A IN RFB 2.219/24 ampliava as regras de monitoramento financeiro, sem criar tributos ou comprometer o sigilo bancário. Após polêmicas, a norma foi revogada em 2025

Em setembro de 2024, a Receita Federal editou a IN RFB 2.219/24 para atualizar regras e procedimentos de controle fiscal. O tema ganhou destaque, todavia, apenas em janeiro de 2025, quando os efeitos da norma entraram em vigor e começaram a impactar as movimentações realizadas via pix.

A circulação de informações desencontradas e fake news sobre as disposições da Receita Federal pelas redes sociais gerou uma série de especulações e reações negativas em relação às novas regras previstas para 2025. Esse ambiente de desinformação foi agravado por criminosos que, aproveitando-se da situação, passaram a aplicar golpes alegando a existência de cobranças de taxas pela Receita Federal sobre transações via pix, sob pena de bloqueio do CPF do contribuinte.

Em resposta a esse contexto, a Receita Federal optou por revogar a medida, por meio da edição da IN RFB 2.247/25, de 15/1/25. Complementarmente, o Governo Federal editou, em 16/1/25, a MP 1.288/25, com o intuito de proibir a cobrança de tributos sobre pagamentos realizados via pix, além de ampliar e garantir a efetividade do sigilo bancário.

Esse texto destaca os principais aspectos da IN RFB 2.219/24 esclarecendo os pontos que geraram controvérsias. Ademais, também indica as regras que foram revigoradas após a revogação da mencionada instrução normativa.

Afinal, qual era o objetivo da IN RFB 2.219/24?

O objetivo da Receita Federal ao publicar essa instrução normativa era aprimorar a fiscalização por meio da modernização das metodologias de monitoramento. Em essência, a norma visava combater crimes como lavagem de dinheiro, financiamento ao tráfico de drogas e financiamento ao terrorismo, facilitando a identificação de operações financeiras suspeitas.

A principal novidade trazida pela normativa era a inclusão de operadoras de cartão de crédito e plataformas de pagamento, como os bancos digitais, na obrigação de prestar informações à Receita Federal. Antes da edição da IN RFB 2.219/24, apenas as instituições financeiras tradicionais estavam sujeitas a essa obrigação. Assim, a instrução, basicamente, ampliou o alcance do monitoramento das operações financeiras para incluir instituições que vinham sendo utilizadas para ocultação de recursos ilícitos.

Portanto, deve-se afirmar que a IN RFB 2.219/24 não abordava outras questões, como as alegações circuladas nas redes sociais, especialmente em relação à suposta taxação do pix, limitando-se exclusivamente à regulamentação da prestação de informações sobre operações financeiras.

Também é válido ressaltar que a normativa não comprometia a proteção ao sigilo bancário, conforme esclarecido por Robinson Barreirinhas, secretário da Receita Federal. As informações prestadas referem-se apenas a valores globais, sem detalhar aspectos como a origem ou o destino das movimentações.1

E o que estabelecia a IN RFB 2.219/24?

A instrução normativa estabelecia que todas as instituições mencionadas deveriam comunicar semestralmente à Receita Federal, por meio da plataforma e-Financeira, sobre as transações financeiras de seus clientes. As instituições deveriam apresentar: (i) até o último dia útil de fevereiro, as informações relativas ao segundo semestre do ano anterior; e (ii) até o último dia útil do mês de agosto, as informações relativas ao primeiro semestre do ano em curso.

No entanto, as instituições só eram obrigadas a apresentar as informações quando o montante global movimentado no mês fosse, no caso das pessoas físicas, superior a R$ 5 mil e, no caso das pessoas jurídicas, superior a R$ 15 mil. Ademais, esse limite estabelecido seria aplicado de forma agregada para todas as operações financeiras de um mesmo tipo mantidas na mesma instituição, ou seja, não seria necessário que apenas uma transferência via pix, por exemplo, ultrapasse o valor mencionado, já sendo considerado os casos em que a somatória das transferências via pix no mês ultrapassassem o valor de R$ 5 mil para pessoa física.

Ainda, em relação às contas do FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, também deveriam ser informados os depósitos realizados, sendo obrigatória a comunicação quando os depósitos anuais fossem superiores a R$ 100 mil.

Então, a instrução normativa não iria tributar o pix?

Apesar de essa ser a principal informação circulada nas redes sociais, gerando confusão e receio, é fundamental esclarecer que a IN RFB 2.219/24 não poderia criar qualquer cobrança de tributos sobre o pix ou outras operações financeiras. Em outras palavras, a normativa não instituía impostos, taxas ou qualquer outro tipo de tributo. Ela se limitava a regulamentar as obrigações de prestação de informações financeiras, sem tratar de questões relacionadas à tributação.

Além disso, a CF/88, em seu art. 150, inciso I, proíbe a criação ou o aumento de qualquer tributo sem a edição de uma lei. Dessa forma, caso a instrução normativa tivesse instituído a tributação do pix ou elevado qualquer outro tributo, seria considerada inconstitucional por não ter o feito por meio de lei, como exige o ordenamento jurídico brasileiro.

