Caso da apresentadora Ana Hickman joga luz sobre o tema

 

Já faz mais de um mês que a apresentadora Ana Hickman registrou um boletim de ocorrência alegando que foi agredida e ameaçada pelo, agora ex-marido, Alexandre Correa.

 

Após o empresário responder à acusação e negá-la, o casal iniciou um processo de separação. Desde então, a mídia vem cobrindo o caso e trazendo à tona revelações sobre questões como relacionamento abusivo, fraudes nas empresas do casal e dívidas milionárias.

 

Nesta semana foi divulgada a informação de que a apresentadora formalizou uma denúncia em que alega que o ex-marido faz parte de uma organização criminosa que, entre outras fraudes, mantém um esquema de pirâmide financeira.

 

As notícias vêm criando um terreno fértil para discussões jurídicas diversas. Temas relacionados à Lei Maria da Penha, como violência física e patrimonial ganharam destaque. Da mesma forma, a partilha de bens e a responsabilidade pelo pagamento de dívidas contraídas em nome do casal e das empresas das quais eles são sócios.

 

Não há dúvidas que o caso, em razão de suas nuances, de seus personagens e do enorme patrimônio envolvido, ainda renderá muitas manchetes.

 

Mas para nós uma questão merece maior atenção, pois é comum que ela gere conflitos ou transtornos durante processos de dissolução de um casamento.

 

Estamos falando da partilha de cotas das empresas em nome dos cônjuges. Ela deverá ser providenciada tanto quando apenas um deles é sócio de uma empresa quanto na hipótese em que eles mantêm uma sociedade entre si.

 

A questão pode virar um tormento porque há uma confluência do regime de bens do casal com a propriedade das cotas. Para nós advogados, é quando o direito de família e o direito empresarial se encontram.

 

O fato é que definir em que condições as cotas sociais do cônjuge podem ser consideradas partes integrantes do patrimônio comum do casal é muitas vezes uma questão complexa.

 

Em algumas situações as cotas pertencerão a apenas um dos cônjuges. Isto ocorre, por exemplo, se a empresa já existia antes do casamento ou se ele as recebeu por herança ou doação. Se o regime de casamento for o da comunhão parcial, as cotas nesses casos não precisarão ser divididas, quando ocorrer o divórcio.

 

Há casos, porém, em que as cotas farão parte do patrimônio do casal e deverão ser objeto de partilha. Imagine que um dos cônjuges tenha 10.000,00 cotas de uma empresa que foi constituída durante o casamento regulado pelo regime da comunhão parcial. Ocorrendo o divórcio, o outro terá direito à metade delas.

 

Como resolver essa divisão? A partilha tornará o ex-marido ou a ex-esposa sócio da empresa?

 

A princípio, não. NossoCódigo Civil, ao tratar da matéria, prevê que, no caso de dissolução do casamento, o ex-cônjuge não ingressa, via de regra, na sociedade como sócio e que ele não pode pedir, de uma vez, que aquelas cotas sejam convertidas em dinheiro.

 

Essa norma visa evitar dois problemas: que um estranho passe a fazer parte de uma sociedade que geralmente tem outros sócios e que a empresa tenha que desembolsar valores de seu caixa ou patrimônio para a liquidação daquelas cotas.

 

Mas o código traz uma ressalva. O ex-cônjuge pode pleitear a divisão dos lucros relativos àquelas cotas. Na prática é como se ele passasse a se tornar sócio do ex-marido ou da ex-esposa, ou seja, sócio do sócio.

 

Mas até quando essa situação deve perdurar? E como resolvê-la?

 

Quando o casal tem imóveis, veículos e dinheiro, se não ocorrer uma partilha amigável, o juiz da vara de família ou da vara cível pode determinar a venda judicial desses bens e a divisão entre eles do valor apurado.

 

Mas para que ocorra a conversão daquela participação nas cotas em dinheiro é preciso ajuizar uma ação denominada apuração de haveres.

 

Este é o caminho previsto em nossa lei processual. Porém, não é fácil trilhá-lo já que algumas questões ainda geram dúvidas entre advogados e juízes.

 

De um lado há quem entenda que o ex-cônjuge pode ajuizar uma ação de dissolução parcial de sociedade contra a empresa, agindo como um sócio age quando se retira da empresa e faz um pedido judicial para receber o valor correspondente às suas cotas.

 

Para outra corrente, a ação deve ser proposta contra o ex-marido ou ex-esposa, para que ele pague o referido valor, como se fosse uma dissolução de condomínio.

 

Como se vê, a lei resolve em parte a situação e o entendimento da jurisprudência não é pacífico. O problema poderá ser ainda maior quando marido e mulher forem sócios da mesma empresa, como é o caso da apresentadora Ana Hickman e do empresário Alexandre Correa. Afinal, serão donos de suas cotas e meeiros na cota do outro.

 

O ideal, portanto, é, na medida do possível, tentar antever tais problemas para evitá-los. Para isso, pactos pré-nupciais podem ser realizados com cláusulas sobre a questão. E os contratos sociais das empresas devem ser mais detalhados e claros quanto à forma de resolvê-la.

 

O autor desta coluna é Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. É sócio do escritório Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tríplice Marcas e Patentes

 

Fonte: Estado de Minas

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