Mandado de segurança – Discussão acerca da base de cálculo do ITCMD e dos emolumentos cartorários incidentes sobre imóvel urbano objeto de sucessão “causa mortis” – Ilegitimidade passiva da Fazenda do Estado no tocante aos emolumentos e despesas cartorárias – Atribuição dos Tabeliães de Notas ou Oficiais do Registro de Imóveis e não do Secretário da Fazenda Estadual – Valor venal do bem para fins de IPTU ou valor venal de referência (valor de mercado) usado para fins de ITBI – A base de cálculo do ITCMD, no caso em apreço, deve ser o valor venal do imóvel lançado para fins de IPTU, em razão da ilegalidade do Decreto 55.002/09 – Exegese do art. 97, inciso II, §1º, do CTN e da Lei 10.705/2000 – Precedentes deste Egrégio Tribunal. (Nota da Redação INR: ementa oficial)
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Remessa Necessária Cível nº 1032813-64.2024.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é recorrente JUÍZO EX OFFICIO, é recorrido ADILSON CARBONI.
ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores RICARDO DIP (Presidente) E AROLDO VIOTTI.
São Paulo, 14 de outubro de 2024.
OSCILD DE LIMA JÚNIOR
Relator(a)
VOTO Nº 32.739
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 1032813-64.2024.8.26.0053
COMARCA: SÃO PAULO
RECORRENTE: JUÍZO “EX OFFICIO”
RECORRIDO: ADILSON CARBONI
INTERESSADOS: ESTADO DE SÃO PAULO E OUTRO
Juiz(a) de 1ª Instância: Luiza Barros Rozas Verotti
Mandado de segurança – Discussão acerca da base de cálculo do ITCMD e dos emolumentos cartorários incidentes sobre imóvel urbano objeto de sucessão “causa mortis” – Ilegitimidade passiva da Fazenda do Estado no tocante aos emolumentos e despesas cartorárias – Atribuição dos Tabeliães de Notas ou Oficiais do Registro de Imóveis e não do Secretário da Fazenda Estadual – Valor venal do bem para fins de IPTU ou valor venal de referência (valor de mercado) usado para fins de ITBI – A base de cálculo do ITCMD, no caso em apreço, deve ser o valor venal do imóvel lançado para fins de IPTU, em razão da ilegalidade do Decreto 55.002/09 – Exegese do art. 97, inciso II, §1º, do CTN e da Lei 10.705/2000 – Precedentes deste Egrégio Tribunal.
Recurso oficial desprovido.
Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por ADILSON CARBONI contra ato atribuído ao SECRETÁRIO DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, objetivando o reconhecimento de seu direito ao recolhimento do ITCMD incidente sobre imóvel urbano objeto de sucessão “causa mortis”, utilizando como base de cálculo o valor venal para fins de lançamento de IPTU, e não o valor venal de referência do ITBI, estendendo essa base de cálculo para fins de recolhimento dos emolumentos relativos à lavratura da escritura pública de inventário e respectivo registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente. Sustenta a inconstitucionalidade do Decreto nº 55.002/2009 que majorou a base de cálculo do ITCMD, instituído pela Lei Estadual nº 10.705/2000, em violação ao princípio da estrita legalidade.
A r. sentença de fls. 93/97 julgou extinto o feito, sem exame do mérito, em relação ao pedido de que os emolumentos cartorários, ante a ilegitimidade passiva da autoridade impetrada, concedendo, mais, a segurança, “para determinar que o ITCMD que incide sobre o imóvel descrito nos autos seja calculado com base no valor venal do bem utilizado para o cálculo do IPTU, afastando-se a cobrança da diferença apurada pelo Fisco, confirmando a liminar concedida. Ressalvada a possibilidade de abertura de procedimento administrativo de arbitramento”.
Não tendo sido interposto recurso voluntário (certidão de fl. 114), subiram os autos por força do recurso oficial determinado na r. sentença.
É o relatório.
Anote-se, de início, que a matéria devolvida ao conhecimento do Tribunal, por força do reexame necessário, restringese ao capítulo da sentença que determinou o cálculo do ITCMD tomando por base o valor venal para fins de IPTU. No mais, à míngua de impugnação recursal, a sentença transitou em julgado.
O recurso oficial deve ser desprovido.
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) tem por fato gerador a transmissão de bens em razão de falecimento ou doação, e terá por base de cálculo o valor venal dos bens ou direitos transmitidos (artigo 38 do Código Tributário Nacional).
