Você ocupa um imóvel há anos, com ânimo de dono, mas foi surpreendido por uma Ação Reivindicatória movida pelo proprietário que consta na matrícula? A sua principal dúvida, certamente, é se a usucapião pode ser usada como defesa. E, caso vença o processo, se essa decisão judicial é suficiente para registrar o imóvel em seu nome.
Este guia definitivo esclarece como a usucapião funciona como matéria de defesa (Súmula 237 do STF), o valor da sentença favorável e, mais importante, o caminho atualizado para regularizar a propriedade, inclusive pela via extrajudicial.
Ação Reivindicatória: O Proprietário Registral Requer a Posse
A Ação Reivindicatória é o instrumento jurídico utilizado pelo titular do registro imobiliário para reaver a posse do bem de quem o detenha injustamente. Fundamenta-se no direito de propriedade, especificamente no direito de sequela (art. 1.228 do Código Civil), que é o poder de perseguir a coisa onde quer que ela se encontre.
A Usucapião como Matéria de Defesa: O Escudo do Possuidor (Súmula 237 do STF)
Sim, a usucapião é uma tese de defesa consolidada (aprovada em 13/12/1963) e extremamente eficaz. O Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou o entendimento por meio da Súmula 237:
“O usucapião pode ser argüido em defesa”.
Ao contestar a Ação Reivindicatória, o possuidor (réu) deve apresentar provas robustas de que preencheu todos os requisitos da prescrição aquisitiva: posse mansa, pacífica, ininterrupta, com “animus domini” (intenção de ser dono) e pelo lapso temporal exigido pela modalidade de usucapião aplicável. Como sempre destacamos aqui, uma vez preenchidos os requisitos, a Usucapião acontece/surge, faltando apenas sua declaração judicial ou extrajudicial. A partir do momento em que nasce a Usucapião, nasce para o possuidor o direito de propriedade e morre para o antigo proprietário esse mesmo direito. Faltará apenas a declaração em favor do novo proprietário para a atualização dos cadastros, como a Prefeitura e o Cartório do RGI, por exemplo.
Na prática, a defesa alega que o direito de propriedade do autor foi extinto em favor do possuidor, que adquiriu o domínio de forma originária.
O Efeito da Sentença: Vitória na Reivindicatória Garante o Registro?
Se a tese de usucapião for comprovada, o juiz julgará a Ação Reivindicatória improcedente. Essa sentença tem natureza declaratória: ela reconhece que o autor não possui mais o direito de reaver o imóvel, pois o réu demonstrou ter se tornado proprietário por usucapião.
Contudo, e este é o ponto central, a sentença de improcedência, por si só, não é um título hábil para ser levado a registro no Cartório de Registro de Imóveis (CRI).
Motivos:
1. Objeto da Ação: A lide na Ação Reivindicatória se limita a discutir o direito de posse com base no domínio. A sentença resolve apenas o conflito entre o autor e o réu, não cumprindo os requisitos de uma ação própria de usucapião.
2. Requisitos Procedimentais: A Ação de Usucapião possui um rito específico, que inclui a citação dos confinantes, a intimação das Fazendas Públicas e a publicação de editais, garantindo a segurança jurídica e o respeito ao princípio da continuidade registral. Tais atos não ocorrem na Ação Reivindicatória.
O Próximo Passo: Como Regularizar o Imóvel Após a Sentença Favorável
A sentença de improcedência é uma prova pré-constituída de valor inestimável, que confirma o seu direito. Com ela em mãos, o possuidor vitorioso deve iniciar um procedimento próprio para obter o título registrável. Atualmente, existem dois caminhos para isso:
1. Ação de Usucapião Judicial (Caminho Tradicional)
O possuidor ajuíza uma Ação de Usucapião, utilizando a sentença da Reivindicatória como principal prova de seu direito. O processo seguirá o rito próprio, mas a existência de uma decisão judicial prévia declarando a prescrição aquisitiva torna o caminho muito mais célere e seguro.
2. Usucapião Extrajudicial (Caminho Moderno e Eficiente)
A grande inovação é a possibilidade de realizar o procedimento diretamente no Cartório de Notas, por meio da usucapião extrajudicial, regulamentada pelo art. 216-A da Lei de Registros Públicos e pelo Provimento nº 149/2023 do CNJ.
A sentença que acolheu a usucapião como defesa é considerada um dos documentos mais relevantes para instruir o pedido extrajudicial. Ela demonstra a ausência de litígio sobre a posse e o preenchimento dos requisitos, facilitando a lavratura da ata notarial e o posterior registro no CRI. Para a via extrajudicial, é indispensável o preenchimento de todos os requisitos legais e a assistência de um advogado.
Conclusão: Da Defesa à Propriedade Plena
Vencer uma Ação Reivindicatória com a tese de usucapião é uma vitória estratégica que protege sua posse e declara seu direito. No entanto, essa sentença não é o ponto final, mas sim a chave que abre a porta para a regularização definitiva.
Munido dessa decisão, o possuidor pode e deve buscar a formalização da propriedade, seja pela via judicial ou, de forma mais célere e moderna, pela via extrajudicial. A consulta a um advogado especialista em Direito Imobiliário é fundamental para analisar o caso concreto e definir a estratégia mais eficiente para transformar a posse consolidada em propriedade registrada e incontestável.
Fonte: Julio Martins


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