As dificuldades de acesso à moradia pelas camadas de menor renda da população, tem se constituído num dos maiores problemas que as grandes é médias cidades vem enfrentando.
 
Proclamado no artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos, segundo o qual “toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive habitação”, e consagrado na Constituição brasileira de 1988, no artigo 6º como um direito social e no artigo 7º, IV, como uma necessidade básica dos trabalhadores urbanos e rurais, o direito à moradia é uma questão que a todos preocupa e que vem se agravando.
 
As medidas para resolver o déficit habitacional adotadas pelo Poder Público, diante do aumento da população carente, das dificuldades na execução das políticas públicas, principalmente pela falta de verbas, não tem conseguido alcançar o êxito desejado.
 
Consequentemente, assistimos a um crescimento de assentamentos irregulares, com a ocupação de áreas públicas, privadas, de preservação ambiental, inclusive de risco, sem a mínima infraestrutura e acesso aos serviços sociais e de segurança. Grande parte das pessoas que ali habitam, vivem em condições sub-humanas. A criminalidade cresce. O Estado não tem controle.[1]
 
O Judiciário tem sido acionado, através de ações civis públicas ou possessórias, mas suas decisões, em regra, determinando a remoção dos ocupantes, não são cumpridas por falta de meios. Remover as pessoas para onde ? Em se tratando de áreas públicas, geralmente os municípios são condenados a promover a remoção, sob pena de multa, mas como não dispõe de áreas apropriadas ou verbas para implantar um mínimo de estruturas básicas, as decisões não são cumpridas.
 
A conclusão a que se chega é que, o Judiciário decide aquele caso, mas não soluciona o problema, que extrapola o alcance jurídico, não estando só nas mãos do julgador, mas na dependência de medidas a serem adotadas por outros poderes e órgãos.
 
Assim, em boa hora foi promulgada a Lei 13.465, de 11.07.2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana e prevê expressamente a adoção de meios extrajudiciais para a resolução de tal conflito e para garantir o direito social à moradia digna (artigo 10, incisos V e VI).
 
Aliás, referido diploma estabelece no artigo 21 § 3º, que, nos casos em que haja alguma impugnação ao procedimento de regularização, poderá ser utilizada a mediação para a resolução do conflito, o que vem de encontro com a política do Conselho Nacional de Justiça, pautada na cultura da paz, do diálogo e da responsabilidade compartilhada.
 
Por outro lado, o legislador, acertadamente foi mais longe, ao autorizar os municípios, no artigo 34, a criarem câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos, bem como a celebrarem convênios com os tribunais de Justiça estaduais para a solução consensual dos mesmos.
 
Louvável a medida, pois, através da mediação, as partes envolvidas terão oportunidade de serem ouvidas, dialogar com os representantes do Poder Público e, em comum acordo, chegar a uma solução que a todos atenda. Não será uma decisão imposta, que nem sempre soluciona a questão. Pelo contrário, a mediação, além de colocar um fim no litígio, pode levar as pessoas envolvidas à construção de uma boa convivência.
 
Por fim, também altamente inovadora é a medida estabelecida no § 5º, do citado artigo 34, ao dispor que os municípios poderão, também, mediante convênio, utilizar as câmaras privadas de mediação credenciadas nos tribunais, conforme prevê o artigo 167 do Código de Processo Civil, as quais muito poderão contribuir para que os princípios da cidadania e dignidade da pessoa humana,contidos no artigo 1º, incisos II e III, da Constituição Federal de 1988, sejam respeitados e para que todo cidadão possa ter a sua moradia.
 
E neste ponto, pode ser destacada a Câmara Privada de Mediação para a solução de conflitos socioambientais e urbanísticos da Universidade Católica de Santos, que está credenciada junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo e vem atuando, não só em casos relacionados com o meio ambiente, como na regularização fundiária urbana.
 
Na Câmara, os mediadores têm a oportunidade de contar com o apoio de professores e alunos das mais diversas áreas, o que muito contribui para o sucesso da mediação. De outra parte, por força da demanda, foi criada junto ao curso de pós-graduação em Direito Ambiental, um Grupo de Pesquisa versando sobre a matéria, o qual, além de cumprir com seus objetivos principais, tem fomentado a formação cidadã dos alunos, o aprofundamento do estudo e o debate sobre questões fundiárias e socioambientais.
 
Em síntese, a regularização fundiária dos assentamentos irregulares, através da mediação, que com o concurso da Universidade, muito concorrerá para promover o fortalecimento comunitário, a inclusão social e uma maior participação dos indivíduos no exercício de sua cidadania.