Este artigo tem como objetivo ressaltar os cuidados a serem tomados pelos contribuintes em relação à comprovação e limitações à compensação do imposto pago no exterior, à luz dos entendimentos da Receita Federal e da jurisprudência administrativa mais recentes.

Para tanto, em primeiro lugar, serão apresentados os requisitos legais para compensação do imposto pago no exterior e, após, serão analisadas questões envolvendo a comprovação e limitações no âmbito da Receita e da jurisprudência do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).

Requisitos legais para compensação do imposto pago no exterior

O artigo 26 da Lei nº 9.249/95 possibilita às pessoas jurídicas do lucro real a compensação do “imposto de renda incidente, no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos de capital computados no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil, sobre os referidos lucros, rendimentos ou ganhos de capital.”.

Conforme observa Alberto Xavier, ao assim proceder a legislação consagrou o método da imputação ordinária, em contraposição à imputação integral, segundo o qual o Estado de residência não deduz o montante total do imposto efetivamente pago no país de origem (fonte), mas antes submete a dedução a um limite máximo, qual seja, o limite correspondente à fração do seu próprio imposto correspondente aos rendimentos provenientes do país de fonte [1].

Com isso, a legislação tributária brasileira permite a compensação do imposto de renda pago sobre rendimentos no exterior e limita essa compensação ao valor do imposto de renda devido no Brasil em razão da respectiva adição efetuada na base do IRPJ/CSLL. Além da necessidade de oferecimento dos rendimentos auferidos no exterior à tributação no Brasil, os demais requisitos para compensação estão estabelecidos nos três parágrafos do artigo 26.

Primeiramente, em relação ao cálculo do limite referido no artigo 26, o §1º estabelece que “o imposto incidente, no Brasil, correspondente aos lucros, rendimentos ou ganhos de capital auferidos no exterior, será proporcional ao total do imposto e adicional devidos pela pessoa jurídica no Brasil.

O § 2º, por sua vez, trata da comprovação do pagamento do IR no exterior e estabelece que documento relativo ao imposto de renda incidente no exterior deverá ser reconhecido pelo respectivo órgão arrecadador e pelo Consulado da Embaixada Brasileira no país em que for devido o imposto.

De acordo com o § 1º, do artigo 14-A, da Instrução Normativa SRF 213/02 (introduzido pela IN nº 1.772/17), esse requisito pode ser substituído pela apostila de que tratam os artigos 3º a 6º da Convenção sobre a Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros, promulgada pelo Decreto nº 8.660/16, no âmbito dos países signatários, a qual deve ser aposta ao documento do órgão arrecadador em que foi devido o imposto ou em folha apensa e estar acompanhada de tradução juramentada para a língua portuguesa.

Além disso, de acordo com o inciso II, do §2, do artigo 16 da Lei nº 9.430/96, fica dispensada tal obrigação quando o contribuinte comprovar que a legislação do país de origem rendimento prevê a incidência do imposto de renda que houver sido pago, por meio do documento de arrecadação apresentado.

Por fim, o § 3º trata da conversão dos valores e dispõe que o imposto a ser compensado deve ser convertido em reais, de acordo com a taxa de câmbio, para venda, na data em que o imposto foi pago. Caso a moeda em que o imposto foi pago não possua cotação no Brasil, deverá ser convertida em dólares americanos e, posteriormente, em reais.

Deve-se ressaltar que as disposições do artigo 26 da Lei nº 9.249/95 são “regras gerais” de compensação do imposto pago no exterior, de forma que há disposições mais específicas nos casos de compensação com lucros já tributados de controladas no exterior (artigo 87 da Lei nº 12.973/14).

No âmbito infralegal, Instrução Normativa RFB nº 213/02, em seu artigo 14, regulamenta a compensação do imposto pago no exterior e apresenta disposições relevantes, dentre as quais destacamos as seguintes.

A primeira delas diz respeito ao que se considera como imposto de renda pago no exterior para fins de compensação, De acordo com o artigo 14, § 1º, será assim considerado o tributo que incide sobre o lucro, independentemente da denominação oficial adotada e do fato de ser este de competência de unidade da federação do país de origem.

Ainda, o § 7º do artigo 14 ressalta que o imposto pago no exterior, passível de compensação, será sempre proporcional ao montante dos lucros, rendimentos ou ganhos de capital que houverem sido computados na determinação do lucro real. Além disso, o valor a ser considerado será do imposto efetivamente pago no exterior, não sendo permitido o aproveitamento de crédito de tributo decorrente de benefícios fiscais (§ 8º).

