A partir desta semana, serão publicados diversos artigos em sequência que discutem a respeito da aplicação, ou não, do direito de preferência nos contratos de parceria rural. Além da presente análise, que traz um parâmetro geral dessa discussão, foram analisadas as jurisprudências do Tribunal de Justiça de São Paulo, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Superior Tribunal de Justiça, as quais serão publicadas posteriormente. Desse modo, em razão das diversas omissões legislativas, é preciso verificar o posicionamento da jurisprudência e da doutrina para se obter uma resposta à questão: o direito de preferência é aplicável aos contratos de parceria rural?
 
Nesse sentido, a doutrina divide-se em dois grandes grupos: aqueles que defendem a aplicação do direito de preferência à parceria rural e aqueles que lhe são contrários. No primeiro grupo, encontram-se doutrinadores como Tatiana Bonatti Peres, Wellington Pacheco de Barros, Vilson Farreto, Altamir Pettersen e Nilson Marques, Paulo Guilherme de Almeida e, mudando recentemente de posicionamento, José Fernando Lutz Coelho. Esses autores fundamentam a aplicação do direito de preferência às parcerias mediante duas interpretações: a) interpretação principiológica do Direito Agrário, uma vez que esse visa à preservação das relações jurídicas para continuidade do trabalho na terra e à conservação da empresa rural; b) interpretação extensiva das normas do arrendamento, nos termos do artigo 96, VII do Estatuto da Terra (ET) e artigo 34 do Decreto 59.566/66.
 
No segundo grupo, por sua vez, encontram-se doutrinadores como Oswaldo e Sílvia Opitz, Giselda Hironaka, Paulo Torminn Borges, Fernando Pereira Sodero e, antes de alterar seu posicionamento, José Fernando Lutz Coelho. Esses autores fundamentam a não aplicação do direito de preferência às parcerias também mediante duas interpretações: c) interpretação gramatical do Estatuto da Terra e do decreto regulador, uma vez que esses diplomas não dispõe expressamente acerca desse direito, tampouco o regulam; d) interpretação por natureza jurídica, nessa ideia, o direito de preferência seria cabível apenas aos contratos de arrendamento, uma vez que ele detém natureza jurídica de locação, e não aos de parceria, os quais detém natureza jurídica de sociedade.
 
Ao assumir a corrente da aplicabilidade, entende-se que há duas espécies de direito de preferência nos contratos de parceria rural: o direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural cedido e o direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato.
 
Quando se trata de direito de preferência do parceiro outorgado na aquisição do imóvel rural, deve-se aplicar os artigos 92, §§3º e 4º, do Estatuto da Terra, e, por extensão, os artigos 45 a 47 do Decreto 59.566/66. Isso significa que o parceiro outorgado pode exercer o direito de preferência dentro de 30 dias a contar da notificação extrajudicial feita pelo parceiro outorgante. Além disso, caso não notificado, o parceiro outorgado poderá, depositando o preço, haver para si o imóvel cedido, se o requerer no prazo de seis meses, a contar da transcrição do ato de alienação no registro de imóveis.
 
Já quando se trata de direito de preferência do parceiro outorgado na renovação do contrato de parceria rural, deve-se aplicar os artigos 96, II, do Estatuto da Terra, e, por extensão, o artigo 22 e parágrafos do Decreto 59.566/66. Nesse sentido, o parceiro outorgante deverá notificar o parceiro outorgado sobre propostas recebidas ou sobre a intenção de retomada em até seis meses antes do vencimento do contrato de parceria. Para isso, a notificação deve ser instruída com cópia autêntica das propostas.
 
Quanto à renovação automática, estabelece o §1º do artigo 22 do Decreto 59.566/66 que não havendo a notificação no prazo mencionado, considera-se o contrato automaticamente renovado, desde que o parceiro outorgado, nos 30 dias seguintes ao do prazo para a notificação não manifeste sua desistência ou formule nova proposta, tudo mediante simples registro de suas declarações no competente registro de títulos e documentos.
 
Portanto, nota-se que não há na doutrina um posicionamento pacífico acerca da aplicação, ou não, do direito de preferência nos contratos de parceria rural. Além disso, no caso de se considerar a aplicação, deve-se observar, a depender do tipo de preferência, os procedimentos previstos pelos artigos 22 e 45 a 47 do Decreto 59.566/66. Por fim, ressalta-se que as análises de jurisprudência de TJ/SP, TJ/RS e STJ serão feitas nos próximos artigos.