No ambiente empresarial, os planos de stock option representam um modelo de compensação dos colaboradores baseado na outorga opções de compra da participação societária da própria companhia, de modo que tais colaboradores, desde que exercidas as respectivas opções, possam se tornar sócios da própria empresa [1].
Para a companhia, tal modelo é um incentivo de longo prazo para os funcionários-chave, os quais, na qualidade de sócios, passam a ter interesse na prosperidade futura da empresa. Para o colaborador, o benefício se baseia principalmente na diferença de preço de exercício da opção, o qual é definido no momento da outorga e o valor econômico real da companhia, de modo que, se o preço de exercício for menor que o valor econômico, tal diferença representa um ganho para o funcionário.
No Brasil, a base legislativa dos planos de stock option reside unicamente no artigo 168, §3°, da Lei 6.404/1976, o qual prevê a possibilidade das sociedades anônimas outorgarem a seus administradores e empregados opções de compra de ações da própria companhia.
No entanto, inexiste uma legislação específica sobre os planos de stock option, o que gera um grande debate sobre a sua natureza jurídica: se seria uma espécie de remuneração, reverberando, portanto, nas verbas trabalhistas, contribuições previdenciárias e imposto de renda; ou se seria apenas um negócio jurídico mercantil. Na Justiça do Trabalho, por exemplo, prevalece a natureza mercantil das stock options, ao passo que, no Conselho de Recursos Fiscais (Carf), entende-se majoritariamente pelo seu caráter remuneratório [2].
Tema Repetitivo 1226 do STJ: pacificação jurisprudencial
Apesar de ainda inexistir regulamentação legal acerca da natureza jurídica dos planos de stock option, o segundo semestre de 2024 caminhou significativamente pela pacificação do tema e, finalmente, garantia de maior segurança jurídica às empresas e beneficiários de opções de compra de ações.
Em 12 de dezembro de 2023, o Recurso Especial n° 2.069.622/SP, em conjunto com o Recurso Especial n° 2.074.564/SP, foi afetado pelo Superior Tribunal de Justiça sob o Tema Repetitivo 1.226, cujo objetivo era:
“definir a natureza jurídica dos Planos de Opção de Compra de Ações de companhias por executivos (Stock option plan), se atrelada ao contrato de trabalho (remuneração) ou se estritamente comercial, para determinar a alíquota aplicável do imposto de renda, bem assim o momento de incidência do tributo.”
Assim, em 18.9.2024, foi prolatado acórdão pelo STJ, de relatoria do ministro Sérgio Kukina, em que se fixou a seguinte tese:
“a) No regime do Stock Option Plan (art. 168, § 3º, da Lei n. 6.404/1976), porque revestido de natureza mercantil, não incide o imposto de renda pessoa física/IRPF quando da efetiva aquisição de ações, junto à companhia outorgante da opção de compra, dada a inexistência de acréscimo patrimonial em prol do optante adquirente. b) Incidirá o imposto de renda pessoa física/IRPF, porém, quando o adquirente de ações no Stock Option Plan vier a revendê-las com apurado ganho de capital” [3].
Com a fixação da tese, o STJ consolidou seu entendimento de que os planos stock option possuem natureza jurídica de contrato mercantil, não de remuneração, incidindo apenas imposto de renda sobre ganho de capital quando da revenda das ações pelo adquirente, caso se obtenha lucro.
Dentre os principais pontos do acórdão, destacam-se os motivos pelos quais foi fixada a tese em questão. Conforme apontado pelo ministro relator, os planos de stock option se afastam de remuneração porque não se trata de contraprestação ao serviço prestado, mas uma faculdade do adquirente. A partir disso, entendeu-se que o instituto leva, portanto, a um aumento da produtividade e menor rotatividade de mão de obra; pois, ao se tornar acionista, o empregado passa a ter interesse no sucesso da companhia para ter lucro com a venda da ação, levando a um alinhamento de interesses.
Consolidou-se, dessa maneira, que os planos de stock option constituem simplesmente compra e venda de ações. No entanto, para que seja válido e possua natureza mercantil, destacou-se que devem ser respeitadas as características gerais do instituto, conforme anteriormente exposto, não podendo, em hipótese alguma, haver transferência gratuita das ações do empregador ao empregado, uma vez que a operação se daria sem a existência de onerosidade e risco. Restando desvirtuados os requisitos, seria descaracterizada a natureza mercantil e reconhecida a remuneratória, com a incidência de imposto de renda retido na fonte e contribuições previdenciárias.
