Em conversa com o E-Investidor, advogados dizem que retirar esse direito de um filho é muito complicado

 

Um pai ou uma mãe deserdar um filho é um tema polêmico quando uma família começa a discutir sobre herança. Para entender as implicações de um caso como esse, o E-Investidor conversou com advogados para saber se um brasileiro pode deserdar um filho.

 

Júlia Moreira, sócia da área de família do PLKC Advogados, diz haver uma brecha se o herdeiro for violento com o autor da herança, por exemplo, pressionando-o para ele passar a maioria dos bens. Nesse caso, o juiz pode decidir que esse filho será retirado da herança. “A ação cabível, nestas hipóteses, é ação de indignidade, em que é excluído da sucessão o herdeiro que incorreu nesses atos antes mencionados”, diz Moreira.

 

Além da pressão para a formulação do testamento, também é possível retirar o filho da herança pela ação de indignidade caso esse filho ou filha mate o próprio pai, como o emblemático caso da família Richthofen que chocou o país. Em outubro de 2002, Manfred e Marísia von Richthofen foram assassinados a mando da própria filha, Suzane von Richthofen. Condenada, ela perdeu o direito à parte da herança dos pais.

 

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Há outras possibilidades para remover um filho da herança, como ofensa física, injúria grave do filho contra o ascendente ou relações sexuais sem o consentimento. Andrey Guimarães Duarte, tabelião e diretor do Colégio Notarial do Brasil — Seção SP, comenta que para deserdar o filho, o pai ou a mãe precisa fazer um testamento. Segundo ele, o preço médio base para fazer esse testamento no cartório é de R$ 2.304,00. Esse valor pode subir caso a pessoa formule esse testamento com um advogado.

 

Por que não posso deserdar meu filho?

Mesmo que o pai ou a mãe acuse o filho de ter cometido um ato grave como ofensa física ou injúria grave, ele precisa notadamente conseguir provar os delitos. Isso porque, caso a acusação seja falsa, esse filho pode recorrer e mostrar sua inocência na Justiça.

 

Para Paulo Vaz, sócio de tributário do VBSO Advogados, se o filho não cometeu nenhum dos atos citados acima, deserdá-lo torna-se uma tarefa impossível, mesmo que a pessoa coloque esse desejo no testamento. Conforme o advogado, existem alguns herdeiros que, devido ao seu vínculo familiar próximo do testador, são protegidos pela lei, não podendo ser afastados do direito à herança.

 

Essas pessoas são chamadas de forma técnica de herdeiros necessários. São eles: os filhos, netos e bisnetos. Além do cônjuge, pai e mãe. No entanto, o código civil deixa claro que os pais exercem o direito de herdeiros dos descendentes caso o dono dos bens não tenha deixado nenhum filho ou neto. Entretanto, como a reportagem trata de um pai querendo deserdar um filho, fica claro que os pais do indivíduo não terão direito a herança pelo fato dessa pessoa ter filhos e está interessada em deserdar pelo menos um deles.

 

O advogado comenta que o porcentual geral de todos os herdeiros necessários é de 50% e que cada pessoa pode receber uma quantidade conforme o número de herdeiros necessários. Caso seja uma família composta por um cônjuge e dois filhos, cada um dos herdeiros tem direito a 16,66% do patrimônio de forma legítima. Em outro exemplo, se forem apenas dois filhos na ausência de um cônjuge, cada um terá direito a pelo menos 25% da herança legítima, totalizando os 50%. Os outros 50% ficam a critério dos donos dos bens no testamento.

 

“Em todos os casos, o ideal seria fazer um testamento colocando 50% dos bens que podem ser remanejados para outras pessoas ou até para um ou alguns dos herdeiros necessários. No exemplo de dois filhos, o pai poderia deixar 50% para um único filho. E os dois filhos teriam que dividir os outros 50%, ficando 25% para um filho e 75% para o outro”, explica Vaz.

 

Posso passar meus bens para o nome de outros herdeiros?

Ainda assim, algumas pessoas podem não aceitar que são obrigadas a deixar algum patrimônio para o filho. Nesse caso, elas recorrem a deixar os bens no nome de outros filhos ou até mesmo do cônjuge que não tem parentesco com o descendente a ser deserdado. Entretanto, os juristas lembram que a pessoa não deve colocar todos os seus bens no nome de outros filhos e nem do cônjuge sem fazer nenhum testamento, visto que isso não o ajuda a deserdar um dos filhos. O tabelião comenta que o herdeiro prejudicado pode ingressar com ação judicial e demonstrar a origem dos recursos para aquisição dos bens adquiridos pelo cônjuge e demais herdeiros. Dessa forma, o herdeiro prejudicado demonstrará que os recursos são provenientes do autor da herança, o que caracteriza doação deste aos outros filhos.

 

Com quem fica a herança se a pessoa não tiver filhos?

“Quando um genitor doa para um dos herdeiros, e não especifica que essa doação saiu da cota que está livre dos herdeiros necessários, essa doação poderá ser demonstrada pelo herdeiro e exigir a igualdade na herança. Essa exigência chama-se colação no código civil”, diz Duarte. O consenso dos advogados é que a pessoa deve fazer um testamento e declarar para quem vai o porcentual disponível que não é dos herdeiros necessários. Essa é a única forma de reduzir o patrimônio que o filho deve receber caso ele não tenha cometido nada contra o pai ou a mãe.

 

Segundo Laísa Santos, especialista em Planejamento Patrimonial e Sucessório, para fazer esta operação é necessário realizar um testamento, dispondo da parte disponível do patrimônio. “Para deserdar, haverá as taxas e gastos do tabelionato de notas (se optado pelo testamento público), assim como a contratação de um escritório de advocacia especializado que possa auxiliar o testador a dispor sobre as suas vontades com a herança, de maneira clara e objetiva”, explica a advogada.

 

 

Fonte: E-investidor/Estadão

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