A LGPD exige que empresas garantam acesso a dados em litígios trabalhistas. Transparência e gestão segura são essenciais para evitar penalidades.
Quatro anos após a entrada em vigor da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709/18), o tratamento de dados pessoais tornou-se um tema cada vez mais recorrente na Justiça do Trabalho. Seguindo o exemplo da lei europeia (GDPR), a LGPD trouxe impactos significativos para as empresas no Brasil, exigindo mudanças profundas não só na cultura local, mas também nas políticas corporativas.
A experiência europeia com a GDPR deve servir de alerta para os empregadores brasileiros. Na Europa, o direito de acesso tem sido amplamente utilizado para reunir provas, resultando em um aumento considerável de litígios trabalhistas.
No Brasil, a LGPD já demonstrou impactos relevantes nas decisões da Justiça do Trabalho. Além de ser usada como fundamento para pedidos de sigilo em processos trabalhistas, a LGPD tem embasado solicitações de empresas para não divulgar dados de empregados, sob o argumento de que tal divulgação violaria os direitos dos titulares. Esse é um tema frequentemente abordado em ações movidas por empresas que optam por não compartilhar informações de seus empregados com sindicatos.
Assim como na GDPR europeia, um dos aspectos mais críticos da LGPD no contexto trabalhista é o direito de acesso das pessoas aos seus dados. Esse direito garante que os titulares dos dados – incluindo empregados e candidatos a emprego – tenham, em regra, acesso irrestrito às informações tratadas pela empresa. Exemplos de dados que podem ser solicitados incluem informações de recrutamento e seleção, avaliações de desempenho, registros de investigações internas e até comunicações eletrônicas, como e-mails trocados no ambiente de trabalho.
O direito de acesso tem gerado repercussões diretas em litígios trabalhistas no Brasil, com um número crescente de decisões envolvendo pedidos de acesso a dados. A recusa injustificada em compartilhar essas informações pode resultar em ações judiciais, nas quais o direito de acesso é reivindicado como meio de produção antecipada de prova. Isso pode impactar significativamente a estratégia de defesa da empresa, especialmente em casos que envolvem temas sensíveis como discriminação, assédio ou desvios de conduta.
Embora o direito à informação já fosse protegido pelo art. 5º, inciso XIV da CF/88, é inegável que a regulamentação mais recente de acesso pela LGPD trouxe uma abordagem específica e atualizada para o tema. Em geral, ao concederem o pedido de divulgação de informações, as decisões trabalhistas analisam se houve recusa injustificada da empresa em cumprir suas obrigações legais e convencionais. Quando confirmada, os tribunais determinam a apresentação dos documentos solicitados, permitindo que essas informações sirvam, inclusive, como base para futuras reclamações trabalhistas.
A LGPD também tem sido usada por trabalhadores para questionar a validade de certas contraprovas em ações trabalhistas. Um exemplo comum é a produção de prova de geolocalização em processos sobre horas extras. Alguns juízes têm determinado a emissão de ofícios para verificar os horários de trabalho alegados pelo empregado, incluindo, em certos casos, ofícios para empresas que gerenciam dados de redes sociais.
Por parte das empresas, o argumento de que a divulgação de dados exporia segredos comerciais tende a ser refutado nos tribunais trabalhistas, principalmente quando usado para contestar o direito de acesso dos trabalhadores. Isso ocorre porque os princípios de proteção ao empregado, que fundamentam as leis trabalhistas, tendem a conferir interpretação restritiva a esse argumento.
A justificativa de risco a segredo comercial tem encontrado mais aceitação, por exemplo, em ações que buscam o reconhecimento de vínculo empregatício com plataformas de entrega. O entendimento prevalente do TST tem sido o de que a perícia técnica nos algoritmos dessas empresas pode ser desproporcional e comprometer sua competitividade no mercado de tecnologia, casos em que acaba por barrar a pretensão de prova.
Portanto, é imperativo que os empregadores revisem suas políticas internas e os procedimentos de geração e armazenamento de dados. O aumento de solicitações de acesso a informações, tanto no âmbito judicial quanto extrajudicial, exige um mapeamento eficaz do fluxo de dados relacionados à força de trabalho. Isso inclui a revisão da necessidade real de coleta e armazenamento de dados, evitando exposições desnecessárias da empresa diante de eventuais pedidos de acesso.
Fonte: Migalhas
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