Vale ressaltar, ainda, que o entendimento pela natureza mercantil foi majoritário entre os ministros, os quais tiveram maior divergência em relação ao fato gerador do imposto de renda incidente sobre o ganho de capital com as ações: se seria no momento do exercício da opção de compra da ação, considerando a aquisição por valor mais baixo quando comparado ao de mercado, ou na venda da ação, com a aferição de lucro, tendo prevalecido este último entendimento, de modo que a apuração do efetivo ganho de capital foi fixada como fato gerador do imposto.
Impactos da decisão
Apesar de o Tema 1.226 não tratar especificamente sobre a incidência das contribuições previdenciárias sobre os planos de stock option, entende-se que a pacificação da natureza jurídica mercantil dos planos impacta diretamente na discussão do tema, uma vez que as contribuições previdenciárias são devidas somente sobre verbas consideradas remuneratórias, inexistindo, consequentemente, justificativa lógica para a aplicação do tributo no contexto das stock option.
Já se observa uma tendência judicial para a pacificação da questão, inclusive sobre a não incidência das contribuições previdenciárias [4], posicionamento que já vinha sendo majoritariamente adotado pelo Judiciário. Por outro lado, no Carf ainda existem várias decisões que entendem pelo caráter retributivo pelo trabalho prestado e, portanto, remuneratório dos planos de stock option [5], deixando de aplicar a decisão proferida pelo STJ.
Em decisões atuais [6], o Carf entendeu não existir eficácia vinculante da tese fixada pelo STJ, sob fundamento de que, conforme determina o Regulamento Interno do Conselho [7], apenas há obrigação de seguir o entendimento da Corte Superior a partir do trânsito em julgado da decisão de mérito, o que ainda não ocorreu. Isso também se observa no Judiciário, pois, apesar do entendimento majoritário dos Tribunais já estar em consonância com a tese, é necessário o trânsito em julgado para que a aplicação seja obrigatória[8] e haja, enfim, pacificação sobre tema.
Contudo, ainda que se aguarde o trânsito em julgado da decisão, a tese fixada pelo STJ representa, em um cenário de até então grande insegurança jurídica, uma verdadeira regulamentação para os planos de stock option, conferindo às companhias maior confiança na criação e manutenção desse benefício, promovendo o alinhamento de interesses com seus empregados e, assim, intensificando seu crescimento no mercado no médio e longo prazo.
[1] PICARDO, Elvis. Employee Stock Options (ESOs): A Complete Guide. Invistopedia, 2024. Disponível em: <https://www.investopedia.com/terms/e/eso.asp>. Acesso em: 29.12.2024.
[2] ROMANO, Bruno. Estudo do plano de stock options à luz das premissas adotadas pelo Carf. Revista Direito Tributário Atual, n. 47, p. 122-146, 2021.
[3] STJ; REsp. nº 2.069.622/SP, Rel. Sérgio Kukina, j. em 11.9.2024, Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&cod_tema_inicial=1226&cod_tema_final=1226. Acesso em 21.1.2025.
[4] TRF 3ª Região; Agravo de Instrumento 5015435-64.2024.4.03.0000; 1ª Truma; Rel. Desembargador Federal Antonio Morimoto Junior, j. em 4.12.2024.
[5] CARF; Recurso Voluntário 13136.720376/2021-83; Relator Matheus Soares Leite; j. em 2.10.2024
[6] CARF; Recurso Voluntário 15504.720794/2019-46; Relator Antonio Sávio Nastureles; j. em 4.12.2024
CARF; Recurso Voluntário 15504.721572/2019-41; Relator Antonio Sávio Nastureles; j. em 4.12.2024
[7] Conforme redação do art. 99 do Regulamento Interno do CARF:
“Art. 99. As decisões de mérito transitadas em julgado, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, ou pelo Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional, na sistemática da repercussão geral ou dos recursos repetitivos, deverão ser reproduzidas pelos conselheiros no julgamento dos recursos no âmbito do CARF.”
[8] Conforme redação do art. 927, III, do CPC:
“Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos”
Fonte: Conjur
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