O projeto visa combater a clandestinidade no setor e aprimorar a fiscalização pela Polícia Federal

 

O Senado Federal, em sessão realizada na terça-feira, 13, aprovou o projeto de lei que institui o Estatuto da Segurança Privada. A proposição legislativa, originada no Senado Federal sob a numeração PLS 135/10 e posteriormente convertida na Câmara dos Deputados em SCD 6/16, visa regulamentar as atividades das empresas de segurança privada e de transporte de valores, além de estabelecer normas para a segurança em instituições financeiras.

 

O texto aprovado, que segue agora para a sanção presidencial, é resultado de um substitutivo elaborado pela Câmara dos Deputados ao projeto original do Senado, com a supressão de algumas alterações. A aprovação da matéria coloca fim a uma espera de oito anos desde o seu retorno ao Senado.

 

De autoria do ex-senador Marcelo Crivella, o projeto original (PLS 135/10) propunha apenas a fixação de um piso salarial nacional para a categoria dos vigilantes, tendo sido aprovado pelo Senado em 2012. Encaminhado à Câmara dos Deputados, o projeto foi aprovado em 2016 na forma de um substitutivo, com a inclusão de regras mais abrangentes, passando a tratar de temas como a atuação das empresas de segurança, normas para a formação de profissionais, uso de armas e outros equipamentos controlados.

 

O substitutivo, após aprovação pela CAS – Comissão de Assuntos Sociais em 2017, foi arquivado em 2022 em virtude do término da legislatura. Em 2023, um requerimento para o desarquivamento da matéria no Senado foi aprovado, e em junho de 2024, passou a tramitar em regime de urgência, sendo direcionado diretamente para o Plenário.

 

A versão aprovada pelo Senado nesta terça-feira baseou-se no relatório do senador Laércio Oliveira, que suprimiu algumas alterações introduzidas pela Câmara e promoveu ajustes de redação. Para o senador, a regulamentação do setor se faz necessária para adequar as normas à realidade atual, que exige, por exemplo, o combate aos crimes digitais e a implementação de sistemas de monitoramento eletrônico.

 

O senador argumentou ainda que o texto confere à Polícia Federal instrumentos para intensificar a fiscalização sobre essas empresas, coibindo a atuação clandestina, que coloca em risco não apenas o patrimônio, mas também a vida da população.

 

“O número de empresas de segurança privada que operam na clandestinidade no país é absurdo. Para se ter uma ideia, existem 3,5 milhões de vigilantes, mas apenas 500 mil são formalizados, contratados por empresas legalizadas. Os outros 3 milhões estão na informalidade, o que mancha a imagem do setor. Um exemplo lamentável disso é o caso do supermercado no Rio Grande do Sul, em que um cidadão foi brutalmente espancado e morreu porque a segurança era feita por uma empresa sem qualificação. Este projeto visa justamente fornecer à Polícia Federal meios para combater essa clandestinidade.”

 

O projeto de lei autoriza o funcionamento de serviços de segurança privada em empresas que optem por ter seu próprio corpo de segurança, estendendo essa possibilidade a condomínios residenciais, escritórios, edifícios residenciais e salas comerciais, com exceção de portarias. Essa modalidade, denominada serviço orgânico de segurança, abrange desde a vigilância armada até o transporte de valores, desde que em benefício próprio. A prestação desse tipo de serviço por autônomos e cooperativas será proibida, sendo condicionado à autorização da Polícia Federal e ao cumprimento das exigências legais.

 

Durante a votação, o relator e outros senadores prestaram homenagem ao ex-senador Major Olímpio, falecido em 2016 em decorrência da covid-19, relembrando sua mobilização pela aprovação do projeto. A atuação de Major Olímpio em defesa da matéria foi destacada pelos senadores Izalci Lucas e Rodrigo Cunha. O relator sugeriu que a lei seja batizada em homenagem ao ex-senador.

 

Tipos de serviço

 

O substitutivo define os serviços de segurança privada, incluindo a vigilância patrimonial, a segurança de eventos em espaços de uso comum, a segurança em transportes públicos (exceto aviação), a segurança em unidades de conservação, o monitoramento de sistemas eletrônicos de segurança e rastreamento, o transporte de valores e a escolta armada.

 

A versão aprovada pela Câmara previa a inclusão da segurança perimetral em estabelecimentos prisionais, mas a parte relativa aos presídios foi excluída pelo relator, assim como as regras para a prestação desses serviços que proibiam, por exemplo, o exercício de atividades carcerárias por esses agentes. Segundo Laércio Oliveira, a atuação da segurança privada em presídios demanda um debate mais aprofundado, que não extrapole as competências da polícia penal.

 

Em relação à vigilância em transportes, o projeto especifica que a Polícia Federal poderá autorizar o porte de arma de fogo para os vigilantes que atuam em serviços de transporte público terrestre, aquaviário ou marítimo.

 

Capital mínimo

 

O substitutivo estabelece a exigência de um capital social mínimo para a obtenção da autorização de funcionamento, variando de acordo com o tipo de serviço prestado. Para empresas de transporte de valores, o capital mínimo será de R$ 2 milhões. Para empresas de gerenciamento de risco no transporte de valores, o valor será de R$ 200 mil, e para as demais empresas, R$ 500 mil. Este último valor poderá ser reduzido para R$ 125 mil para empresas cujos profissionais atuem desarmados na segurança patrimonial e de eventos.

 

As escolas de formação de profissionais da área deverão possuir capital mínimo de R$ 200 mil, e as de monitoramento de sistemas eletrônicos de segurança, R$ 100 mil. Empresas que prestam mais de um serviço deverão adicionar R$ 100 mil ao capital mínimo exigido para cada serviço adicional autorizado. No entanto, o texto não especifica qual valor será considerado como referência para novas empresas que solicitarem autorização para mais de uma atividade simultaneamente.

