A campanha do CNJ

O Conselho Nacional de Justiça vem se empenhando em conscientizar os juízes sobre a importância de aplicarem a simplificação da linguagem às suas decisões. Para tanto, foi criado o Selo Linguagem Simples, pela Portaria 351/2023, na linha da Recomendação nº 144/2023.

 

Em resumo, a referida campanha busca eliminar termos exageradamente formais, usar linguagem concisa e direta, usar expressões claras e acessíveis à compreensão das partes, evitar jargões e termos técnicos desnecessários (exemplos: inobstante, no que pertine, agitar os declaratórios, inexitoso, incabimento, bojo dos autos, em sede de, provas carreadas para os autos, alhures etc.).

 

O propósito do CNJ é tornar a linguagem judicial menos complexa para evitar impacto negativo sobre diferentes grupos sociais, principalmente os de baixa escolaridade.

 

A linguagem escalafobética

Vistos et coetera. Inicialmente passo a gizar a dissensão em testilha, provocada pela indócil lidadora que vê increpada negativa de vigência da Lei dos Ritos, na alheta do ensino de processualistas de truz.

 

Da análise perfunctória do caderno processual, tenho comigo, data venia, que o judicioso representante do Parquet tem razão ao pressentir, na súplica de folhas, uma alteração da pretensão sub examine, exposta  na peça de ingresso.

 

Inobstante esse posicionar, o fato de o custos legis requerer, ao arrimo de intempestiva, o desentranhar da postulação de folhas, não faz condão à eiva de nulidade.

 

Ex positis, hei por bem, como decidido tenho, em indeferir o pleito da cônjuge virago.

 

A simplificação que se pretende

A meu ver, com a devida emergência, é essa linguagem escalafobética que se pretende acabar definitivamente. Por incrível que pareça, ainda se encontram adeptos desse cipoal de termos ininteligíveis.

 

Com mais extensão e profundidade, o conselho pretende que seja adotada, em todos os atos judiciais, a linguagem clara e acessível, sem rodeios e sem invencionices novidadeiras que surgem a qualquer momento, como a que está em vigor agora, de referir-se ao juiz de primeiro grau como juiz de piso, juiz da planície e juiz da terra.

 

Ao contrário do que pode parecer, a linguagem simples não é a linguagem esparramada, estereotipada, coloquial, sem qualquer preocupação com o mínimo de firmeza e objetividade, desprezando os termos que fazem parte da ciência processual. Com acerto, já dizia Valéry que o estilo deve ser leve como o pássaro, mas não como uma pluma.

 

Tenho lido alguns artigos feitos por doutores e pós-doutores com um hermetismo impenetrável, o que demonstra que o autor não entendeu bem o tema de que está falando, pois não sabe traduzi-lo em linguagem adequada. Com razão Miguel Unamuno quando disse que “escreve claro quem concebe ou imagina claro.”

 

A simplificação que se almeja deve abolir os termos barrocos e refratários às mudanças naturais. Parece incrível, mas ainda persiste a influência da Casa de Suplicação refletida no uso da terminologia “suplicante” e “suplicado.”

 

As limitações deste espaço não me permitem que adentre às discussões estimulantes que este tema provoca, principalmente as levantadas por Lênio Streck, tão oportunamente, nesta coluna.

 

Conclusão

Assim, em conclusão, resumo dizendo que não se pode exigir dos juízes técnicas de um escritor, mas isso não o exime de buscar aperfeiçoar sua linguagem, o que só se consegue com leituras, leituras, leituras.

 

Para esse propósito, destaco a cartilha de Italo Calvino — “Seis propostas para o próximo milênio” — a sugestão da leveza e da rapidez no estilo contemporâneo. A ausência de rapidez (agilidade concisa) tem levado advogados a produzirem peças com oitenta e duzentas laudas. No momento em que vivemos, com excesso indomável de demandas, a rapidez no estilo judicial e nas petições forenses será uma forma de contribuição efetiva para alcançar a simplificação da linguagem.

 

Concordo plenamente com Lenio Streck quando coloca o impasse de como ensinar linguagem simples para quem não sabe escrever nem sequer a linguagem difícil.  Ele nunca vai entender por que um escritor tão aclamado como Graciliano Ramos escreve de maneira tão leve. Se o sujeito não lê nada, como vai distinguir o desafio da linguagem?

 

Fonte: Conjur

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