Com 16 anos de atuação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro Luis Felipe Salomão será empossado como vice-presidente da corte na próxima quinta-feira (22/8). Ele e o ministro Herman Benjamin, que assumirá a presidência, conduzirão o tribunal no biênio 2024-2026, em substituição à ministra Maria Thereza de Assis Moura, que teve uma gestão pífia, e ao ministro Og Fernandes, atuais presidente e vice, respectivamente. Os novos dirigentes também assumirão o comando do Conselho da Justiça Federal (CJF).

 

Luis Felipe Salomão construiu a maior parte de sua carreira acadêmica e profissional no Rio de Janeiro, onde se formou em direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e se tornou professor emérito da Escola da Magistratura do estado, tendo ainda dois títulos honoris causa – de doutor pela Universidade Cândido Mendes e de professor pela Escola Superior de Advocacia do Rio.

 

Foi promotor do Ministério Público de São Paulo, mas retornou à capital fluminense para atuar como juiz e desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. No STJ, Salomão tomou posse em junho de 2008 e se destacou como relator de importantes precedentes, sobretudo em matérias de direito privado, na 2ª Seção e na 4ª Turma. Atualmente, é membro da Corte Especial e vem atuando há dois anos como corregedor nacional de Justiça.

 

No Tribunal Superior Eleitoral, foi o encarregado da propaganda eleitoral nas eleições presidenciais de 2018 e corregedor-geral nas eleições municipais de 2020.

 

Autor de livros e artigos jurídicos sobre temas como acesso à Justiça, juizados especiais, arbitragem e direito civil em geral, o ministro preside o conselho editorial da Revista Justiça & Cidadania e coordena o Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da Fundação Getulio Vargas.

 

Comissão para atualizar o Código Civil

Recentemente, Salomão presidiu a comissão de juristas instituída pelo Senado Federal para atualizar o Código Civil (Lei 10.406/2002). Com participação da ministra Isabel Gallotti e dos ministros João Otávio de Noronha, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze (vice-presidente da comissão), além do ministro aposentado Cesar Asfor Rocha, o grupo de trabalho promoveu audiências públicas pelo Brasil e recebeu sugestões da sociedade civil.

 

Na entrega do anteprojeto de lei, em solenidade no plenário da casa legislativa, Salomão refletiu sobre o desafio de propor um texto que fosse, ao mesmo tempo, adequado para o presente e projetado para o futuro, atualizando diversos temas que estão presentes na vida da população. “Trouxemos todo o conhecimento técnico-jurídico que conseguimos obter pelo consenso da doutrina ou pelos avanços da jurisprudência. A entrega de hoje é simbólica, mas carregada de conteúdo”, declarou.

 

Além de abordar assuntos já presentes no Código Civil, o anteprojeto de lei oferecido pela comissão traz inovações, como a criação de um livro próprio sobre direito digital, que aborda, entre outros pontos, regulação das redes sociais e especificidades sobre contratos e herança digital — matéria que envolve, por exemplo, moedas digitais.

 

Em 2012, o ministro havia presidido a comissão de juristas constituída pelo Senado para propor a legislação que ampliou a arbitragem e criou a mediação no Brasil (Leis 13.129/2015 e 13.140/2015).

 

Ações voltadas para o cidadão

No biênio 2022-2024, à frente da Corregedoria Nacional de Justiça, Salomão recebeu 18.841 mil processos, dos quais 18.466 foram baixados. Entre as ações executadas, destacam-se o Registre-se!, programa de emissão de documentos para populações vulneráveis; Solo Seguro e Solo Seguro Favela, de regularização fundiária; e a campanha Um Só Coração, de estímulo à doação de órgãos.

 

O combate à violência contra a mulher foi tratado no Provimento CNJ 147/2023, que criou um protocolo específico de atendimento às vítimas nos casos envolvendo magistradas e servidoras. Em relação às inspeções, o período teve visitas aos tribunais dos 26 estados e do Distrito Federal, além de 14 correições extraordinárias. Nessas inspeções, a corregedoria também identificou boas práticas e passou a incentivá-las.