 

Uma emenda do relator determina que os valores previstos no substitutivo sejam corrigidos pela inflação, utilizando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA), desde a data de envio do substitutivo pela Câmara (dezembro de 2016) até a data atual, resultando em um índice de 46%. Os valores previstos no texto seriam por unidade da Federação, mas essa parte foi suprimida pelo relator.

 

Na justificativa, Laércio Oliveira argumentou que a exigência de capital social mínimo integralizado em cada estado e no Distrito Federal para autorização de funcionamento de uma empresa de segurança prejudicaria a livre concorrência no mercado. As empresas também deverão comprovar a existência de provisão financeira, reserva de capital ou seguro-garantia para garantir o cumprimento de obrigações trabalhistas, tributárias, previdenciárias e de responsabilidade civil.

 

Proibições

 

O texto aprovado proíbe a participação de estrangeiros no capital votante de empresas de transporte de valores. Bancos estão proibidos de participar do capital de empresas especializadas em segurança privada e de constituir serviço orgânico para o transporte de valores. As empresas que já atuam no mercado terão um prazo de dois anos para se adequarem a essas regras.

 

O projeto de lei proíbe as seguradoras de emitir, em favor de instituições financeiras, apólices de seguros que incluam cobertura para roubo e furto qualificado de valores sem a comprovação do cumprimento das exigências legais. Em seguros contra roubo e furto qualificado de estabelecimentos financeiros, o substitutivo prevê a concessão de descontos nos prêmios pagos se os segurados possuírem outros meios de proteção definidos em regulamento, além dos requisitos mínimos de segurança.

 

As empresas de segurança privada e aquelas que possuem serviço orgânico de segurança privada terão um prazo de três anos, a partir da publicação da lei, para se adequarem às novas exigências. O substitutivo também estabelece sanções administrativas para os prestadores de serviço de segurança privada, empresas com serviços orgânicos de segurança privada e instituições financeiras que descumprirem as normas, incluindo advertências, multas e cancelamento da autorização de funcionamento ou interdição.

 

Além disso, tipifica o crime de organizar, prestar ou oferecer serviços de segurança privada com a utilização de armas de fogo sem autorização de funcionamento, com pena de detenção de um a três anos e multa.

 

Cotas

 

Em votação, os senadores rejeitaram, contrariando o voto do relator, um destaque apresentado pelo PSD que pretendia suprimir do texto um artigo que excluía vários tipos de vigilantes da base de cálculo de postos de trabalho a serem ocupados por aprendizes e pessoas com deficiência. A manutenção do artigo impediria a contratação de menores aprendizes e pessoas com deficiência. “O artigo discrimina os trabalhadores com deficiência e os jovens aprendizes, abrindo um precedente perigoso contra as cotas de contratação previstas em lei. Tenho certeza de que nenhum senador aqui deseja retroceder em direitos duramente conquistados”, argumentou a senadora Mara Gabrilli em defesa da aprovação do destaque.

 

Senadores que votaram contra o destaque argumentaram que as empresas de segurança não conseguiriam cumprir as cotas para menores aprendizes devido às restrições legais que proíbem menores de 21 anos de exercerem esse tipo de atividade. O senador Esperidião Amin sugeriu que o tema seja debatido em um novo projeto de lei, a fim de tratar especificamente dessa questão, não apenas no âmbito das empresas de segurança.

 

Entre as mudanças promovidas pelo relator, destaca-se a retirada do texto de dispositivos que obrigariam as empresas de transporte de bens e valores a equipar pelo menos um dos vigilantes de cada carro-forte com sistema de gravação de vídeo, com áudio, localização geográfica e capacidade de transmissão. As empresas também seriam obrigadas a monitorar esse sistema remotamente. Para o relator, a exigência seria desproporcional, considerando que nem mesmo as polícias militares possuem essa obrigação.

 

Outras alterações

 

O relator também excluiu do substitutivo um trecho que classificava os serviços de segurança em bancos como essenciais. Na visão de Laércio, a medida restringiria o direito de greve desses trabalhadores. A obrigatoriedade de instalação, nas agências bancárias, de porta de segurança com detector de metais ou tecnologia equivalente e de porta da tesouraria com identificação biométrica para abertura também foi suprimida. Para o relator, os itens e medidas de segurança descritos podem ser considerados obsoletos em relação ao avanço tecnológico do setor, sendo mais adequado delegar esses detalhes à regulamentação, que possui maior flexibilidade para ser atualizada.

 

Outra alteração importante foi em relação à aprovação automática de novos pedidos de autorização de funcionamento de empresas de segurança privada. Para o relator, a renovação automática poderia contribuir para o aumento da clandestinidade e da concorrência desleal no setor. De acordo com o texto aprovado, se os pedidos de renovação não forem analisados em até 30 dias após a entrega da documentação, os documentos de protocolo servirão apenas como renovação “temporária e precária” para o exercício da atividade.

 

Também foram excluídos trechos que tratavam da criação do CNASP – Conselho Nacional de Segurança Privada como órgão do Ministério da Justiça e da destinação dos valores arrecadados com multas para o Funapol – Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal.

 

A possibilidade de a Polícia Federal delegar a totalidade das atividades de fiscalização e controle da prestação dos serviços de segurança privada para as secretarias de Segurança Pública dos estados também foi descartada pelo relator. Pela redação aprovada, apenas parte dessas atribuições poderá ser delegada, conforme regulamento.

 

Fonte: Migalhas

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