Projeto de Emenda Constitucional propõe excluir os precatórios das regras do arcabouço fiscal de 2026 e cria um cronograma de inclusão desses gastos dentro das despesas primárias em 10 anos
O Senado aprovou em primeiro turno, na noite passada (16), a PEC dos Precatórios. Já validada na Câmara dos Deputados por ampla maioria, a proposta de emenda constitucional prevê alterar regras de pagamento das dívidas judiciais dos entes públicos – e merece atenção dos investidores, sempre sensíveis ao sobe e desce do risco fiscal nacional.
Mas, antes de você saber do possível impacto no mercado, vale entender o que está em jogo.
O que prevê o projeto?
A nova legislação retira os precatórios federais do limite de despesas primárias do Executivo em 2026, e estabelece que elas serão incluídas progressivamente no gasto primário no decorrer de 10 anos, começando com 10% em 2027.
O projeto, de autoria de Baleia Rossi (MDB), volta agora ao Senado, que irá analisar as emendas. Se aprovado como está, as dívidas judiciais seriam contabilizadas integralmente nos gastos primários – e, portanto, no arcabouço fiscal – só a partir de 2036.
A solução, costurada com o Ministério do Planejamento e Orçamento, resolve o imbróglio dos precatórios legado pelo governo anterior. A autorização dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu o pagamento de parte destas despesas fora das regras do arcabouço acaba em 2026. Sem a PEC, haveria inclusão de R$ 70 bilhões nos gastos primários já em 2027.
Mas gastos públicos, então?
Calma. Essa exclusão não permitirá exatamente maior espaço para os gastos do governo no ano que vem. O limite para o próximo ano será recalculado, retirando o sublimite de precatórios (ou seja, o valor que foi contabilizado nos gastos primários de 2025 para essas dívidas) corrigido pela inflação mais o crescimento de 2,5% permitido pelo arcabouço fiscal.
Além disso, há uma mudança na forma de cálculo dos juros, antes realizados com base na Selic, e que agora será feita com base no IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) mais compensação de juro simples de 2% ao ano. Se esse índice superar a Selic, ela que será usada como base de cálculo.
O aumento acelerado do volume de precatórios é um ponto nebuloso da discussão, afirma Murilo Viana, especialista em contas públicas. “O precatório é sinal de que algo deu errado. Mas a gente não tem um raio-X, diagnóstico, nem meios de ação para lidar com isso. Essa falta vai exigir uma articulação entre os três poderes, para identificar a causa desse problema”.
Municípios são os mais atingidos
A PEC inclui também uma definição sobre os precatórios e dívidas previdenciárias dos estados e municípios. Ela cria um limite progressivo para o pagamento dos precatórios dos municípios, que varia de acordo com as receitas líquidas. Se o estoque de valores a pagar for de até 15% da receita corrente líquida do ano anterior, o município ou estado poderá pagar apenas títulos cuja soma seja equivalente a 1% da receita.
Os percentuais crescem de acordo com a proporção das dívidas em relação às receitas. Se o estoque for maior que 85% da receita, o percentual chega a 5%. Se, após 10 anos, ainda houver estoques em atraso, os percentuais serão aumentados em 0,5 ponto percentual.
Beleza, resumindo a ópera, e o risco fiscal?
Com a palavra, os especialistas…
Na avaliação do economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, a PEC resolve o problema dos precatórios ao estabelecer previsibilidade, com indicação de qual valor vai sensibilizar o teto de gastos e a meta fiscal. Mas não resolve o problema dos gastos públicos. Nesse sentido, ela tem consequências neutras para o mercado.
“Não é uma solução para o problema do crescimento do gasto obrigatório, da rigidez orçamentária e mesmo para o problema estrutural dos precatórios. O problema fiscal do ano que vem ainda não está resolvido. O que essa questão dos precatórios faz é trazer uma solução mais de longo prazo para o problema de como tratar esses gastos nas regras fiscais vigentes”, explica Salto.
Já para a economista-chefe da Lifetime Investimentos, Marcela Kawauti, retirar este gasto da meta dá uma sinalização negativa sobre o compromisso do governo com o próprio arcabouço fiscal. Ela prevê que, caso seja aprovada do jeito que está, a PEC vai piorar as expectativas de inflação e manter juros altos por mais tempo.
“A PEC ajuda o governo a cumprir a meta de zerar as contas públicas, mas sem endereçar o problema principal. Ao retirar parte dos gastos do que é contabilizado como gasto primário, você não endereça a necessidade de fazer cortes [de despesas]”, opina Kawauti. Na sua opinião, a alternativa de computar o valor inicial dos precatórios como gasto primário e os juros como despesa financeira, proposta que foi aventada inicialmente, seria mais adequado.
Fonte: Valor Investe


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