Os inquéritos das fake news e das milícias digitais, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, geram críticas pela acumulação de funções investigativas e judiciais. A separação das funções de investigar, acusar e punir no sistema jurídico é questionada

 

Não é forçoso dizer que desde a instauração dos procedimentos investigativos que ficaram conhecidos como “inquérito das fake news” e das “milícias digitais” – INQ 4.781 e 4.878, respectivamente, as opiniões têm sido divididas dentre os operadores do direito.

 

Isto porque, apesar de qualquer providência investigatória ocasionar certo abalo emocional naqueles que são alvos da persecução do Estado, os inquéritos mencionados guardam um fator de notável distinção: terem como relator – presidente da investigação – um ministro do STF, destinando-se a apurar fatos supostamente praticados contra a própria Corte.

 

Neste contexto, desde então a atuação da Corte Suprema brasileira, através do ministro Alexandre de Moraes, têm sido alvo de críticas severas a respeito da constatada acumulação das funções no caso concreto, vez que o mesmo sujeito atrai para si a função de investigador, ao mesmo tempo em que é vítima dos fatos apurados.

 

Desta forma, a mesma essência “acumulatória” motivou a insurgência de diversos operadores do direito em decorrência da solicitação de relatórios ao TSE no âmbito dos inquéritos das fake news e das milícias digitais.

 

Ressalta-se, neste sentido, que o sistema acusatório – adotado no ordenamento jurídico brasileiro – é marcado pela separação das funções de investigar, acusar e punir, contexto no qual a vítima atua, via de regra, tão somente como assistente de acusação, auxiliando o órgão acusatório nos casos em que a autoridade judiciária autoriza tal atuação.

 

Além disto, é necessária uma breve rememoração para pontuar que o desarranjo na distribuição das funções da persecução penal resultou na anulação de diversos processos capitaneados pelo então juiz Federal Sérgio Moro.

 

Sob esta perspectiva, as vozes que se insurgem em face da postura adotada pelo STF nos episódios recentes da República são pautas em manifestações eminentemente técnicas, as quais não abrem margem para interpretações tão divagantes que possam resultar na mudança de sentido da norma.

 

Ademais, ressalta-se que as disposições procedimentais insculpidas nas regulamentações que regem a atuação da administração pública reservam valores tão altos quanto a própria higidez do Estado Democrático de Direito, haja vista que o respeito aos procedimentos delineados pelo legislador representa a garantia mínima de cumprir-se o que está escrito.

 

Ainda neste sentido, no que pese ser essencial o respeito às formas estabelecidas em lei – ainda que se esteja a falar de “meros” regimentos internos -, não é demais considerar que a observância destas disposições é apenas o ponto de partida, de modo que a mera documentação dos atos não garante a higidez das providências adotadas, conforme se deseja alegar no caso ilustrado.

 

Deste modo, não é necessária uma incursão extensa e aprofundada em cada inconsistência do cenário vivenciado para que se conclua que a gênese dos episódios recentes está na linha rompida quando da inobservância dos postulados legais que deveriam nortear a atuação daqueles que compõe os poderes constituídos, ou seja, a própria instauração dos inquéritos.

 

Fonte: Migalhas

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