Riscos inerentes a alienação do imóvel ocorre após a inscrição de créditos da Fazenda em dívida ativa, à luz do no REsp 2.047.615/MG
Adquirir uma casa ou um apartamento é para muitos, a concretização de um sonho e um investimento da vida toda ou de boa parte dela e para este momento tão especial é importante que o adquirente esteja atento e tome alguns cuidados para evitar transtornos e prejuízos.
Um dos riscos mais significativos que pode acontecer com uma compra de um imóvel é o reconhecimento de fraude à execução fiscal, que pode levar à penhora do bem, mesmo que este tenha sido adquirido de boa-fé. O presente artigo tem como objetivo analisar os riscos inerentes a essa situação, especialmente quando a alienação do imóvel ocorre após a inscrição de créditos da Fazenda em dívida ativa, à luz do recente julgado do STJ no REsp 2.047.615/MG.
O núcleo da questão reside na interpretação do art. 185 do CTN – Código Tributário Nacional, com a redação dada pela LC 118/2005. Citado comando legal estabelece que se presume fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.
A partir dessa alteração legislativa, consolidou-se o entendimento de que a simples alienação ou oneração de bens pelo devedor insolvente, após a inscrição do crédito tributário em dívida ativa (o que ocorre a partir de 9/6/2005), gera uma presunção absoluta de fraude.
Tal presunção, conforme o estabelecido no REsp 1.141.990/PR, relatado pelo ministro Luiz Fux (DJe de 19/11/10, Tema 290/STJ), impõe o reconhecimento da ineficácia do negócio jurídico realizado. Isso significa dizer que a Fazenda Pública credora poderá desconsiderar a transferência de propriedade e penhorar o imóvel do comprador para satisfazer o crédito tributário, mesmo que o adquirente tenha por exemplo, alegado que registrou a compra em cartório e que agiu de boa-fé.
No caso analisado no AgInt no REsp 2047615/MG, os adquirentes de determinado bem imóvel interpuseram agravo interno contra a decisão que reconheceu a ocorrência de fraude à execução, mantendo a penhora sobre o imóvel adquirido. O Tribunal a quo, no caso o Tribunal de Minas Gerais, havia decidido em conformidade com a orientação do STJ, destacando que a alienação ocorreu após a inscrição do débito fiscal em dívida ativa e o ajuizamento da execução fiscal, sem que a devedora comprovasse a existência de outros bens para garantir a execução.
Observe que nesse caso, mesmo que o adquirente do imóvel possa alegar boa-fé, esse argumento, por si só, tal argumento não será suficiente para afastar a presunção de fraude estabelecida pelo art. 185 do CTN, isso porque a jurisprudência do STJ tem sido firme no sentido de que a inscrição do crédito em dívida ativa é o marco temporal para a configuração da fraude, independentemente da intenção do comprador.
Além disso, o recurso em análise trouxe um outro ponto que deve ser observado e chama a atenção, que é a alegação de impenhorabilidade do bem de família, argumento que também foi afastado no julgado com base no entendimento reiterado do STJ de que a impenhorabilidade do bem de família somente socorreria a parte executada/alienante, não os adquirentes.
Além disso, a Corte Superior tem se posicionado no sentido de que, uma vez reconhecida a fraude à execução, a impenhorabilidade do bem de família deve ser afastada, prevalecendo o interesse da Fazenda Pública na satisfação do crédito tributário. Ou seja, o comprador não está acobertado pelo manto da impenhorabilidade do bem de família.
A aquisição de um imóvel exige cautela e a adoção de medidas preventivas para evitar surpresas desagradáveis, transtornos e prejuízos. O reconhecimento de fraude à execução fiscal, especialmente nos casos em que a alienação ocorre após a inscrição do crédito em dívida ativa, representa um risco significativo para o adquirente.
A presunção de fraude estabelecida pelo art. 185 do CTN, com a redação dada pela LC 118/2005, impõe a necessidade de uma due diligence rigorosa. A boa-fé do adquirente, por si só, não é suficiente para afastar a possibilidade de penhora do imóvel, e a alegação de impenhorabilidade do bem de família pode não ser acolhida em caso de fraude à execução.
Em tal cenário, é imprescindível que o adquirente de um imóvel seja diligente, podendo se valer antes de concretizar a transação do auxílio de um advogado especializado que buscará a realização de uma due diligence completa, que inclua, por exemplo, a verificação da existência de débitos inscritos em dívida ativa, ações judiciais e outros gravames que possam comprometer a segurança jurídica da aquisição do tão sonhado bem.
Fonte: Migalhas
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