A PLP 108/24 propõe tributar dividendos como doações para ITCMD, gerando controvérsias por sua possível inconstitucionalidade e vagueza. A proposta pode afetar a liberdade empresarial e as práticas societárias

 

A tributação dos dividendos é um tema amplamente debatido no contexto das reformas tributárias, gerando considerável inquietação para os empresários brasileiros, já que, no regime atual, os dividendos não estão sujeitos à tributação.

 

Até o momento, não havia expectativa de uma alteração legislativa iminente que permitisse a tributação sobre dividendos. No entanto, a situação mudou com a apresentação da PLP 108/24, que, de forma totalmente desvirtuada da Emenda Constitucional que ensejou a sua proposição, equipara certos atos societários à doação para fins de incidência do ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, incluindo a distribuição desproporcional de dividendos:

 

“Consideram-se, ainda, como doações, para fins da incidência do ITCMD, em transmissões entre pessoas vinculadas:

 

os atos societários que resultem em benefícios desproporcionais para sócio ou acionista praticados por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação, incluindo distribuição desproporcional de dividendos, cisão desproporcional e aumento ou redução de capital a preços diferenciados; e

o perdão de dívida por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação.”

É fundamental destacar a inconstitucionalidade da redação que equipara a distribuição desproporcional de lucros à doação para ampliar a hipótese de incidência do ITCMD. A distribuição de lucros, sendo um instituto de natureza eminentemente societária, é regulada pelo Código Civil, que autoriza sua realização de forma desigual, tendo em vista que tal deliberação decorre de questões financeiras ou operacionais.

 

A despeito da evidente inconstitucionalidade desta equiparação para fins tributários, ao estabelecer requisitos eminentemente subjetivos para classificar tais atos como doação, o legislador deixa uma margem excessiva para que os entes federados exijam o tributo em qualquer operação que considerarem não possuir “justificativa negocial”, um conceito extremamente vago e subjetivo, especialmente no contexto de decisões empresariais, uma vez que a liberdade dos empresários e empresas para tomar suas decisões econômicas é garantida pela Constituição Federal1.

 

Portanto, essa alteração terá um impacto significativo nos planejamentos tributários e sucessórios, especialmente para as empresas que distribuem lucros de forma desproporcional por liberalidade, sem uma justificativa negocial clara e comprovável. Se aprovado, as empresas precisarão fornecer uma fundamentação sólida para qualquer distribuição de lucros que não seja proporcional, a fim de evitar que tais distribuições sejam consideradas como doações.

 

Nesse contexto, a norma porposta não apenas ampliará de forma inconstitucional a hipótese de incidência do ITCMD, gerando ainda mais insegurança jurídica no nosso sistema tributário, mas também resultará em um aumento significativo de ações judiciais, sobrecarregando ainda mais o judiciário brasileiro e indo totalmente contra o objetivo original da reforma tributária.

 

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1 Artigo 1º, IV e Artigo 170 da Constituição Federal.

 

Fonte: Migalhas

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