A Lei Estadual nº 10.705/2000, que instituiu o tributo em comento, dispõe sobre o “valor venal dos bens” em seu artigo 9º, §1º:
“Artigo 9º – A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).
§ 1º: Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.”
Por sua vez, o artigo 13, inciso I, da mesma lei estatui que, em caso de imóveis urbanos, o valor da base de cálculo do ITCMD não deverá ser inferior “ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU”.
Para regulamentar a Lei Estadual nº 10.705/00, foi editado o Decreto nº 46.655/02, alterado pelo Decreto 55.002/09, que, no que tange à base de cálculo do imposto, assim prevê:
“Artigo 16 – O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será:
(…)
Parágrafo único – Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel:
(…)
2 – urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea “a” do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso.”
Ocorre que o Decreto Estadual n.º 55.002/09, ao permitir o uso do “valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis ITBI”, acabou por majorar a base de cálculo do ITCMD, em total desrespeito ao princípio da legalidade.
Isso porque, nos termos do art. 97, inciso II, §1º, do CTN, nenhum tributo será instituído, nem aumentado, a não ser por meio de lei, com exceção das hipóteses previstas na Constituição Federal.
Assim, a base de cálculo do ITCMD deve obedecer ao valor venal do bem e não ao valor venal de referência (valor de mercado).
Nesse sentido, precedentes desta Corte:
“MANDADO DE SEGURANÇA – Impetração para o fim de afastar a exigibilidade de recolhimento do ITCMD nos termos do Decreto Estadual nº 55.002/2009 – Sentença parcialmente concessiva da ordem mantida – Lei Estadual nº 10.705/2000, que é clara acerca da base de cálculo a ser utilizada pelo contribuinte – Impossibilidade de inovação legislativa pela Administração para modificar base de cálculo do referido tributo – Afronta aos artigos 150, inciso I, da Constituição Federal, e 97, inciso II, § 1º, do Código Tributário Nacional – Resguardada a possibilidade de arbitramento do valor, mediante regular processo administrativo, nos termos do art. 11 da Lei Estadual nº 10.705/00, desde que esse não seja feito com base na previsão do Decreto Estadual nº 55.002/09 – Precedentes jurisprudenciais – Remessa necessária não provida.” (TJSP; Remessa Necessária Cível 1000022-81.2022.8.26.0483; Relator (a): Fermino Magnani Filho; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Público; Foro de Presidente Prudente – Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 03/11/2022; Data de Registro: 03/11/2022)
“MANDADO DE SEGURANÇA – Base cálculo de ITCMD de imóvel urbano – Artigo 13 da Lei Estadual nº 10.705/2000 que estabelece base de cálculo mínima para o imposto sem, no entanto, determiná-la – Decreto Estadual nº 46.655/2002, com redação dada pelo Decreto Estadual nº 55.002/2009 que, ao regulamentar a matéria, viola o princípio da legalidade tributária – Idoneidade do procedimento de apuração do valor venal do IPTU – Reexame necessário não provido.” (TJSP; Remessa Necessária Cível 1007919-92.2022.8.26.0053; Relator (a): Aliende Ribeiro; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 11ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 03/11/2022; Data de Registro: 03/11/2022)
“MANDADO DE SEGURANÇA. Imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos – ITCMD. Base de cálculo que deve corresponder ao valor venal para fins de cobrança do ITR. Inteligência do art. 38 do CTN e arts. 9º e 13 da LE n.º 10.705/00. Impossibilidade de se majorar tributo por meio da alteração da base de cálculo promovida pelo Decreto n.º 55.002/09. Possibilidade de o Fisco, por meio de procedimento administrativo e respeitando o contraditório e a ampla defesa, apurar o correto valor, caso não concorde com o valor declarado ou atribuído ao bem. Precedentes. Sentença de concessão mantida. Remessa necessária conhecida e não provida, com observação.” (TJSP; Remessa Necessária Cível 1024827-72.2020.8.26.0482; Relator (a): Vera Angrisani; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 9ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 03/11/2022; Data de Registro: 03/11/2022)
Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à remessa necessária.
OSCILD DE LIMA JUNIOR
Relator – – /
Dados do processo:
TJSP – Remessa Necessária Cível nº 1032813-64.2024.8.26.0053 – São Paulo – 11ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Oscild de Lima Júnior – DJ 15.10.2024
Fonte: TJ/SP
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