Por fim, vale ressaltar o § 9º, que traz importante disposição ao estabelecer que o valor do imposto pago no exterior, a ser compensado, não poderá ultrapassar o montante do imposto de renda devido no Brasil sobre os rendimentos incluídos na apuração do lucro real. Os parágrafos 10º e 11º tratam da fórmula de cálculo do limite e valor compensável, que será apresentada a seguir na análise dos entendimentos da Receita.

Apresentada a legislação pertinente à compensação do imposto de renda pago no exterior, analisaremos a aplicação de tais regras, primeiramente pela Receita, e, posteriormente, no Carf.

Entendimentos da Receita acerca da comprovação e limites do imposto pago no exterior

Como se sabe, para fins de compensação, exige-se certeza e liquidez do crédito a ser utilizado, o que, muitas vezes, causa problemas no caso de compensação do imposto pago no exterior, já que a comprovação deve estar de acordo com os rigorosos requisitos legais.

A manifestação mais recente da Receita quanto à comprovação do imposto pago no exterior consta da Solução de Consulta Cosit nº 185/18.

Na hipótese, a consulente havia pago imposto de renda no exterior referente aos lucros auferidos por intermédio de empresas controladas/coligadas, os quais haviam sido oferecidos a tributação no Brasil, conforme determinam os artigos 77 e 81 da Lei nº 12.973/14.

Diante da permissão de compensação do tributo pago no exterior, o principal questionamento da Consulente dizia respeito à possibilidade de considerar como documento comprobatório do imposto pago a “declaração de rendimento entregue às autoridades fiscais” no exterior, semelhante ao que ocorre no Brasil com a entrega da ECF, pois referido documento demonstraria o imposto incidente e devido ao país.

No entanto, a Receita afirmou que, à luz da legislação, a compensação só seria permitida com a apresentação de documento de arrecadação quitado, de órgão oficial do país de origem do imposto e reconhecido no consulado brasileiro naquele país.

De fato, da análise da legislação anteriormente citada é possível extrair que deve ser apresentado o documento de arrecadação, que comprove que houve pagamento do imposto, não sendo suficiente a mera demonstração de que há imposto sobre a renda no país.

Quanto aos limites para compensação, é oportuno citar a Solução de Consulta Cosit nº 18/21, na qual a Receita foi questionada sobre o cálculo do limite para compensação de imposto pago no exterior. Diante disso, esclareceu a Receita realização do cálculo (§§ 10 e 11 do artigo 14 da IN SRF 213/02), conforme será sintetizado a seguir.

Primeiramente, devem ser obedecidos os seguintes limites para compensação:

(1) valor do imposto pago no exterior, relativamente aos rendimentos computados no lucro real;
(2) valor do imposto apurado no Brasil sobre os referidos rendimentos, de forma proporcional ao total dos resultados apurados no País.

Vale ressaltar que este ponto de partida do cálculo demonstra a essencialidade da devida comprovação do oferecimento à tributação no Brasil dos rendimentos que foram submetidos à tributação no exterior.

Para fins de determinar o valor compensável, devem ser apurados os seguintes elementos:

(1) imposto pago no exterior, relativo aos rendimentos incluídos na apuração do lucro real;
(2) imposto de renda e adicional calculado sobre o lucro real, antes da inclusão das receitas auferidas no exterior;
(3) imposto de renda e adicional calculado sobre o lucro real, após a inclusão das receitas auferidas no exterior.

O valor compensável, por sua vez, será o menor entre os seguintes:

(1) imposto pago no exterior; ou
(2) diferença positiva entre os itens referidos nas letras “iii” e “ii” indicados no item anterior.

Caso não seja possível a compensação, por inexistência de lucro real no período, o direito poderá ser exercido nos períodos de apuração subsequentes (§ 15º).

Além disso, a Receita ressaltou ao final que o procedimento de compensação deve ser realizado no período de apuração em que se reunirem as condições para tal, até se esgotarem os valores.

Os entendimentos ressaltam a necessidade de diligência por parte dos contribuintes, tendo em vista que o ônus probatório e demais requisitos para compensação, tal como a verificação do limite compensável, são de responsabilidade do contribuinte.

Entendimentos do Carf acerca da comprovação e limites do imposto pago no exterior

De forma geral, a jurisprudência do Carf não destoa dos entendimentos manifestado nas Soluções de Consulta da RFB, de forma a seguir mais estritamente os requisitos legais.

