A legislação reflete a cultura e sociedade. Brasil, na América Latina, é rico em diversidade cultural e tradições enraizadas. Religião e espiritualidade influenciam, com casamento visto como aliança indissolúvel para a maioria cristã

 

Não há como se dissociar que a legislação de um país seja reflexo de sua sociedade e da cultura nela enraizada.

 

O Brasil está situado na América Latina, sendo que, por si só nossa cultora é rica em histórias e tradições diversas, sendo que os países latino-americanos se retratam através das pessoas consideradas mais apaixonadas e vibrantes do mundo.

 

Compreender a cultura latina significa reconhecer a importância da religião e da espiritualidade na vida cotidiana.

 

Imperioso mencionar que o Brasil é um país de maioria cristã, sendo que para as religiões que têm este direcionamento o casamento é considerado uma aliança indissolúvel.

 

Assim, tem-se que por todo contexto de passionalidade e religiosidade, as uniões em nosso país são sobremaneira comuns e ocorrem, em muitos casos, de maneira célere. Igualmente, não é incomum que se conheça pessoas que já tenham se casado por mais de uma vez.

 

Claro é que os momentos que antecedem o casamento são banhados de muitas alegrias e planejamentos diversos, como, por exemplo, da data da celebração, da festa, da organização no novo lar, etc.

 

Durante esse período especial e de alegrias, não raro, as pessoas acabam não analisando as consequências de um eventual término da relação. E isso ocorre, por diversos motivos: seja pela questão religiosa onde se acredita que um rompimento jamais ocorrerá, seja pela passionalidade latente de sempre se colocar o amor em primeiro lugar e à prova de tudo e todos.

 

Lado outro, é necessária uma alteração da mentalidade da grande massa, a fim de que tais assuntos possam ser tratados com mais naturalidade, a fim de que o casamento, além do laço afetivo e sublime existente, possa ser tecnicamente enxergado tal e qual é: um contrato bilateral que gera direito e obrigações aos envolvidos.

 

Pensando-se racionalmente, ninguém fecha um contrato de compra e venda de uma casa sem ler o contrato, ou de um financiamento de um carro sem prestar atenção em todas as cláusulas do casamento. Por que com o casamento seria diferente?

 

A ocorrência de divórcios é uma realidade sob diversos aspectos. A Emenda Constitucional 66/10 promoveu uma significativa alteração na Constituição Federal, ao modificar a redação do §6 º do seu art. 226, que passou a considerar que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. Assim, foram eliminados os requisitos temporais para a dissolução do vínculo marital, não mais foram admitidas as discussões sobre a culpa como fundamento da dissolução da união, nem as sanções pelo descumprimento dos deveres do casamento.

 

Com essas alterações passou o divórcio passou a ter a natureza de direito potestativo, não havendo como negar que ocorreu, como via de consequência, uma maior facilidade técnica e jurídica para que o mesmo ocorra.

 

Cabe pincelar que com todas as alterações legislativas, que diante do papel atual da mulher no cenário social, igualmente, o divórcio acabou sendo um dos caminhos para sua emancipação e empoderamento.

 

Ademais, exemplifica-se também que em um passado não tão distante, tornou-se público que a pandemia do Coronavírus aumentou significativamente a incidência de divórcios.

 

Mencionados cenários deixam clara a necessidade de que ocorram reflexões prévias ao casamento, podendo ser estas de ordem pessoal e/ou patrimonial, com o simples objetivo de que em um momento futuro, acaso não se vislumbre mais o sucesso da união, pontos sensíveis já tenham sido discutidos e que já haja uma forma mais clara de como se proceder com o desenlace, o que evita maiores desgastes emocionais, temporais e até mesmo menor dispêndio financeiro.

 

Portanto, é de extrema importância e pertinência chamar a atenção da existência e possibilidade de utilização do instrumento denominado pacto antenupcial.

 

Em linhas gerais, o instrumento nada mais é do que uma minuta contratual firmada entre o casal, previamente à ocorrência do casamento, onde se estabelecerá o regime de bens que vigorará durante a união, bem como poder-se-á fazer diversos ajustes de ordem pessoal e/ou patrimonial.

 

O pacto antenupcial não é obrigatório quando o regime de bens for o legal, ou seja, da comunhão parcial, sendo estritamente obrigatório nos casos de adoção do regime da separação obrigatória de bens (legal ou convencional) e da comunhão total de bens.

