Um novo desdobramento no julgamento de duas ações relevantes sobre aquisição de imóveis rurais por estrangeiros gerou grande repercussão: a votação para decidir o ingresso da OAB, por meio de seu Conselho Federal (CFOAB), na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 342 (ADPF 342) e na Ação Civil Originária 2.463 (ACO 2.463).
Os casos referem-se ao mesmo tema: a validade e constitucionalidade do parágrafo 1º do art. 1º da lei 5.709/71 (norma que trata da aquisição e arrendamento de imóveis rurais por estrangeiros). Esse dispositivo determina que, para fins de aquisição de terras por estrangeiros, a empresa brasileira considerada “controlada” por estrangeiros, sejam pessoas físicas ou jurídicas, estará sujeita às mesmas regras que uma pessoa jurídica estrangeira”.
A Sociedade Rural Brasileira (SRB) propôs a ADPF 342, sustentando que a publicação da Constituição Federal (CF) de 1988 revogou o art. 1º, § 1º, da lei 5.709/71 e, portanto, a interpretação da Advocacia Geral da União (AGU) expressa no Parecer LA/01 – atualmente em vigor – é equivocada e descumpre preceito fundamental.
De acordo com o Parecer LA/01, ao revogar o art. 171 da CF, a Emenda Constitucional 6 de 1995 extinguiu a inconstitucionalidade da lei 5.709/71. Com isso, a equiparação de empresas brasileiras a estrangeiras pode ser considerada constitucional, como determina essa lei (já o artigo 171 da CF considerava como “empresa brasileira a constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país”).
Esse posicionamento, defendido pela União e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), é ainda objeto da ACO 2.463. A ação foi proposta por essas mesmas autoridades contra a Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, que adotou em suas normas reguladoras da atuação de tabeliães e oficiais de registro o entendimento de que a Lei 5.709/71 está revogada – não haveria, portanto, impedimento para empresas brasileiras controladas por estrangeiros adquirirem ou arrendarem imóveis rurais.
Por causa da semelhança nas controvérsias, essas duas ações estão sendo julgadas em conjunto pelo STF.
Nesse contexto, em 29 de março deste ano, o CFOAB peticionou nos autos da ADPF 342 e da ACO 2.463 para requerer seu ingresso na condição de amicus curiae. Alegou-se que a matéria é fundamental para defesa da soberania nacional e da ordem constitucional e, portanto, a manifestação do conselho seria relevante.
Além disso, por tratar-se de um tema sensível com implicações complexas, o CFOAB requereu, ainda, em caráter liminar, a suspensão:
– de todos os processos judiciais que tiverem controvérsia sobre o mesmo tema que a ACO 2.463 e a ADPF 342; e
– dos negócios jurídicos que apliquem, sob qualquer forma, o parágrafo 1º do art. 1º da lei 5.709/1971.
O ministro André Mendonça, em decisão monocrática publicada no dia 26 de abril deste ano, havia deferido parcialmente o pedido liminar formulado pelo CFOAB. O ministro determinou que, até o julgamento final desses processos pelo STF, ficassem suspensas todas as ações que envolvessem a equiparação a estrangeiro de empresas brasileiras controladas por estrangeiros, pessoas físicas ou jurídicas, para fins de aquisição de imóveis rurais. Além disso, deferiu o pedido do CFOAB para integrar a lide na condição de amicus curiae.
Já o requerimento de suspensão dos negócios jurídicos foi considerado desnecessário e, portanto, indeferido, nos termos da decisão do ministro André Mendonça, que acolheu parcialmente os pedidos do CFOAB.
Essa decisão, porém, não foi referendada pelo plenário do STF. Em votação que terminou com empate de 5 a 5, o plenário, desfalcado do ministro Ricardo Lewandowski, em razão de sua aposentadoria, optou por não endossar a decisão do ministro André Mendonça.
A confirmação da decisão do ministro dependia da aprovação da maioria absoluta do plenário, o que não ocorreu. Diante do empate, nos termos do regimento interno, o STF poderia:
– suspender o julgamento até a chegada de novo ministro para desempatar;
– ter a votação desempatada pelo voto de qualidade do presidente do STF; ou
– aplicar o art. 146 do regimento interno e decidir que, em caso de empate, será negado o pedido pretendido.
A Corte, seguindo a tendência dos julgamentos mais recentes, optou pela terceira alternativa. Por conta disso, os pedidos do CFOAB foram negados.
Embora o desfecho tenha sido esse, os pedidos da CFOAB não tratavam do mérito das ações e, com isso, a ACO 2.463 e a ADPF 342 seguem em pauta para julgamento definitivo.
O acompanhamento do julgamento dessas duas ações é fundamental para entender os rumos dos investimentos estrangeiros em imóveis rurais brasileiros. Caso uma decisão derrube a equiparação das empresas brasileiras a estrangeiras, o processo de aquisição de imóveis rurais por estrangeiros no Brasil poderá ser simplificado.
Fonte: Migalhas
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