. Instituição sem fins lucrativos. Pretensão de não recolhimento do ITCMD sobre imóvel recebido em doação. Imunidade tributária reconhecida. Art. 150, inciso VI, alínea “b” da Constituição Federal e do artigo 9º, IV, “b”, do Código Tributário Nacional. Comprovada a finalidade religiosa sem fins lucrativos e de ação social, cf. art. 4º, §1º do Estatuto Social. Bens imóveis, objetos de doação estão essencialmente vinculados às suas finalidades. Obrigações acessórias que não constituem requisitos para usufruir o benefício. Precedentes. Sentença mantida. Reexame necessário e recurso improvidos.

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo(fls.120/128) contra a r. sentença de fls. 103/105, que concedeu a segurança impetrada por Mitra Diocesana de Santos (entidade religiosa, sem fins lucrativos) visando obter a imunidade tributária referente ao ITCD, incidente sobre as doações citadas na inicial.

Nas razões recursais, sustenta a Apelante que não houve o cumprimento das obrigações acessórias necessárias ao reconhecimento da imunidade do ITCMD nos últimos dois anos, com vistas a demonstrar aplicação integral dos recursos na manutenção de seus objetivos, cf. art. 14, inc. I do CTN. Afirma que não basta ser detentora do CEBAS. Pugna pelo provimento do recurso.

A Apelada apresentou contrarrazões (fls. 132/141).

É o relatório.

1. De início, considera-se interposto o reexame necessário de ofício, nos termos do art. 14, § 1º da lei nº 12.016/09.

2. Trata-se de mandado de segurança impetrada por entidade religiosa, sem fins lucrativos, objetivando o reconhecimento da inexigibilidade da cobrança do ITCMD incidente sobre doações de imóvel, objeto das matrículas nºs 1.938, 3.720, 3.559, 3560 e 1859, registrados junto ao CRI de Cubatão (fls.11/12).

Sustenta a autora que desde 18/03/2022 não obteve resposta do Fisco, relativo ao protocolo SFP-PRC-2022/07171, para renovação da Certidão de Imunidade de ITCMD, nos termos do art. 150, inc. VI, alínea “b” da CF e nos do art. 7º do Decreto nº 46.655/2002 da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.

Todavia, a Fazenda entende que não houve o cumprimento das obrigações acessórias necessárias ao reconhecimento da imunidade do ITCMD nos últimos dois anos, com vistas a demonstrar aplicação integral dos recursos na manutenção de seus objetivos, cf. art. 14, inc. I do CTN, não bastando a autora ser detentora do CEBAS.

A r. sentença que concedeu a ordem impetrada, deve ser mantida.

3. Com efeito, a pretensão da autora é a inexigibilidade da cobrança do ITCMD incidente sobre as doações dos imóveis, matrículas nºs 1.938, 3.720, 3.559, 3560 e 1859 (fls. 41/50).

De acordo com seu estatuto social, a autora é uma entidade religiosa sem fins lucrativos, com objetivo precípuo a difusão e prática do Evangelho segundo a tradição e orientação da Igreja Católica Apostólica Romana (fls. 18).

A autora apresentou as fls. 53, “declaração de reconhecimento de imunidade ao imposto sobre transmissão “causa mortis” e doação de quais bens ou direitos – ITCMD”, emitido pelo Governo do Estado de São Paulo, com validade para o período de 19/07/2017 a 18/07/2021.

Note-se que a Fazenda não contesta a qualidade de entidade religiosa sem fins lucrativos, alegando apenas ausência de preenchimento de obrigações acessórias.

Assim, não busca a autora o reconhecimento de sua qualidade como entidade religioso/assistencial, mas apenas o direito de não ser compelida ao pagamento do tributo incidente nos imóveis recebidos em doação (fls. 41/50).

4. Com efeito, dispõe o artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição Federal:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

VI – instituir impostos sobre:

(…)

b) templos de qualquer culto;

(…)

§4º – As vedações expressas no inciso VI, alíneas “b” e “c”, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.

Também o Código Tributário Nacional, em seu art. 9º, inc. IV, alínea “b”, dispõe:

Art. 9º – É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(…)

IV – cobrar imposto sobre:

(…)

b) templos de qualquer culto;

Ao contrário do alegado, a ausência de cumprimento de requisitos acessórios do art. 14 do CTN, não se aplicam a entidades religiosas, como a autora, já que se refere a alínea “c” do art. 9º do CTN, aplicável ao partidos políticos, suas fundações, entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativo.

Note-se que o necessário cumprimento dos requisitos acessórios alegados pela Fazenda afrontam a ordem constitucional, pois é cedido que norma infraconstitucional não poderá impor limitações e exigências, não previstas na Constituição Federal.

Assim, as entidades religiosas gozam da imunidade prevista na alínea “b”, inciso VI, art. 150 da Constituição Federal.

5. No caso em tela, a recorrida juntou aos autos seu Estatuto Social (fls. 14/25) no qual consta que ela é uma entidade religiosa sem fins lucrativos, com objetivo precípuo a difusão e prática do Evangelho segundo a tradição e orientação da Igreja Católica Apostólica Romana (art. 4º, fls. 18).

Assim, a Recorrida dedica-se a atos de culto, de magistério, da legislação, de juízo e de ação social que se fizerem necessários a mais ampla divulgação e plena vivência da doutrina católica em todos os campos de conhecimento e da atividade humana, inclusive, buscando a promoção e o aprimoramento moral, intelectual, social e econômico da pessoa humana (art. 4º, §1º, fls. 18).

Dessa forma, pelos documentos acostados ao feito, inequívoca a qualidade do apelante de entidade religiosa, de caráter beneficente, social e filantrópico, não sendo necessário apresentar outros documentos.

