A regularização de imóvel por meio da USUCAPIÃO é uma importante ferramenta jurídica que pode ser manejada tanto pela VIA JUDICIAL quanto pela VIA EXTRAJUDICIAL e, uma vez reconhecendo a aquisição da propriedade pelo comprovado exercício da posse prolongada, contínua e com ânimo de dono – além de outros requisitos de acordo com a espécie de usucapião utilizada – permite que o possuidor obtenha o REGISTRO DO IMÓVEL em seu nome, passando a figurar como NOVO PROPRIETÁRIO do imóvel. Não restam dúvidas de que o possuidor, agora proprietário, fica em pé de igualdade com qualquer outro proprietário de imóvel (como um comprador, que fez escritura, pagou registro, ITBI etc), na medida em que a Lei não traz nem autoriza qualquer distinção por conta do só fato da aquisição via Usucapião – ou seja, é proprietário como qualquer outro proprietário de imóvel, uma vez reconhecida a Usucapião dentro das regras da Lei. Contudo, muitos possuidores que buscam essa forma de regularização da sua aquisição de imóvel podem questionar a obrigação tributária que lhes recai, especialmente no que concerne ao Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). A dúvida principal reside na possibilidade de exigência do pagamento do IPTU desde o início da posse, mesmo antes do reconhecimento da propriedade. Seria justa e legítima a cobrança desde o início da posse?

No ordenamento jurídico brasileiro, o IPTU é tributo de competência municipal, previsto no artigo 156, inciso I, da Constituição Federal, e regulamentado pelas leis locais municipais e específicas. A obrigação tributária relativa ao IPTU recai sobre o PROPRIETÁRIO do imóvel, mas a doutrina e a jurisprudência reconhecem a responsabilidade solidária do POSSUIDOR, ainda que este não seja (ainda) o titular registral do bem. Isso significa que o possuidor, ao exercer a posse com ânimo de dono, responde pelo pagamento do imposto enquanto durar a posse. O artigo 32 do Código Tributário Nacional, por sua vez, decreta:

“Art. 32. O impôsto, de competência dos Municípios, sôbre a PROPRIEDADE PREDIAL E TERRITORIAL URBANA tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a POSSE DE BEM IMÓVEL por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município”.
O artigo 34 do mesmo Código Tributário é claro:

“Art. 34. Contribuinte do impôsto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu POSSUIDOR a qualquer título”.

A responsabilidade solidária do possuidor pelo IPTU encontra fundamento no princípio da FUNÇÃO SOCIAL da propriedade, que impõe a todos os detentores do imóvel o dever de contribuir para os encargos que oneram o bem, inclusive os tributos. Como sabemos, FUNÇÃO SOCIAL é também o mesmo escudo utilizado pelos possuidores como base nuclear para o reconhecimento da Usucapião. Assim, o possuidor não pode se eximir do pagamento do IPTU sob a alegação de ausência de registro do imóvel, uma vez que a posse, para fins tributários, implica a assunção das obrigações decorrentes da propriedade. Nesse sentido:

“TJSP. 10277146120238260114. J. em: 26/06/2024. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. Campinas. IPTU. Exercícios de 2020 a 2023. Alegação de ilegitimidade passiva para responder pelos tributos em questão. Improcedência decretada pelo fundamento de que, à época do sentenciamento, a venda do imóvel sobre o qual incide o tributo inadimplido não foi levada a registro, de modo que o autor continuou a ser havido como proprietário do bem. Irresignação. Cabimento. Documentação juntada apenas em sede recursal que consubstancia FATO SUPERVENIENTE ao ajuizamento da ação. Procedimento de USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL finalizado, com o registro da ata notarial de usucapião em outubro de 2023, conferindo o domínio do imóvel aos TERCEIROS compradores que haviam adquirido o bem em 2002, data definidora do início do exercício de posse, com ‘animus domini’. Reconhecimento da USUCAPIÃO que tem natureza meramente declaratória, RETROAGINDO os seus efeitos à data do preenchimento dos requisitos legais da prescrição aquisitiva. Precedentes do C. STJ. Responsabilidade pelos tributos ‘sub judice’, posteriores à aquisição originária do bem, que fica a cargo dos TERCEIROS USUCAPIENTES, proprietários e POSSUIDORES do imóvel. Sentença reformada para se julgar a ação procedente, anulando-se os débitos fiscais em nome do autor. Descabida, por outro lado, a condenação do Município em honorários de sucumbência, ante o princípio da causalidade, bem como a majoração da verba carreada ao autor, ante o provimento de seu apelo. Recurso provido”.

Quanto ao período em que o IPTU pode ser cobrado, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 174, estabelece o prazo prescricional de CINCO ANOS que a Fazenda Pública efetue a cobrança do crédito tributário. Tal prazo se aplica também ao IPTU, de modo que débitos anteriores a esse quinquênio não podem ser exigidos judicialmente, assegurando ao possuidor a proteção contra cobranças retroativas ilimitadas – e esse fato é muito importante também aqui nos casos de aquisição via Usucapião onde o possuidor tem, como se viu, obrigação de pagamento quanto ao IPTU.

Em suma, a regularização do imóvel por usucapião não exime o possuidor da obrigação de pagar o IPTU enquanto durar a posse (e inclusive, nossa recomendação será sempre para que o possuidor já regularize as cobranças e pagamentos de IPTU mesmo que não tenha nem mesmo iniciado a regularização por usucapião), já que, como confirma a decisão abaixo, o possuidor tem obrigação de pagar o IPTU e sua responsabilidade é solidária, nos termos do art. 34 do CTN:

“TJMG. 50079001120218130313. J. em: 13/02/2025. APELAÇÃO – TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – RESPONSABILIDADE ENTRE O PROPRIETÁRIO REGISTRAL E O POSSUIDOR – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. 1 – Conforme dispõe o artigo 34 do Código Tributário Nacional ( CTN), “a responsabilidade pelo pagamento de tributo que tenha como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis é solidária entre o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil e o possuidor a qualquer título”. 2 – Ainda que tenha havido decurso de prazo para a aquisição da propriedade pela usucapião, não tendo havido a formalização de tal pleito, com a transferência regular da propriedade registral, a solidariedade pelo pagamento do IPTU deve ser mantida”.

Fonte: Julio Martins

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