A Constituição determina que o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) não incide sobre (1) a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, (2) nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante da sociedade for imobiliária (artigo 156, § 2º, I).
Caso as pessoas jurídicas destinatárias dos imóveis não aufiram receita nos anos seguintes à realização de capital, existe o risco de as administrações municipais afastarem a imunidade do ITBI sobre as respectivas transferências, diante da inatividade econômica da sociedade.
Pela perspectiva de diversos municípios, a imunidade constitucional do ITBI “pretendeu permitir o livre exercício da atividade econômica, fomentando a atividade econômica” — trecho de autuação lavrada pelo fisco municipal de São Paulo.
Conservadoramente e para afastar discussões, é prudente que as sociedades receptoras dos imóveis exerçam atividade empresarial (não imobiliária), evitando-se que eventual inatividade econômica seja indevidamente empregada como fundamento para afastar a imunidade do ITBI.
Em caso de autuação motivada pela inatividade econômica da sociedade, acreditamos que há consistentes fundamentos para fazer prevalecer a regra da imunidade.
A clareza da regra constitucional (artigo 156, § 2º, I) não comporta a interpretação de que a inatividade econômica da pessoa jurídica tenha a capacidade de afastar a imunidade do ITBI.
Além disso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário (RE) nº 796.376/SC, com repercussão geral reconhecida, sinalizou que é incondicionada a imunidade do ITBI sobre a realização de capital de pessoa jurídica.
Por essa perspectiva, a imunidade do ITBI na hipótese de integralização de capital social não pode ser afastada sequer pela preponderância de atividade imobiliária; com mais razão, a imunidade não pode ser afastada pelo não auferimento de receitas.
Mesmo que a leitura acima seja desconsiderada, apenas o auferimento de receitas imobiliárias poderia ensejar o afastamento da regra de imunidade.
Sim, pois conforme o artigo 156, § 2º, I, da CF, e artigos 36, I, e 37, caput, ambos do Código Tributário Nacional (CTN), somente a preponderância de atividade imobiliária pode afastar a imunidade.
Como as autuações municipais constatam a inexistência de qualquer receita, esses lançamentos acabam por confirmar a aplicabilidade da regra imunizante, que é afastada apenas quando há receita imobiliária. Por isso, ao cobrar ITBI sobre uma operação imune, os Municípios, em verdade, idealizam condicionante não prevista no ordenamento jurídico.
Norma infraconstitucional
Ainda que fosse aplicado o restritivo entendimento de que a regra constitucional demandaria o auferimento de receita para atrair a imunidade, a perspectiva infraconstitucional da questão também impede a incidência do ITBI sobre a integralização de capital com ativos imobiliários.
Exemplificativamente, a Lei Municipal de São Paulo nº 11.154/1991, em seu artigo 3º, inciso III, determina que o ITBI não incide “sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoas jurídicas em realização de capital”.
Por sua vez, o artigo 4º estabelece apenas uma hipótese capaz de justificar a cobrança do ITBI em imóveis incorporados ao capital social, qual seja: “quando o adquirente [sociedade capitalizada via imóvel] tiver como atividade preponderante a compra e venda desses bens ou direitos, a sua locação ou arrendamento mercantil”.
Ora, ao exercer a competência tributária e excepcionar da regra somente as pessoas jurídicas que realizem atividades imobiliárias, o legislador demonstrou o seu desinteresse em tributar empresas que não aufiram receitas.
É vedado ao Poder Executivo distorcer o direito positivo para fazer valer o seu senso de justiça; os princípios da legalidade e da segurança jurídica evidenciam a impossibilidade de ocorrer a tributação sobre hipótese não prevista em lei, o que garante a previsibilidade e prestigia a coerência do sistema.
Assim, quer em razão do texto constitucional, quer pela leitura do STF sobre o assunto, ou, ainda, pela perspectiva infraconstitucional, inexiste espaço para legitimar a tributação da realização de capital social de pessoa jurídica que não aufira receitas.
Fonte: Conjur
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