CNB/CF resgata escritura do Castelinho da Brigadeiro, que neste ano completa 110 anos, e conta como a documento notarial foi peça chave no tombamento da história construção paulistana
 
O famoso imóvel paulistano, conhecido como “Castelinho da Brigadeiro”, um raro exemplar de construção inspirada no estilo Art Noveau da cidade, deve grande parte da comemoração dos seus 110 anos neste 2021 a uma contribuição no mínimo inusitada. Foi precisamente uma Escritura de Compra e Venda, realizada em Cartório de Notas, com a indicação do atual dono da propriedade, o documento base para o tombamento do imóvel que o salvou da demolição.
 
O Castelinho da Brigadeiro se degradava dia após dia entre os outros prédios do bairro da Bela Vista. Quando, em 1982, cinco trabalhadores começaram a marretar as paredes e grades já fracas da estrutura, vizinhos do local impediram a demolição e, junto do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (CONDEPHAAT), iniciaram o pedido de tombamento do imóvel a fim de resgatá-lo das lamentáveis condições em que se encontrava. Entre memórias perdidas de seus donos, entre idas e vindas, abandonos, trocas e vendas, a última Escritura de Compra e Venda foi o documento responsável por remontar o caminho inverso daquela história.
 
Salvo por uma Escritura
 
Lavrada em 30 de junho de 1977, a Escritura de Compra e Venda do Castelinho da Brigadeiro foi um dos principais documentos citados no pedido de tombamento do imóvel de acordo com as atas do processo enviadas pelo CONDEPHAAT. Na época, o processo usou a Escritura para enfim assegurar a responsabilidade do último comprador do imóvel por sua conservação. O documento mostrava que o INSS havia vendido o local para a Companhia Mofarrej de Empreendimentos que, pela subutilização do Castelinho, o deixara a mercê do tempo.
 
Com dono estabelecido, planta do imóvel em mãos e documentos em ordem, o imóvel finalmente começou a ser restaurado em 1990. A proprietária Mofarrej promoveu uma renovação inédita do Castelinho até o início dos anos 2000, avaliada em mais de 2 milhões de reais, recuperando a aparência inicial do prédio e transformando-o em um local de eventos, aberto a empresas interessadas. A estrutura em estilo Art Noveau e a área ajardinada ao entorno do prédio tornaram-se mais um respiro de história à cidade.
 
A Escritura de Compra e Venda, tão importante para a oficialização e procedimentos iniciais do tombamento e restauração do prédio foi gentilmente resgatada do arquivo do 9º Tabelionato de Notas da Capital pelo tabelião Paulo Roberto Fernandes e o substituo Donaldo Fogaroli. O documento original foi assinado por Affonso A. Rubião, notário do tabelionato em 1977.
 
Clique aqui para ver a escritura na íntegra
 

 
Castelinho da Brigadeiro
 
Projetado pelo italiano Giuseppe Sachetti para o médico e escritor Cláudio de Souza, a construção do Castelinho foi concluída em 1911 e está localizada na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 826, região central da cidade. Sendo um dos últimos exemplares de uma residência construída neste estilo, o Castelinho sempre chamou a atenção não apenas por sua marca irreverente entre as outras casas do bairro, mas também por representar um marco na história da construção das vilas operárias que tanto cresciam naquela época. Seu proprietário, Cláudio de Souza, não era um operário, mas sim um dos donos e principais investidores da chamada Vila Economizadora, criada na mesma época para estabelecer um conjunto habitacional para os trabalhadores das fábricas paulistanas, que passavam por um processo de franco crescimento com a produção de café e a chegada de imigrantes europeus, não muito longe do Castelinho.
 
Acompanhando de perto a construção da Vila Economizadora, Cláudio de Souza abriu as portas da casa para receber pacientes, mantendo seu consultório até 1913, quando abandonou a profissão e mudou-se para o Rio de Janeiro, onde continuaria a atuar como escritor, já que fora um dos fundadores da Academia Paulista de Letras. O Castelinho então passou por vários donos, diferentes épocas de abandono, até ser adquirido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 1975 que, após dois anos, decidiu vender o imóvel.
 
A História por Atos Notariais
 
Os Cartórios de Notas carregam em seus livros as muitas histórias que o Brasil tem para contar, até porque a linha do tempo do País passa por importantes marcos que precisaram ser registrados e autenticados nos Tabelionatos, presentes no Brasil desde 1565. Notários brasileiros acompanharam a fundação de vilas, que mais tarde se tornariam as cidades que conhecemos atualmente, registraram guerras, libertações, mudando seus atos ao longo do tempo, adaptando-se às demandas da sociedade em desenvolvimento, da nação em construção contínua.
 
Citar a importância histórica dos serviços notariais pode ser assunto já conhecido por muitos tabeliães, mas visualizar uma peça deste trabalho traz consigo ainda mais peso e concretude a estes documentos. Para relembrar alguns dos importantes atos realizados nos mais de 450 anos de história dos Tabelionatos de Notas do País, o Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal, inicia uma nova série de matérias com estes fragmentos da história, celebrando o aniversário desses atos que ajudaram a registrar os marcos históricos em todo o Brasil.
 
O CNB/CF agradece a disposição do tabelionato e ressalta a importância que tais atos tem na conservação e no registro de tantas passagens do tempo. Em breve, novos documentos históricos de locais aniversariantes serão apresentados pela série, relembrando mais uma vez como o notariado mescla-se à história do Brasil.