Quais cenários práticos seriam impactados pelas novas regras?

Para trabalhadores registrados que recebam todo o seu salário oficialmente, por meio de folha de pagamento, não haveria motivo para preocupação, pois o imposto de renda já é descontado diretamente na fonte pelo empregador e as informações são enviadas à Receita Federal. Logo, é improvável que divergências fossem encontradas entre as movimentações financeiras e a renda declarada.

A mudança na fiscalização geraria impactos maiores, principalmente, para aqueles trabalhadores que recebem valores extras ou informais, assim como para os trabalhadores autônomos. Para evitar problemas, esses profissionais deveriam manter sua declaração de imposto de renda atualizada corretamente, incluindo todos os seus rendimentos. Além disso, seria importante ter controle financeiro e guardar registros de suas movimentações para comprovação das transações, caso fosse necessário.

Novamente, a IN RFB 2.219/24 não instituía a cobrança de novos tributos, apenas ampliava a fiscalização da Receita Federal, facilitando a identificação de valores que já deveriam ser declarados e tributados, independentemente da publicação dessa instrução normativa. Robinson Barreirinhas explica que a atenção da Receita Federal estava voltada para aqueles que utilizam os novos meios de pagamento digitais para ocultar dinheiro ilícito, muitas vezes decorrente de atividades criminosas, e reafirma que o foco da Receita Federal não era o trabalhador ou o pequeno empresário.2

Com a revogação da IN RFB 2.219/24, quais são as regras vigentes?

Diante da quantidade de desinformação sobre as medidas trazidas pela IN RFB 2.219/24, a Receita Federal optou pela revogação da instrução normativa no dia 15/1/25. Portanto, a principal consequência dessa revogação, é a desobrigação das operadoras de cartão de crédito e plataformas de pagamento, como os bancos digitais e outras fintechs, de prestarem informações à Receita Federal.

Dessa forma, voltar a vigorar a IN RFB 1.571/15, que dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras de interesses da Receita Federal. Esta, como já dito anteriormente, estabelece o dever das instituições financeiras tradicionais de fornecer informações para a Receita Federal, quando as operações em cartões e depósitos, no período mensal, sejam superiores a R$ 2 mil, no caso das pessoas físicas, e a R$ 6 mil, no caso das pessoas jurídicas.

Ademais, apesar da revogação da IN RFB 2.219/24, o monitoramento de transações financeiras via pix continuará a ser realizado pela Receita Federal, uma vez que as instituições financeiras também já informavam à Receita Federal sobre essas informações desde 2022, por meio da publicação do convênio ICMS 166/22.

___________

1 GOV.BR. Nova norma da Receita Federal preserva rotina de trabalhadores e fortalece combate a crimes financeiros. Gov.br, 10 de jan. de 2025. Ministério da Fazenda.

2 GOV.BR. Nova norma da Receita Federal preserva rotina de trabalhadores e fortalece combate a crimes financeiros. Gov.br, 10 de jan. de 2025. Ministério da Fazenda.

3 BARUFI, Renato Britto. Nova regra do pix de 5 mil reais: Cuidado trabalhador! Migalhas, 10 de jan. de 2025. Migalhas de Peso. Disponível em: . Acesso em: 12 de jan. de 2025.

4 BBC NEWS. pix: o que o governo faz com monitoramento das transações? Que dados são enviados à Receita Federal. BBC News, 16 de jan. de 2025. Disponível em: < https://www.bbc.com/portuguese/articles/cd7d5lwg89ro>. Acesso em: 20 de jan. de 2025.

5 GOV.BR. Nova norma da Receita Federal preserva rotina de trabalhadores e fortalece combate a crimes financeiros. Gov.br, 10 de jan. de 2025. Ministério da Fazenda. Disponível em: . Acesso em: 12 de jan. de 2025.

6 MARTINS, André. pix não será taxado em 2025: entenda as novas regras de monitoramento da Receita Federal. Exame, 10 de jan. de 2025. Economia. Disponível em: < https://exame.com/economia/pix-nao-sera-taxado-em-2025-entenda-as-novas-regras-de-monitoramento-da-receita-federal/>. Acesso em: 12 de jan. de 2025.

7 RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Instrução Normativa da Secretaria Especial da Receita Federal nº 1.571, de 02 de julho de 2015. Dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras de interesse da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB). Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 03 de jul. de 2015. Disponível em: . Acesso em: 20 de jan. de 2025.

8 Instrução Normativa da Secretaria Especial da Receita Federal nº 2.219, de 17 de setembro de 2024. Dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras de interesse da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil na e-Financeira. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 de set. de 2024. Disponível em: . Acesso em: 12 de jan. de 2025.

9 SALES, Pedro. Saiba o que muda com a revogação do monitoramento do pix. Uol, 16 de jan. de 2025. Governo. Disponível em: . Acesso em: 20 de jan. de 2025.

10 UOL. Instrução normativa 2.219/2024: entenda novas regras da Receita para o pix. Uol, São Paulo, 08 de jan. de 2025. Economia. Disponível em: . Acesso em: 12 de jan. de 2025.

Fonte: Migalhas

Deixe um comentário