Escolher o regime de bens adequado em uma UNIÃO ESTÁVEL ou no CASAMENTO é uma decisão importante, principalmente quando se deseja definir com clareza e consciência como o patrimônio será tratado em caso de falecimento e no caso de dissolução da união estável ou divórcio. No Brasil, a União Estável é reconhecida como uma entidade familiar e isso já não se discute há algum tempo; por padrão, na União Estável vigorará o regime de Comunhão Parcial de Bens, no que couber, conforme art. 1.725, sendo certo que a Lei autoriza que os companheiros optem por outro regime por meio de um contrato escrito (que pode ser qualquer escrito particular – com ou sem assistência de Advogado – ou mesmo uma Escritura Pública Declaratória, feita em qualquer Cartório de Notas). Se o objetivo é que o companheiro não receba herança, é necessário entender as nuances dos regimes de bens e como eles afetam os direitos patrimoniais, sendo muito importante considerar a consulta a um Advogado Especialista.
No regime da Comunhão Parcial de Bens, todos os bens adquiridos durante a união são considerados comuns (desimportando se houve efetiva colaboração financeira para a conquista/aquisição dos bens) e, em caso de falecimento, o companheiro sobrevivente tem direito à meação desses bens. No entanto, ele também pode ser herdeiro dos bens particulares do falecido, concorrendo com outros herdeiros, como filhos já que também na UNIÃO ESTÁVEL se aplica o art. 1.829 originalmente desenhado apenas para as hipóteses de CASAMENTO. Não se deve confundir a questão da adoção do regime da separação de bens para evitar que o companheiro receba herança já que, como se verá adiante, é inadmissível no ordenamento brasileiro a chamada “Ultratividade do Regime de Bens” e isso é um ponto que muita gente negligencia em sede de planejamento patrimonial, especialmente na hora de escolher um regime de bens e refletir sobre as consequências naturais e previsíveis que decorrerão da vida em comum.
No regime de Separação de Bens, cada parte mantém a propriedade exclusiva dos bens adquiridos antes e durante a União (e isso também se aplica ao Casamento). Em caso de falecimento, o companheiro não tem direito à meação (que não se confunde com herança) mas pode ter direito à herança (como concorrência ou pela integralidade) como apontam as hipóteses dos incisos I, II e III do tormentoso artigo 1.829 do Código Civil em sua redação atual (sendo importante recordar que esse artigo é objeto de estudos e atualização no Senado Federal neste momento através do PL 4/2025 – https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/166998)
Quando uma relação se encerra em vida, seja por Divórcio ou Dissolução de União Estável, os direitos patrimoniais são tratados à luz do regime de bens escolhido e principalmente da forma de aquisição (haja vista a possibilidade de alguns bens terem sido transmitidos a um dos dois com a cláusula de INCOMUNICABILIDADE, por exemplo). Na Comunhão Parcial de Bens, por exemplo, os bens adquiridos durante a união são divididos igualmente, observadas as ressalvas legais (art. 1.659 do CCB). Já na Separação Total, cada parte fica com o que adquiriu individualmente. Na Comunhão Universal todo patrimônio presente e futuro pertence a ambos, respeitadas também as ressalvas legais (art. 1.668).
Doutro turno, quando a relação se rompe por conta de falecimento, teremos a transmissão “causa mortis” e os direitos patrimoniais são tratados de forma diferente: o companheiro sobrevivente pode ter direito à herança e também à meação, dependendo do regime de bens e da existência de outros herdeiros. No “regime padrão” (Comunhão parcial), por exemplo, pelas regras atuais, ele herda parte dos bens particulares do falecido, além da meação dos bens comuns, havendo o que pode não existir mais de acordo com o PL 4/2025 que é a polêmica “concorrência”.
É importante anotar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que não há ultratividade do regime de bens, ou seja, o regime escolhido durante a União Estável ou o Casamento não se estende além da morte de um dos companheiros/cônjuges. Isso significa que, em caso de falecimento, a partilha dos bens deve respeitar as regras de sucessão, e não as regras do regime de bens aplicáveis no caso de dissolução de união estável ou divórcio. Um exemplo disso é a jurisprudência exarada no REsp 1.472.945/RJ, onde o STJ reafirmou que o regime de bens não altera a ordem de vocação hereditária. Sua didática ementa precisa ser reproduzida:
“REsp 1.472.945/RJ. J. em: 23/10/2014. RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO E PARTILHA. REGIME DE BENS. SEPARAÇÃO CONVENCIONAL. PACTO ANTENUPCIAL POR ESCRITURA PÚBLICA. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. CONCORRÊNCIA NA SUCESSÃO HEREDITÁRIA COM DESCENDENTES. CONDIÇÃO DE HERDEIRO. RECONHECIMENTO. EXEGESE DO ART. 1.829, I, DO CC/02. AVANÇO NO CAMPO SUCESSÓRIO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL.
1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002 confere ao cônjuge casado sob a égide do regime de separação convencional a condição de herdeiro necessário, que concorre com os descendentes do falecido independentemente do período de duração do casamento, com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário para uma sobrevivência digna.
2. O intuito de plena comunhão de vida entre os cônjuges (art. 1.511 do Código Civil) conduziu o legislador a incluir o cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários (art. 1.845), o que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo sucessório, à luz do princípio da vedação ao retrocesso social.
3. O pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento pátrio previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial.
4. O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e não, como cediço no direito de família, a vida em comum. As situações, porquanto distintas, não comportam tratamento homogêneo, à luz do princípio da especificidade, motivo pelo qual a intransmissibilidade patrimonial não se perpetua post mortem.
5. O concurso hereditário na separação convencional impõe-se como norma de ordem pública, sendo nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque o referido regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência posta no art. 1.829, I, do Código Civil.
6. O regime da separação convencional de bens escolhido livremente pelos nubentes à luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de forma cogente pela legislação (art. 1.641 do Código Civil), e no qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente.
7. Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o intérprete restringir onde a lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma da separação dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal de 1988).
8. O novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda que os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo patrimônio é, inexoravelmente, composto somente por acervo particular.
9. Recurso especial não provido”.
Em resumo, entender as diferenças nos direitos patrimoniais em caso de dissolução da união em vida ou por falecimento é crucial para tomar decisões informadas e conscientes e proteger o patrimônio conforme desejado. Consultar um Advogado Especializado pode ajudar a esclarecer dúvidas e garantir que todas as formalidades legais sejam cumpridas.
Fonte: Julio Martins
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