No Acórdão nº 1201-003.220, julgado em 20/02/2018, conclui-se por não reconhecer o crédito do imposto pago no exterior levando em conta a imprestabilidade das provas apresentadas pelo contribuinte e a impossibilidade legal de compensar o imposto de renda pago no exterior quando não foi apurado imposto de renda a pagar no Brasil.

Isso porque, o documento apresentado pelo contribuinte para comprovar a arrecadação não cumpria as formalidades legais. Ainda, na escrituração contábil fiscal do contribuinte não constava o lançamento do imposto retido na operação, o que demonstra a relevância da contabilidade como um dos meios de prova nesses casos.

Já no Acórdão nº 1302-002.543, julgado em 17/10/2019, avaliando semelhante situação, o entendimento foi mais flexível em relação à comprovação do direito creditório. O contribuinte apresentou a legislação sobre retenção na fonte e uma declaração de imposto referente ao período fiscal, ambos documentos com tradução juramentada. No entanto, os comprovantes de retenção não estavam acompanhados de tradução juramentada.

Apesar disso, a turma entendeu por aceitar a comprovação, acolhendo os comprovantes sem a tradução juramentada, visto que seriam suficientes à conferência pela autoridade fiscal. Nesse contexto, os elementos apresentados pelo contribuinte foram suficientes à demonstração da certeza e liquidez do imposto pago no exterior, de tal sorte que um de requisitos formais exigidos pela lei foi flexibilizado. Portanto, privilegiou-se o princípio da verdade material que norteia o processo administrativo fiscal tributário com a permissão da comprovação do direito por meios alternativos.

Deve-se advertir que, na grande maioria dos casos julgados pelo Carf, os requisitos legais para comprovação do imposto pago no exterior não costumam ser flexibilizados, de forma que eventual flexibilização dependerá de cada caso concreto.

Por fim, vale ressaltar que no Acórdão nº 1201-003.220, anteriormente citado, houve um argumento da fiscalização que entendemos não ter sido bem analisado e pode suscitar controvérsias.

No caso, o contribuinte havia apurado prejuízo fiscal no período discutido. Diante disso, fiscalização afirmou que o contribuinte não poderia se aproveitar do imposto pago no exterior, pois tal aproveitamento pressuporia haver imposto a ser pago sobre tais rendimentos do exterior.

No entanto, este autor entende ser equivocado tal entendimento, por ausência de previsão legal. A legislação exige que o imposto pago no exterior tenha sido “computado” na apuração do lucro real da empresa, e não que haja efetivo imposto a pagar sobre tal valor. De acordo com o entendimento citado do Fisco, apurado prejuízo fiscal, se perderia a possibilidade de aproveitamento imposto pago no exterior, o que está em desacordo com a própria IN SRF 213/02.

Isso fica claro da leitura do § 15º do artigo 14 da referida IN, o qual dispõe que o tributo pago sobre rendimentos auferidos no exterior, que não puder ser compensado em virtude de a pessoa jurídica, no Brasil, no respectivo ano-calendário, não ter apurado lucro real positivo, poderá ser compensado com o que for devido nos anos-calendário subsequentes.

Em verdade, com bem refere o Relator do Acórdão nº 1402-001.345, na hipótese de se apurar prejuízo fiscal, o que há é uma completa “absorção dos resultados positivos auferidos no exterior pelo prejuízo das operações no Brasil”. Assim, tal fato não pode impedir a compensação do imposto pago sobre os rendimentos no exterior, até porque este implicou em redução do montante do prejuízo fiscal que poderia ser objeto de compensação futura.

Dessa forma, deve ser rechaçada tal argumentação do Fisco, que não possui base legal, tampouco infralegal.

Conclusão

A partir da exposição feita, buscou-se apresentar os principais aspectos envolvendo a comprovação e cálculo do imposto pago no exterior para fins de compensação com o IRPJ/CSLL e destacar os principais problemas e controvérsias enfrentados pelos contribuintes nesse cenário.

Como visto, os contribuintes devem atentar-se aos requisitos legais constantes da Lei nº 9.249/95 e da Instrução Normativa SRF 213/02, assim como observar a jurisprudência, de forma a evitar questionamentos pelas autoridades fiscais e argumentos equivocados do fisco.

[1] XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do brasil. 7. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.p. 427

Fonte: Conjur

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