Note-se que a Fazenda não contesta a qualidade de entidade religiosa sem fins lucrativos.

Tampouco a Fazenda demonstrou a possibilidade de os imóveis não serem destinados ao fim da entidade autora, apenas alegando genericamente a situação.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que não cabe à entidade demonstrar que utiliza seus bens ou rendas de acordo com suas finalidades institucionais. Ao contrário, compete à Administração tributária demonstrar a eventual tredestinação do bem ou atividade gravados pela imunidade(AgR no RE com Ag 1.010.350, j. 30-6.2017).

Em casos análogos, seguem precedentes deste Eg. TJSP:

1010875-92.2022.8.26.0114

Classe/Assunto: Apelação Cível / ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis

Relator(a): Danilo Panizza

Comarca: Campinas

Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Público

Data do julgamento: 06/02/2023

Data de publicação: 06/02/2023

Ementa: APELAÇÃO – Ação declaratória – Tributário – Entidade religiosa – Doação – Bem imóvel recebido em doação para utilização na celebração de cultos e demais atividades relacionadas as suas finalidades – Entidade que goza de imunidade tributária, a teor do art. 150, VI, “b” e § 4º, da CF e art. 14 do Código Tributário Nacional – Não incidência do ITCMD, pois preenchimentos dos requisitos legais e constitucionais que garantem a imunidade tributária de impostos sobre o patrimônio de entidade religiosa. Benefício constitucional da imunidade deve ser concedido independentemente de qualquer requerimento ao Fisco, bastando que a parte interessada comprove tratar-se de uma das entidades beneficiadas, bem como a propriedade do bem sobre o qual incidiria o ITCMD. Precedentes desta Corte e da Superior Instância. Decisão mantida. Recurso desprovido

1044636-74.2020.8.26.0053

Classe/Assunto: Apelação Cível / ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis

Relator(a): Antonio Carlos Villen

Comarca: São Paulo

Órgão julgador: 10ª Câmara de Direito Público

Data do julgamento: 25/05/2022

Data de publicação: 25/05/2022

Ementa: TRIBUTÁRIO. ITCMD. Ação de repetição de indébito. Entidade religiosa. Imunidade. Decisão administrativa que reconheceu a imunidade tributária. Cumprimento de obrigações acessórias que não constitui requisito para o gozo do benefício. Sentença de procedência. Recurso da Fazenda do Estado provido em parte apenas para determinar que a correção monetária, desde o pagamento indevido até o trânsito em julgado, seja calculada com base nos índices da Tabela Prática deste Tribunal, e, a partir do trânsito do julgado, com base na taxa Selic, nesta já englobados os juros de mora

1047281-77.2017.8.26.0053

Classe/Assunto: Apelação Cível / ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis

Relator(a): Maurício Fiorito

Comarca: São Paulo

Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Público

Data do julgamento: 30/04/2019

Data de publicação: 30/04/2019

Ementa: APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA – TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – ITCMD – Entidade assistencial sem fins lucrativos – Pretensão ao reconhecimento de imunidade tributária referente a cobrança do ITCMD sobre a transmissão, por sucessão testamentária, do bem imóvel – art. 150, inciso VI, “b”, da Constituição Federal c.c. art. 14 do Código Tributário Nacional – A imunidade conferida às entidades sem fins lucrativos, prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, é de natureza subjetiva e incide sobre quaisquer bens, patrimônio ou serviços dessas instituições, desde que vinculados às suas atividades essenciais – Precedentes do STF e do STJ – Sentença de procedência mantida – Reexame necessário e recurso improvidos.

1010083-35.2019.8.26.0053

Classe/Assunto: Apelação Cível / ITCD – Imposto de Transmissão Causa Mortis

Relator(a): Ricardo Dip

Comarca: São Paulo

Órgão julgador: 11ª Câmara de Direito Público

Data do julgamento: 21/02/2020

Data de publicação: 21/02/2020

Ementa: ITCMD. ORGANIZAÇÃO RELIGIOSA. IMUNIDADE DE TRIBUTO SOBRE IMÓVEL RECEBIDO PARA CONSTRUÇÃO DO TEMPLO. – Não se pode admitir que um procedimento administrativo não tenha um previsto e econômico termo final, equivale a dizer, que as repartições públicas não tenham prazos a observar para a prática dos atos de sua competência, perseverando – se se quiser, perpetuando ao largo de tempo indeterminado, sob a etiqueta da observância de normas internas, a expectativa de exercício de um direito do súdito. – “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que não cabe à entidade demonstrar que utiliza seus bens ou rendas de acordo com suas finalidades institucionais. Ao contrário, compete à Administração tributária demonstrar a eventual tredestinação do bem ou atividade gravados pela imunidade” (AgR no RE com Ag 1.010.350, j. 30-6.2017). Não acolhimento da apelação fazendária e da remessa obrigatória, que se tem por interposta.

Assim, comprovada a finalidade da entidade religiosa e que o objeto de doação está essencialmente vinculado às suas finalidades (fls. 41/50), legitimada está a situação de imunidade tributária da Apelada, o que implica seu direito de não recolhimento do tributo (ITCMD) sobre os imóveis doados.

Logo, de rigor a procedência da ação para fim de reconhecer a inexigibilidade da cobrança do ITCMD.

6. Considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional aventada, observado que é desnecessária a citação dos dispositivos, bastando que a questão tenha sido analisada.

Isto posto, conheço e nego provimento ao reexame necessário e ao recurso, ficando integralmente mantida a r. sentença de fls. 103/105. Não há condenação em honorários em demandas desta natureza. Custas pela impetrada.

Cláudio Augusto Pedrassi

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1024793-80.2022.8.26.0562 – Santos – 2ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Claudio Augusto Pedrassi – DJ 27.03.2023

Fonte: INR

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