A Justiça de São Paulo autorizou a retirada do sobrenome paterno de uma mulher em razão do abandono afetivo e material pelo genitor. O entendimento foi de que o princípio da imutabilidade do nome não é absoluto no sistema jurídico brasileiro. A decisão, unânime, é da 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP).
 
Na ação, a mulher alegou que a manutenção do sobrenome trazia constrangimento e sofrimento e afrontava os direitos constitucionais à personalidade e dignidade. Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente. Ao reformar a decisão, o relator, desembargador Donegá Morandini observou ter ficado provado o rompimento do vínculo afetivo entre pai e filha.
 
O magistrado ressaltou que o apelado, embora afirme querer bem à filha e desejar a reaproximação, assume ter se afastado a partir de 2014 por conta de desavenças profissionais com o núcleo materno da filha. Laudo psicológico anexados aos autos também comprova o quadro de sofrimento da mulher por manter o sobrenome paterno.
 
A modificação excepcional do nome, segundo o desembargador, garante a proteção da personalidade, nos termos do artigo 16 do Código Civil. A exclusão do sobrenome, conforme ressaltou Morandini, não gera qualquer prejuízo a terceiros, já que não constam registros de ações cíveis ou criminais em nome da autora da ação, nem inscrições em cartórios de protesto do lugar de seu domicílio.
 
Decisões recentes identificaram abandono afetivo
 
Em maio, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam) noticiou uma decisão da 1ª Vara Cível de São Paulo, que concedeu a um jovem o direito à retirada do sobrenome do pai de seu registro civil, bem como a inclusão do sobrenome referente à família materna. No processo, ficou comprovado o abandono afetivo e material do filho pelo genitor desde os 2 anos de idade.
 
Membro do IBDFAM, a advogada Anelise Arnold patrocinou a ação. Em entrevista, ela contou que o sofrimento causado pelo abandono foi confirmado pelo laudo de um psicólogo. “O autor fez, por muitos anos, e ainda faz tratamento psicológico. Para ele, era um abalo emocional muito grande portar um sobrenome que o fazia lembrar do abandono que sofreu do pai”, relatou Anelise, à época. Confira a notícia completa.
 
Já a Justiça do Tocantins, em abril, determinou que um pai pague R$ 50 mil de indenização para a filha de 19 anos, também vítima de abandono afetivo. De acordo com a Defensoria Pública do Estado, apenas pagar a pensão alimentícia para dar como quitada a “obrigação” da convivência familiar não é o suficiente. O dever do genitor vai além e o descumprimento causa dano, passível de indenização.
 
Presidente da seção Tocantins do Ibdfam, a advogada Alessandra Muniz comentou o caso: “Não adianta uma condenação indenizatória no sentido de que aquele pai tenha algum carinho pelo filho, porque não vai funcionar assim, tendo às vezes até repulsa maior do genitor. Afeto se busca e se constrói”. Em contrapartida, ela observou que a indenização é justa por responder ao dano psicológico causado. Saiba mais.
 
Em matéria do Boletim Informativo divulgada nesta quinta-feira (16), presidente da seção Pernambuco do Ibdfam comentou como a quarentena pode agravar situações de abandono afetivo de crianças e pessoas idosas.
 
“É importante ressaltar que, sendo a guarda compartilhada uma regra, a imposição do isolamento, ainda que de forma mais permanente com um dos genitores, não deve servir de mote para o afastamento cômodo de quem já possuía essa propensão”, defendeu Maria Rita. Leia a entrevista na íntegra.