Nos tempos atuais, muitos casais preferem não ter filhos ou optam por tê-los com mais idade, na faixa dos 35, 40 anos. Os motivos variam: seja por gastos, tempo (ou a falta dele) ou por escolher dar prioridade para vida profissional, adquirir bens, como uma casa própria ou um carro. Para ter uma companhia ou mesmo para suprir a necessidade do “cuidar”, optam em ter um cachorro, gato ou até um peixe.
Se, porventura, o casal se separa, as perguntas mais comuns são: Qual o destino do animal? Fica com a mulher? Com o homem? Com quem adquiriu? Existe guarda compartilhada? Cabe processo? São questões corriqueiras que merecem atenção para evitar, ou pelo menos diminuir, riscos de discussões mais sérias.
Vale frisar que, para a maioria das pessoas, os animais possuem um valor muito maior do que meramente econômico e possessório. Eles têm muita relevância sentimental e não é raro serem tratados como verdadeiros membros da família. Entretanto, em nosso ordenamento jurídico, os animais são chamados de “bens semoventes”, aqueles que podem se movimentar por força própria, porém, não deixam de integrar o patrimônio da pessoa. Dependendo da forma de concretização da união, podem sim fazer parte do patrimônio do casal, ou apenas de um dos cônjuges, fato que pode tornar crucial a decisão sobre o destino do bichinho de estimação.
Na teoria, como sabemos, um bem é divido após a dissolução da união. Contudo, um gato ou cachorro não são, e não devem ser comparados a um carro ou uma casa, mesmo que, de certa forma, a lei os equipare.
O foco aqui não é estudar os regimes de bens em si, mas, vale ressaltar que, em uma comunhão parcial de bens, o que for adquirido na constância do casamento, torna-se divisível pelo casal, já os bens particulares, aqueles adquiridos por cada um antes da união, serão individualizados após a separação. Existem também os bens que não entram na comunhão, como pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes. Partindo deste raciocínio, o animal que for adquirido por um dos cônjuges antes da união, após o término, ainda seria de sua propriedade.
Mas, como citado anteriormente, um animal de estimação é muito mais que um bem. Inclusive, já existem discussões jurídicas, doutrinarias e judiciais para resolver situações desse tipo nas quais são pleiteadas guardas de animais.
Em 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que os animais devem ser tratados como membros da família e ações relativas às guardas devem ser tradas nas varas de família, e não nas varas comuns. E, nas palavras do relator:
“No Código Civil de 2002, os animais são tratados como objetos destinados a circular riquezas (art. 445, § 2º), garantir dívidas (art. 1.444) ou estabelecer responsabilidade civil (art. 936). Com isso, é possível afirmar que a relação afetiva existente entre seres humanos e animais não foi regulada pelo referido diploma. A propósito, tamanha é a notoriedade do referido vínculo atualmente que, com base em pesquisa recente do IBGE, é possível afirmar que há mais cães de estimação do que crianças em lares brasileiros.”
Diante disso, pode-se dizer que há uma lacuna legislativa, pois a lei não prevê como solucionar conflitos entre pessoas em relação a um animal, cuja função é de proporcionar afeto, e não riqueza patrimonial. (Agravo de Instrumento – 2052114-52.2018.8.26.0000).
Nota-se que o Desembargador, brilhantemente, eleva os animais domésticos a membros da família, tratamento que a lei ainda não traz, porém, depois de muitos casos sendo julgados, é muito provável que o legislador deve se atentar a essa nova forma de guarda compartilhada, deixando de tratar um bichinho de estimação como um bem comum que não teria um compartilhamento na guarda.
Ante o exposto, conclui-se, no que tange a guarda dos animais após a dissolução do casamento ou da união estável, que a nossa lei ainda é imprecisa nesse aspecto, e que não cabe tratar os animais de estimação como meros bens semoventes. Por isso, os casos devem ser estudados minuciosamente, analisados com empatia e zelo para que, de fato, tenham um tratamento diferenciado.