 

Direito ao esquecimento e a liberdade de imprensa

No STJ, no campo do direito do consumidor, o ministro Salomão definiu, em julgamento da 4ª Turma (REsp 984.106), que o prazo para reclamar de produto que tenha problema estrutural não decorrente de uso e desgaste (vício oculto) se inicia no momento em que for evidenciado o defeito, mesmo que isso tenha ocorrido após o prazo da garantia contratual.

 

O magistrado ressaltou que o fornecedor não ficará para sempre responsável pelos produtos colocados em circulação. No entanto, “a sua responsabilidade não se limita pura e simplesmente ao prazo contratual de garantia, o qual é estipulado unilateralmente por ele próprio. Deve ser considerada para a aferição da responsabilidade do fornecedor a natureza do vício que inquinou o produto, mesmo que tenha ele se manifestado somente ao término da garantia”.

 

No julgamento do REsp 1.335.153, Salomão analisou a possibilidade de aplicação do direito ao esquecimento no caso Aída Curi, jovem que foi violentada e assassinada em 1958, com grande repercussão à época. Os familiares da vítima ajuizaram ação contra a Globo Comunicações e Participações S.A., que revisitou a história em um programa de TV.

 

O relator na 4ª Turma ponderou que a reportagem contra a qual se insurgiram os familiares foi ao ar 50 anos após a morte de Aída Curi, circunstância que afasta o possível abalo moral capaz de gerar responsabilidade civil. “Fazendo-se a indispensável ponderação de valores, o acolhimento do direito ao esquecimento, no caso, com a consequente indenização, consubstancia desproporcional corte à liberdade de imprensa, se comparado ao desconforto gerado pela lembrança”, concluiu o ministro.

 

Planos de saúde e direitos do produtor rural

No âmbito da 2ª Seção, Salomão foi o relator de diversas teses fixadas sob o rito dos recursos repetitivos. No Tema 1.082, o colegiado entendeu que a operadora, mesmo após rescindir de forma unilateral o plano ou o seguro de saúde coletivo, deve garantir a continuidade da assistência a beneficiário internado ou em tratamento de doença grave, até a efetiva alta, desde que ele arque integralmente com o valor das mensalidades.

 

No Tema 1.145, Salomão foi o relator do acórdão que consolidou o entendimento segundo o qual o produtor rural que exerça sua atividade de forma empresarial há mais de dois anos pode requerer recuperação judicial, desde que esteja inscrito na Junta Comercial quando formalizar o pedido de recuperação, independentemente do tempo de seu registro.

 

Na Corte Especial, o ministro relatou a ação penal (APn 866) em que se decidiu restringir o foro por prerrogativa de função para governadores. Por meio do princípio da simetria, o acórdão adotou a restrição aplicada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em relação a deputados e senadores, a qual estabeleceu que os parlamentares só fazem jus ao foro especial em processos sobre crimes ocorridos durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo.

 

No caso analisado, o colegiado determinou que a ação, na qual o ex-governador da Paraíba Ricardo Vieira Coutinho era acusado de supostos crimes praticados antes de assumir o cargo, fosse remetida à Justiça estadual.

 

Direitos a minorias

Entre os casos de grande repercussão social decididos no STJ sob a relatoria do ministro Salomão, destaca-se o julgamento de 2011 no qual a 4ª Turma deu provimento ao recurso de duas mulheres para declarar que nenhum dispositivo do Código Civil veda expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Para o relator, não haveria como enxergar na lei uma vedação implícita ao casamento homoafetivo sem afrontar os princípios constitucionais da igualdade, da não discriminação, da dignidade da pessoa humana, do pluralismo e do livre planejamento familiar.

 

“Se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os arranjos familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar, independentemente de orientação sexual dos partícipes”, afirmou o ministro.

 

Em 2017, a 4ª Turma decidiu que, independentemente da realização de cirurgia de adequação sexual, é possível alterar o nome e o sexo constantes no registro civil de pessoas transgênero, desde que comprovada judicialmente essa condição. Até então, o STJ só tinha admitido a mudança do nome e da indicação de sexo no registro de pessoas submetidas à cirurgia. Com informações da assessoria do STJ.

 

Fonte: Conjur

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