O processo de inventário é o procedimento legal destinado a apurar os bens, direitos e obrigações do de cujus, partilhando-os entre os herdeiros. Contudo, a situação se complexifica consideravelmente quando o falecido deixa dívidas. É uma preocupação comum entre os herdeiros a possibilidade de serem responsabilizados pessoalmente por esses débitos. A legislação brasileira, todavia, estabelece mecanismos claros para a resolução dessas questões, protegendo o patrimônio individual dos sucessores e garantindo a correta liquidação das obrigações do espólio.
A pedra angular da resolução de dívidas no inventário reside no princípio da intra vires hereditatis, ou seja, a responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do falecido é limitada às forças da herança. Isso significa que os herdeiros não respondem com seus bens particulares pelos débitos do de cujus, mas sim com os bens que compõem o espólio. O Código Civil, em seu artigo 1.997, e o Código de Processo Civil, no artigo 796, são enfáticos ao dispor que a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido, e, feita a partilha, cada herdeiro responde na proporção da parte que lhe coube na herança, e nunca além dela.
Para a efetiva resolução, as dívidas do falecido devem ser devidamente habilitadas no processo de inventário. Os credores têm o direito de apresentar suas habilitações, comprovando a existência e o valor de seus créditos. Uma vez reconhecidas, essas dívidas serão pagas prioritariamente com os ativos do espólio, antes que qualquer partilha seja realizada. Caso seja necessário, bens do espólio podem ser alienados (vendidos) para a quitação dos débitos, seguindo a ordem legal de preferência dos credores, que pode incluir dívidas tributárias, trabalhistas, com garantia real, entre outras.
Existem diversas formas de resolver dívidas em inventário, e a escolha da via (judicial ou extrajudicial) dependerá da complexidade e do consenso. Se o patrimônio do de cujus for suficiente para cobrir todos os débitos, estes serão integralmente pagos, e o remanescente será partilhado entre os herdeiros. Embora o inventário extrajudicial seja uma opção célere para casos sem litígio, a presença de dívidas exige que estas sejam quitadas ou que haja expressa concordância de todos os credores para que o procedimento em cartório seja viável. Na ausência de tal consenso ou quitação prévia, a via judicial torna-se imperativa. Caso os ativos sejam insuficientes, configurando a insolvência da herança, os credores serão pagos proporcionalmente aos seus créditos, e as dívidas restantes serão extintas em relação ao espólio, não se transmitindo aos herdeiros. Em situações extremas, e após análise jurídica aprofundada, os herdeiros podem optar pela renúncia da herança, evitando qualquer vínculo com as obrigações do falecido.
A complexidade das nuances legais e processuais envolvidas na gestão de um inventário com dívidas sublinha a importância de consultar um Advogado Especialista em Inventário. Este profissional detém o conhecimento técnico para identificar todas as dívidas e ativos, orientar sobre a melhor estratégia de resolução, negociar com credores, assegurar a correta habilitação dos créditos e, crucialmente, proteger o patrimônio pessoal dos herdeiros de qualquer responsabilidade indevida. A ausência de uma assessoria jurídica qualificada pode resultar em atrasos processuais, perdas financeiras e até mesmo em responsabilizações equivocadas.
Em suma, a existência de dívidas do falecido não impede o processo de inventário, mas exige uma gestão jurídica meticulosa. A legislação brasileira oferece salvaguardas para que os herdeiros não respondam além das forças da herança, garantindo a proteção patrimonial. Contudo, para navegar com segurança por este cenário e assegurar a correta liquidação das obrigações e a partilha dos bens, seja pela via judicial ou, excepcionalmente, pela via extrajudicial (art. 27 da Resolução 35/2007 do CNJ) com quitação ou concordância dos credores, a atuação de um advogado especializado em direito sucessório é não apenas recomendável, mas essencial para a eficácia e a segurança jurídica de todo o procedimento.
Fonte: Julio Martins


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