 

Referido instrumento deverá ser lavrado por meio de escritura pública, levada a registro perante o Cartório de Notas e efetivamente apresentado quando da habilitação para o casamento no Cartório de Registro Civil, a fim de que se conste sua existência na certidão de casamento. Além disso, referido pacto não terá qualquer tipo de eficácia acaso eventualmente o casamento não se concretize.

 

Muito embora não seja necessária a atuação de um advogado para que sua formalização ocorra perante o Tabelionato de Notas, é aí que se encontra a cereja do bolo (ou o pulo do gato), se assim permite-se neste breve estudo que se usem expressões populares.

 

O pacto antinupcial, se bem trabalhado por um profissional especialista na área de famílias, pode ser um instrumento valioso e de conteúdo rico, capaz de resolver de forma prévia eventuais contendas que possam surgir em um divórcio.

 

Em relação ao conteúdo extrapatrimonial/existencial, poderá prever, por exemplo, regras de convivência entre o genitor não detentor da guarda física e o(s) filho(s), questões alusivas a guarda de pets, valores pré-estabelecidos, ainda que de forma mínima, a título de alimentos aos filhos e, até mesmo, fixação de alimentos em favor de um dos cônjuges, indenizações em caso de infidelidade e outras perspectivas que as partes entendam que mereçam ser trabalhadas.

 

Abre-se um leque de diversas hipóteses que se amoldem ao contexto e realidade do casal que assim deseja instrumentalizar a relação, podendo constar o que melhor se adeque à realidade deles e de toda família, claro, desde que as disposições não sejam contrárias ao nosso ordenamento jurídico.

 

Já no que diz respeito às questões patrimoniais, não se cinge à escolha do regime de bens, que poderá ser em relação àqueles previstos no nosso ordenamento jurídico, vislumbrando-se a possibilidade do cabimento, ainda sim, para a fixação de um regime híbrido/misto onde se verifique o que melhor atenda aos interesses e realidade patrimonial e econômica do casal.

 

Outras questões diversas poderão ser estipuladas, sendo meramente exemplificativas questões atinentes à destinação do patrimônio, regras de compra e venda, instituição de usufruto, doação, etc.

 

É neste ponto, portanto, que merece atenção a utilização de referido instrumento de forma inteligente e estratégica pelo casal que detenha atividade empresarial em comum ou não, lembrando-se aqui de seu relativo baixo custo para escrituração pública e, ainda sim, valor inestimável para uma relação e proteção de interesses, direitos e obrigações diversas.

 

Este instrumento é capaz de trazer proteção e garantias sobremaneira importantes para o empresário que vise a blindagem de seu patrimônio e de seu negócio, frente eventual disputa que possa ocorrer em um divórcio.

 

Como sobredito, através do pacto antinupcial é plenamente possível que sejam estipulados regramentos específicos no que concerne ao patrimônio, não podendo aí descartar-se a real segurança jurídica que o empresário experimentaria antes mesmo do efetivo casamento, tornando-se possível que já restassem, por exemplo, estabelecidos critérios no que tange à efetiva administração e propriedade dos bens.

 

Ponto bastante importante de ser levantado é que nas empresas familiares a existência do pacto antenupcial é ainda mais necessária e dev ser reconhecida de tal forma por todos os envolvidos. Isto porque, através deste contrato poderão ser formuladas de forma totalmente válida, por exemplo, cláusulas que impeçam que uma pessoa que em nada contribuiu para a atividade empresarial dela se beneficie pelo simples fato de sua união com outra que tenha contribuído e seu posterior divórcio.

 

São plenamente possíveis, repise-se, desde que não contrárias ao ordenamento a estipulação de cláusulas de diversas naturezas e que visem as mais diversas finalidades, como, por exemplo, pactuar-se a incomunicabilidade de valorizações de cotas na constância da união, como também de dívidas.

 

Conclui-se, desta forma, que o pacto antenupcial pode (e deve) ser utilizado como instrumento hábil a conceder segurança jurídica ao casamento e aos cônjuges, em relação aos seus desejos pessoais e arranjos familiares, mas, sobretudo, pode ser um instrumento de suma importância no que diz respeito à proteção empresarial, havendo possibilidade de através dele conceder-se estabilidade a negócio existente, por exemplo, evitando-se possíveis e desnecessárias disputas decorrentes do rompimento conjugal de qualquer dos sócios, mormente quando se vislumbra sociedades que sejam compostas por familiares.

 

Fonte: Migalhas

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