O Registrador de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre e especialista em adjudicação compulsória, João Pedro Lamana Paiva, atua na área extrajudicial há muitos anos. Aos 18 anos foi contratado para trabalhar no Registro de Imóveis de Santo Ângelo e percebeu que aquele era o seu caminho. Em 1974 foi designado a responder pelo Registro Civil das Pessoas Naturais de Santo Ângelo. Após prestar concurso público, em 1976, assumiu em 1977 os serviços de Registros Públicos de Catuípe, Comarca de Santo Ângelo. Em 1986, através de concurso de remoção, assumiu os Serviços de Registros Públicos de Sapucaia do Sul e, em 2011, pela mesma via, assumiu o Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre, onde permanece até hoje.
Em entrevista exclusiva ao Jornal do Notário, Lamana Paiva fala sobre a importância do incentivo a discussões e estudos sobre a atividade dos notários e registradores no âmbito jurídico, discorre sobre a derrubada dos vetos da Medida Provisória n° 1.085 e comenta a possibilidade de emissão do extrato notarial. “Como se sabe, o notário é o legítimo receptor da vontade das partes, na medida em que atua com imparcialidade, saneando, prevenindo litígios e provando os negócios jurídicos”, pontuou. “A atestação, por tabelião, do atendimento dos pressupostos exigidos pela lei para que o instituto possa ser aplicado ressalta a relevância da ata notarial no contexto empregado, assim como ela já é para inúmeros procedimentos judiciais e extrajudiciais (usucapião)”. Leia ao lado a entrevista na íntegra:
Jornal do Notário: O senhor poderia nos traçar um breve relato sobre a sua trajetória profissional? Quando e como iniciou a aproximação com a atividade extrajudicial?
João Pedro Lamana Paiva: Aos 17 anos de idade trabalhava na Exatoria Estadual de Santo Ângelo como estagiário/datilógrafo. Ao completar 18 anos fui nomeado auxiliar de classificador de notas pelo então Secretário Estadual da Fazenda. Em sequência, comecei a me preparar para o concurso de Auditor Fiscal do ICMS, mas o destino me reservou outro caminho.
Na ocasião, o então Oficial do Registro de Imóveis de Santo Ângelo, César Beck Machado, que diariamente ia na Exatoria Estadual em busca de selos para o serviço registral, ao verificar minha habilidade com datilografia contratou-me para trabalhar no Registro de Imóveis. Passando a conhecer a atividade percebi que era o meu caminho, pois me encantei com o sistema registral, pela estabilidade que gera para a sociedade. Posteriormente, o então titular (que havia recebido a delegação do serviço por concurso realizado em 1956) veio a se tornar o meu rico sogro.
Em 1974, ainda na condição de Oficial- Ajudante do Registro de Imóveis de Santo Ângelo, fui designado pelo Magistrado Dr. Décio Antonio Erpen, em razão da aptidão, para responder pelo Registro Civil das Pessoas Naturais de Santo Ângelo.
Após prestar concurso público, em 1976, assumi em 1977 os serviços de Registros Públicos de Catuípe, Comarca de Santo Ângelo.
Em 1986, fui convidado para ser Assessor da Presidência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e, em seguida, fui deslocado para a Corregedoria-Geral de Justiça, desempenhando a função de Secretário Geral, até o ano 2000.
No mesmo ano de 1986, através de concurso de remoção, assumi os Serviços de Registros Públicos de Sapucaia do Sul e, em 2011, também por meio de concurso de remoção, assumi o Registro de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre, onde permaneço.
Jornal do Notário: Qual é a importância do incentivo a discussões e estudos sobre a atividade dos notários e registradores no âmbito jurídico? Acredita que a Revista de Direito Notarial (RDN) e outras publicações semelhantes cumprem um papel importante nessa esfera?
João Pedro Lamana Paiva: Entendo que o debate e o aprofundamento dos estudos são de suma importância para o desenvolvimento da nossa atividade de forma a buscar uma melhor prestação do serviço, além de fortalecer e trazer conquistas à nossa classe.
Importante frisar que grandes avanços que ocorreram no âmbito do Direito Notarial e Registral são frutos de debates e estudos que ocorreram, primeiramente, no âmbito das serventias, com auxílio das entidades de classe, através de reuniões, seminários, encontros etc., todos promovidos com o fim do enriquecimento científico das nossas atividades como um todo.
A exemplo disso é imperativo citar os importantes procedimentos de desjudicialização/extrajudicialização que nosso ordenamento jurídico atualmente possui (divórcio, separação, restabelecimento da sociedade conjugal, inventário e partilha, usucapião extrajudicial, adjudicação compulsória extrajudicial, dentre outros), os quais têm sido desenvolvidos com muito êxito, ofertando o Direito de um modo mais célere e eficiente e menos oneroso aos usuários, quando comparado com outros meios de alcançá-lo.
Nesse sentido, é imprescindível a participação e colaboração das mídias sociais, dentre elas a Revista de Direito Notarial (RDN), que divulga um conteúdo enriquecedor e de muita qualidade. O trabalho desenvolvido pelos veículos de comunicação sobre as questões envolvendo o Direito Registral e Notarial aproximam os operadores do Direito e a sociedade como um todo aos serviços extrajudiciais, contribuindo, assim, com o alcance de seus direitos pelo cidadão e com a segurança jurídica dos negócios imobiliários.
