Como sempre falamos aqui, para o êxito da aquisição de imóveis via USUCAPIÃO é preciso que os interessados busquem o reconhecimento da aquisição – tanto de forma judicial como de forma extrajudicial – comprovando o preenchimento dos requisitos, quais sejam, o exercício da POSSE qualificada de forma mansa, pacífica e ininterrupta sobre a COISA hábil e suscetível aos efeitos da usucapião, pelo TEMPO necessário exigido em Lei. A Usucapião, como se sabe, é um instituto jurídico que legitima a aquisição da propriedade de um bem (móvel ou imóvel) por meio da posse prolongada e contínua, desde que atendidos certos requisitos legais como os apontados acima, acrescidos de outros que variarão conforme a modalidade de Usucapião pretendida (existem várias). Quando o sujeito já possui tempo suficiente para usucapir um imóvel falece, seus herdeiros podem se beneficiar do instituto da “sucessio possessionis”, que é a sucessão na posse ou SOMA DAS POSSES. Esse conceito permite que os herdeiros somem o tempo de posse do falecido ao seu próprio tempo de posse, facilitando a aquisição do imóvel por usucapião em seu nome. Reza o Código Civil:

” Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé”.
A “sucessio possessionis” é baseada na ideia de que a posse é um DIREITO que pode ser transmitido aos herdeiros, assim como outros direitos patrimoniais. É evidente que tem importância econômica assim como importância jurídica (tanto que pode ser objeto de CESSÃO DE POSSE, como já esclarecemos em outros ensaios). Portanto, se o falecido já havia cumprido todos os requisitos para a usucapião, mas não havia requerido o reconhecimento da aquisição da propriedade por esta via, seus herdeiros podem dar continuidade ao processo (ou mesmo instaurá-lo), utilizando o tempo de posse do falecido em seu favor.

Uma questão peculiar que surge nesse contexto é se é necessário realizar o INVENTÁRIO (Judicial ou Extrajudicial, diga-se de passagem) antes de iniciar o processo de Usucapião (que também se admite hoje em dia tanto pela via judicial quanto pela via extrajudicial) pelos herdeiros. Inicialmente precisamos recordar que o inventário é o procedimento legal que objetiva a transferência de bens do falecido para os herdeiros mas não sem antes resolver todas as dívidas deixadas pelo falecido. Há quem entenda que no caso da Usucapião, a posse é um direito que pode ser transmitido independentemente do Inventário, pois a usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade. Há também quem entenda que o Inventário é necessário já que, além da finalidade maior do Inventário que é por fim a todas as dívidas do morto utilizando para isso todo e qualquer direito que o mesmo tenha deixado (art. 1.997 do CCB) há também interessados outros além dos herdeiros na realização do processo de sucessão, como por exemplo o ESTADO que recolherá o IMPOSTO CAUSA MORTIS devido pelo fato gerador transmissão de herança (transmissão da posse), oriunda da morte do posseiro.

Não se olvide que proibido não será realizar o Inventário para concretizar a transmissão da posse (o que também será muito útil quando existirem muitos hedeiros já que do inventário também se obtém a partilha com a designação de quinhões para cada um dos sucessores). Para quem entende que o Inventário é desnecessário, os herdeiros deverão ingressar diretamente com o pedido de Usucapião, seja judicial ou extrajudicial, desde que comprovem a soma das posses e o cumprimento dos requisitos legais. Nesse sentido poderá haver simplificação no processo, evitando-se custos e a demora sempre associados ao Inventário.

Neste caso é importante que os herdeiros estejam cientes de que, ao optar por não realizar o Inventário, eles devem estar preparados para comprovar a continuidade da posse e a ausência de oposição por parte de outros herdeiros ou terceiros. A documentação adequada e o testemunho de vizinhos ou outras partes interessadas podem ser essenciais para o sucesso do pedido de Usucapião já que na Usucapião a questão das provas é essencial já que se trata de questão evidentemente fática. Naturalmente que se o Cartório (ou o Juízo) entenderem pela necessidade do Inventário o interessado deverá se valer dos recursos cabíveis na via adotada para tentar modificar o cenário.

A escolha entre a via judicial e a extrajudicial para a Usucapião deve ser feita com base nas circunstâncias específicas do caso e o devido aconselhamento do Advogado, peça chave e obrigatória para quaisquer um dos procedimentos. A via extrajudicial, realizada em cartório, pode ser mais rápida, mas salientamos que toda cautela deve ser considerada já que em casos de Usucapião com soma das posses o caso pode ganhar camadas de complexidade e sofisticação, o que poderá afastar a celeridade prometida na via judicial. Para casos mais complexos a via judicial sempre será a mais indicada, sem sombra de dúvidas.

Em resumo, a “sucessio possessionis”, com base legal nos artigos 1.207 e 1.243 do Código Civil, autoriza que os herdeiros somem o tempo de posse do falecido ao seu próprio tempo, abreviando e facilitando consideravelmente a aquisição do imóvel por Usucapião. Há quem entenda pela necessidade da realização prévia do Inventário nesses casos, assim como quem não entenda pela sua obrigatoriedade, como ilustra a lúcida decisão do TJSP que anulou sentença do juízo de piso que trazia como condição para a Usucapião a realização do Inventário prévio:

“TJSP – 1000543-39.2022.8.26.0123. J. em: 06/09/2022. USUCAPIÃO – Sucessio possessionis – Indeferimento da inicial, sob o fundamento de que necessário prévio inventário – Irresignação da autora – Acolhimento – Hipótese em que a posse se transmitiu ex lege à viúva e à filha do casal, uma vez que são suas sucessoras universais, não se exigindo instauração prévia de inventário – Princípio da saisine – Arts. 1.207, 1.243 e 1.784 do CC – Sentença anulada para que a ação de usucapião tenha prosseguimento – Recurso provido”.

Fonte: Julio Martins

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