Descubra se para vender os bens da herança o herdeiro fica obrigado a fazer inventário judicial ou extrajudicial

 

Ainda hoje muita gente não tem clara a compreensão de que o Inventário não é necessário para que os bens do(a) falecido(a) sejam transferidos para seus herdeiros.

 

Exatamente! Você não leu errado: não é o Inventário (nem Judicial, nem o Extrajudicial) que transfere os bens para os herdeiros, mas sim uma peculiar disposição legal constante no artigo 1.784 do Código Civil (o Direito de Saisine):

 

“Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.

 

Regularização dos bens

 

A transmissão da herança, portanto, se dá por conta do que a lei já definiu no art. 1.784, inclusive quando os herdeiros nem mesmo saibam que o titular já tenha falecido ou mesmo que existam bens componentes da herança.

 

O ponto importante a ser observado é de que o inventário é, sim, importante, não para a transmissão, mas sim para permitir a disposição/alienação dos bens, assim como a formalização, a divisão e delimitação entre os herdeiros.

 

Principalmente a regularização dos bens junto aos cartórios e demais órgãos que mantenham o cadastro dos bens da herança, como, por exemplo, junta comercial, RCPJ, DETRAN, prefeituras etc.

 

sobre o referido “direito de saisine” comenta o ilustre professor e procurador de justiça do MPRJ, DR. J. M. Leoni Lopes de Oliveira (direito civil – sucessões. 2019):

 

“O denominado ‘droit de saisine’ estabelece uma presunção de que, com a morte do autor da herança, automaticamente é transferida a seus herdeiros a posse sobre todos os seus bens.

 

Trata-se como reconhecido pela doutrina de uma ‘ficção jurídica’. Essa presunção de transmissão da posse dos bens do falecido se dá tanto em relação aos herdeiros legítimos, como em relação aos herdeiros testamentários, como se depreende do teor do art. 1.784 do CC”.

 

Venda antecipada de bens do espólio

 

Nem sempre os herdeiros têm a intenção de resolver o inventário. Não são raros os casos onde as partes querem “resolver” mas o “resolver” no caso pode não significar regularizar para ficar com os bens mas sim ende-los.

 

Uma grande novidade trazida pelo Novo Código de Normas Extrajudiciais do Estado do Rio de Janeiro (Provimento CGJ 87/2022) está no artigo 453 que permite a “venda antecipada de bens do espólio“ – que dispensa inclusive a necessidade de AUTORIZAÇÃO JUDICIAL:

 

Art. 453. É possível a alienação, por escritura pública, de bens integrantes do acervo hereditário, independentemente de autorização judicial, desde que dela conste e se comprove o pagamento, como parte do preço:

 

I – da totalidade do imposto de transmissão causa mortis sobre a integralidade da herança, ressalvado o disposto no artigo 669, II, III e IV, do CPC; e

II – do depósito prévio dos emolumentos devidos para a lavratura do inventário extrajudicial”.

O procedimento é novo e só vale aqui no Rio de Janeiro porque a regra é local. Lembrando que o inventário extrajudicial pode ser feito em qualquer Tabelionato do território brasileiro, mesmo que o titular dos bens tenha falecido em outro Estado, os bens estejam situados em outro Estado ou ainda, sejam os herdeiros residentes em outros Estados (ou mesmo, outros Países!).

 

Todavia, é importante salientar que essa VENDA ANTECIPADA não pode ser feita quando envolver bens imóveis situados fora do Estado do Rio de Janeiro, quando o Inventário não puder ser lavrado por escritura pública na via extrajudicial e quando constar a indisponibilidade de bens quanto a algum dos herdeiros ou ao meeiro (regras dos inciso I, II e III do par. 1º do referido art. 453). As demais regras desse procedimento novo encontram-se nos artigos 453, 454 e 455 do NCN, portanto.

 

Alvará judicial

 

Outra forma possível, mais antiga e tradicional inclusive, pode dizer respeito ao ALVARÁ JUDICIAL (art. 619, inc. I do CPC) ou ainda, à cessão de direitos hereditários (esta última se realiza no âmbito extrajudicial, mediante Escritura Pública, em qualquer Cartório de Notas cf. art. 1.793 do CCB), que, todavia exigirá a realização do Inventário para permitir o registro dos bens em nome do(s) cessionário(s) adquirente(s).

 

Sendo certo que a Cessão de Direitos Hereditários para poder individualizar bens da herança deve ser precedida de autorização judicial cf. regras do art. 1.793 do CCB, mas ainda assim, ausente esta, não será nula, mas apenas INEFICAZ, como já decidiu o STJ:

 

“REsp 1809548/SP. J. em: 19/05/2020. RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. (…) CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. BEM DETERMINADO. NULIDADE. AUSÊNCIA. NEGÓCIO JURÍDICO VÁLIDO. EFICÁCIA CONDICIONADA QUE NÃO IMPEDE A TRANSMISSÃO DA POSSE. (…)

 

Embargos de terceiro opostos por adquirente de direitos hereditários sobre imóvel pertencente a espólio, cedidos a terceiros antes de ultimada a partilha com a anuência daquelas que se apresentavam como únicas herdeiras, a despeito do reconhecimento de outros dois sucessores por sentença proferida em ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança. (…)

 

  1. A cessão de direitos hereditários sobre bem singular, desde que celebrada por escritura pública e não envolva o direito de incapazes, não é negócio jurídico nulo, tampouco inválido, ficando apenas a sua eficácia condicionada a evento futuro e incerto, consubstanciado na efetiva atribuição do bem ao herdeiro cedente por ocasião da partilha.

 

  1. Se o negócio não é nulo, mas tem apenas a sua eficácia suspensa, a cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto de tutela específica na via dos embargos de terceiro. (…).

 

  1. Recurso especial não provido”.

 

Por Julio Martins Advogado, com especialização em Direito Notarial, Registral e Imobiliário, Direito Processual Civil, Direito do Consumidor, Direito da Família, Planejamento Sucessório e Patrimonial assim como Direito das Sucessões.

 

Fonte: MV Meu Valor Digital

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