Ademais, é através dos debates que novas ideias germinam e outras já existentes tornam-se mais acuradas. Os estudos e aperfeiçoamentos devem ser contínuos nas áreas notarial e registral. “Se você acha que a educação é cara, experimente a ignorância” (Robert Orben).
Jornal do Notário: O setor extrajudicial tem atingido importantes conquistas para a classe com a Lei n° 14.382/2022. É possível dizer que a nova lei traz maior segurança para o cidadão?
João Pedro Lamana Paiva: Muitas foram as inovações trazidas pela Lei nº
14.382/2022 aos serviços extrajudiciais, especialmente aos Registros Públicos, como a interoperabilidade e a virtualização dos atos, bem como com a criação de novos mecanismos para o aperfeiçoamento e simplificação do sistema, em benefício dos usuários.
A minha avaliação sobre a referida lei é positiva, em que pese apresente alguns pontos que ainda precisam ser regulamentados pelo CNJ (verificar Provimento nº 139/2023). O avanço experimentado é inexorável. A simplificação e a modernização de procedimentos era medida que se impunha. No contexto geral, entendo que esta lei será muito boa para dar mais dinâmica para os serviços registrais e notariais, até mesmo respaldando algumas questões que já vinham sendo aplicadas em virtude de entendimentos das Corregedorias Gerais de Justiça dos estados, através de seus Códigos de Normas. Cabe ressaltar que o Rio Grande do Sul já vinha adotando muitas das medidas que agora estão sendo reguladas pela lei.
Jornal do Notário: De que forma a adjudicação compulsória extrajudicial via ata notarial traz benefícios para o tabelião e para as partes?
João Pedro Lamana Paiva: Como se sabe, o notário é o legítimo receptor da vontade das partes, na medida em que atua com imparcialidade, saneando, prevenindo litígios e provando os negócios jurídicos.
Desta forma, entendo que a exigência da ata notarial para o procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial traz benefícios tanto para as partes como para o tabelião e para o registrador, tendo em vista que o tabelião exerce a atividade direta de verificação de relevantes questões envolvendo o negócio jurídico que o requerente pretende efetivar ou, em não sendo possível, adjudicar compulsoriamente seu objeto.
A participação do tabelião não será mera formalidade, mas, muito pelo contrário, servirá para gerar mais segurança e regularidade ao procedimento, agregando ao mesmo o seu olhar cauteloso acerca da possibilidade ou não de aplicação do instituto, visando a conformação do caso concreto ao título que servirá para integrar o pedido de regularização, de modo similar ao que hoje já ocorre com a usucapião extrajudicial.
A atestação, por tabelião, do atendimento dos pressupostos exigidos pela lei para que o instituto possa ser aplicado ressalta a relevância da ata notarial no contexto empregado, assim como ela já é para inúmeros procedimentos judiciais e extrajudiciais (usucapião).
Jornal do Notário: A nova lei também traz a possibilidade de emissão do extrato notarial. Como isso impacta na celeridade e segurança do processo imobiliário?
João Pedro Lamana Paiva: Primeiramente, entendo que a ideia substancial da Lei nº 14.382/2022 é a simplificação do processo de registro e, neste quesito, é seguro afirmar que o extrato notarial irá auxiliar sobremaneira os procedimentos. O foco será naquilo que necessário para a constituição do direito real esperado, sem que questões outras, muitas vezes não relacionadas com o direito real pretendido, integrem a qualificação registral, otimizando o serviço. Ainda muitas vezes ocorrem equívocos na qualificação em razão da interferência em questões que não se relacionam com o direito que se pretende constituir, o que tende a não ocorrer mais com o envio dos extratos, consolidando os elementos/requisitos mínimos exigidos pela lei.
Esta nova legislação não veio para afastar a qualificação registral e sim para buscar simplificar os procedimentos, tendo-se um espelho (extrato) das informações mais relevantes que constam do documento.
Jornal do Notário: O setor extrajudicial pós-pandemia apresenta um cenário bem diferente do quadro anterior a 2020. Que avaliação geral o senhor faz da digitalização da atividade?
João Pedro Lamana Paiva: A digitalização é um fenômeno mundial. Integra as agendas de desenvolvimento, em que pese seja preciso ter muito cuidado com a segurança da informação.
Apesar de todo o cenário negativo que a pandemia proporcionou, pode-se dizer que foi um marco evolutivo muito significativo para a evolução digital da prática notarial e registral.
À “duras penas”, de um dia para o outro fomos “obrigados” a inovar nas nossas práticas para podermos continuar prestando um serviço efetivo e de qualidade, afinal de contas nossas atividades são essenciais e não poderiam parar. No contexto em evidência, foi necessário, por conseguinte, adaptação nas normas administrativas para que os serviços notariais e registrais pudessem evoluir.
Nesse sentido, a digitalização foi de suma importância, pois fomentou o registro eletrônico e foi nos preparando para a nova realidade que está sendo implementada pela Lei 14.382/2022.
Jornal do Notário: Como o senhor vê o futuro do notariado?
João Pedro Lamana Paiva: Sempre positivo. A atuação dos tabelionatos de notas é determinante na extrajudicialização dos procedimentos. Basta que os notários façam bom uso dos instrumentos e mecanismos ofertados pela legislação. A meu ver a tendência é um notariado cada vez mais moderno, simplificado (dentro dos ditames legais, evidentemente) e mais célere, visando acompanhar a dinamicidade que as nossas vidas e rotinas impõem, mas sem olvidar do pilar primeiro de sustentação da atividade, a segurança jurídica.
Fonte: Jornal do Notário
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