Muita gente busca diariamente por Usucapião Extrajudicial e acaba seduzido pela doce promessa de solução rápida para obter o RGI do seu imóvel em seu nome, retirando-o da irregularidade. A celeridade do procedimento em Cartório é real, tal como acontece há muito com o Divórcio e o Inventário Extrajudicial, todavia, não é menos verdade que a Usucapião Extrajudicial não deve ser recomendada para todos os casos de Usucapião. Há situações em que as características do procedimento extrajudicial, considerando os aspectos limitados do meio extrajudicial, não terão o condão de resolver o embaraço imobiliário, fazendo com que a todo momento em que o Registrador não possa resolver o desate a questão tenha que ser submetida ao procedimento de dúvida registral (nos termos do art. 198 da LRP c/c art. 420 do Provimento CNJ 149/2023), o que certamente sacrifica a celeridade desejada da via cartorária.

Não devemos ignorar a aflição diária daqueles que possuem um imóvel por anos, cuidam dele como se fosse seu (independentemente de estabelecer moradia ou não), mas não tem o documento de propriedade em seu nome. A usucapião, como sabemos bem, é o remédio jurídico que pode transformar essa realidade, convertendo a posse qualificada em propriedade plena e definitiva. Esse sempre foi um processo longo e complexo que podia levar anos na Justiça. Desde 2015, com o advento do Novo Código de Processo Civil, uma alternativa mais moderna e eficiente ganhou força, autorizando a regularização de imóveis direto no Cartório, sem processo judicial: a USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL. Realizada diretamente nas Serventias Extrajudiciais (Tabelionato de Notas, Cartório do RGI e também Cartório de Títulos e Documentos, como se vê na sistemática regulada pelo Provimento CNJ 149/2023 que substituiu o Provimento CNJ 65/2017), essa modalidade se tornou a via preferencial para regularizar imóveis de forma mais rápida e com menos burocracia, mas certos requisitos precisam ser preenchidos.

O procedimento de Usucapião Extrajudicial, como o nome sugere, tramita fora do Poder Judiciário. Tal como o Divórcio Extrajudicial, o Inventário Extrajudicial e a Adjudicação Compulsória Extrajudicial, ele deve ser conduzido e assistido por um Advogado, obrigatório por Lei. O início do procedimento se dá com a lavratura da ATA NOTARIAL no Tabelionato de Notas, servindo esse instrumento para atestar o tempo e as características da posse. Na sequência, o Patrono deverá reunir toda a documentação necessária e apresentar/peticionar (eletronicamente, de preferência) ao Cartório de Registro de Imóveis competente. Aqui efetivamente começa a tramitação do Procedimento, observadas todas as etapas previstas pelo Provimento CNJ 149/2023, como a citação de antigos proprietários, confinantes, Entes Públicos (Município, Estado e União) etc, além da qualificação do que efetivamente se requer. Estando tudo em ordem, efetuará o registro do imóvel em nome do novo proprietário, reconhecendo a desejada Usucapião em favor do requerente. A principal vantagem é a celeridade: um processo que levaria anos na justiça pode ser concluído em poucos meses.

Para que o leigo possa ter uma ideia inicial se o seu caso tem potencial para ser resolvido por essa via ágil, preparamos um checklist simples com 4 passos fundamentais. Responder a estas perguntas é o primeiro exercício para avaliar a viabilidade do procedimento extrajudicial:

Passo 1: COMO É A SUA POSSE? A posse deve ser exercida com “ânimo de dono”, ou seja, você deve agir como se fosse o verdadeiro proprietário do imóvel, cuidando, pagando as contas (IPTU, água, luz) e realizando benfeitorias. É preciso exteriorizar inequivocamente que quem tem a posse age como dono. Todo exercício de posse de imóvel para fins de Usucapião precisa ser manso e pacífico, isto é, não pode ter havido oposição ou contestação por parte do antigo dono ou de terceiros durante todo o período exigido por Lei para a espécie de Usucapião manejada (devendo ser lembrado que existem várias espécies de usucapião, variando os requisitos de acordo com a espécie).

Passo 2: HÁ QUANTO TEMPO VOCÊ ESTÁ NO IMÓVEL? A lei exige que se complete um período mínimo de posse que precisa ser contínuo e ininterrupto. Esse prazo varia conforme a modalidade de usucapião (geralmente de 5 a 15 anos, mas também existe Usucapião que exige apenas DOIS ANOS). É fundamental que você consiga comprovar há quanto tempo exerce essa posse qualificada, seja por meio de contas antigas, recibos de reformas, fotografias ou testemunhas. Usucapião é situação fática que depende de provas. Ora, quem exerce a posse por 5, 10 ou 15 anos deve ter provas proporcionais pelo tempo que exerce a situação fática, não sendo crível que alguém que afirma morar ou possuir um imóvel por tanto tempo não tenha nada de provas a seu favor.

Passo 3: EXISTE ALGUM CONFLITO/DISPUTA SOBRE O IMÓVEL? Este é o aspecto crucial da Usucapião Extrajudicial: para que o procedimento seja resolvido em Cartório, é imprescindível que não haja briga ou litígio, por mais que em alguns casos o Registrador tenha autorização para reputar algumas oposições como infundadas (impugnações injustificadas, nos termos do §10 do art. 216-A, introduzido pela Lei 14.382/2022) e até mesmo tentar conciliar ou mediar impugnações. O antigo proprietário (aquele que consta na matrícula) e os vizinhos diretos precisam concordar com o seu pedido, ou, no mínimo, não se oporem a ele. Se houver qualquer disputa ou impugnação justificada, o caso obrigatoriamente deverá ser levado à via judicial que é a via adequada para resolução de conflitos.

Passo 4: VOCÊ POSSUI DOCUMENTOS QUE COMPROVEM A POSSE E DESCREVEM O IMÓVEL? Como dissemos, Usucapião é situação fática que se funda em provas, muitas provas; quanto mais provas, mais robusto o pedido. Será necessário apresentar ao Cartório um bom álbum probatório. A identificação do imóvel é imprescindível e, nesse caso, os documentos técnicos mais importantes são planta e o memorial descritivo do imóvel, assinado por Engenheiro ou Arquiteto, que serve como um “mapa” detalhado da propriedade. É bem verdade que há casos onde esse documento pode ser dispensado e, como já falamos em outras passagens, até mesmo a ausência da Certidão da Matrícula não será impeditivo para o pedido extrajudicial. De toda forma, quanto mais documentos você tiver para provar a base da usucapião (COISA hábil, POSSE qualificada e TEMPO necessário) como recibos, faturas, declarações, mais robusto será o seu pleito.

Por fim, é fundamental salientar que este checklist serve apenas como uma orientação preliminar. A consulta a um Advogado Especialista em direito imobiliário é indispensável e insubstituível. Apenas um profissional habilitado e experiente poderá analisar caso a caso a documentação, verificar possíveis entraves (processos entrelaçados com o imóvel, como por exemplo, dívidas, execuções fiscais, inventários, outras ações judiciais etc) confirmar a modalidade de Usucapião aplicável e, crucialmente, verificar se não existem outras formas de regularizar o imóvel que possam ser ainda mais rápidas ou vantajosas. Por mais que a Usucapião Extrajudicial seja cabível em tese, o Advogado avaliará as peculiaridades do caso para confirmar se ela é, de fato, a melhor e mais segura alternativa para garantir o seu sagrado direito à propriedade, sendo certo que em muitos casos a via judicial continua sendo a melhor estratégia.

Fonte: Julio Martins

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