Processo 1015124-26.2025.8.26.0100
Espécie: PROCESSO
Número: 1015124-26.2025.8.26.0100
Processo 1015124-26.2025.8.26.0100
Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Orlanda da Rocha Silvestre – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências, para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: JOÃO DYONÍSIO TAJOÃO DYONÍSIO TAVEIRA (OAB 5779/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo nº: 1015124-26.2025.8.26.0100
Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis Requerente: 12º Oficio de Registro de Imoveis da Capital Requerido: Orlanda da Rocha Silvestre
Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta
Vistos.
Trata-se de pedido de providências formulado pelo 12º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, a requerimento de Orlanda da Silva Silvestre, diante de negativa em se proceder a averbação de garantia advinda de contrato de locação, na modalidade caução, envolvendo o imóvel objeto da matrícula n. 91.739 daquela serventia.
O Oficial informa que óbice foi motivado pela estipulação de mais de uma garantia no mesmo contrato de locação, quais sejam, fiança e caução, o que configura dupla garantia vedada pelo regramento do artigo 37, parágrafo único, da Lei n. 8.245/1991; que consta da cláusula 12ª do instrumento particular que, para plena garantia do cumprimento das obrigações constantes da avença, assina também, juntamente com o locatário, na qualidade de caucionante, Elena Maria dos Santos, solidariamente responsável pelo cumprimento das cláusulas contratuais, até a efetiva devolução das chaves do imóvel, dando como caução o imóvel de sua propriedade; que pela cláusula 30, a caucionante responde pelo cumprimento integral das obrigações, das quais possui pleno conhecimento, na condição de caucionante e principal devedora das obrigações assumidas pelo locatário; que a caucionante compõe o contrato, tanto para garanti-lo com imóvel próprio, como para se responsabilizar solidariamente pelo seu cumprimento, ou seja, instituem-se duas garantias, caução e fiança; que inconformada com o óbice registrário, a apresentante requereu a suscitação de dúvida; porém, como se trataria de ato de averbação, o procedimento adequado é o pedido de providências; que além de não cumprir as exigências, a parte interessada não as impugnou, de modo que restou ao Oficial mantê-las (fls. 01/07).
Documentos vieram às fls. 08/66.
Em impugnação apresentada nos autos, a parte aduziu que a locação em questão não está garantida por fiança, mas sim por uma caução prestada por terceiro que não assumiu os encargos de fiador, não havendo que se falar em aplicação da regra do artigo 37, parágrafo único, da Lei n. 8.245/1991; que a garantia locatícia está sendo feita por uma única modalidade, no caso, a caução do imóvel da matrícula n. 91.739 do 12º Registro de Imóveis de São Paulo, por sua proprietária, ora caucionante, Elena Maria dos Santos; que a condição de caucionante não pode ser confundida com a de fiadora; que, por estas razões, requer o afastamento do óbice e a efetivação do ato registrário (fls. 23/24 e 67/68).
O Ministério Público ofertou parecer, opinando pela manutenção do óbice (fls. 71/72).
É o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO.
Inicialmente, cumpre ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.
Vale destacar que, no sistema registral, vigora o princípio da legalidade estrita, pelo qual somente se admite o ingresso de título que atenda aos ditames legais. Por isso, o Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.
Assim dispõe o item 117, Cap. XX, das NSCGJ: “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.
No mérito, o pedido é procedente, para manter o óbice.
O contrato de locação em questão, figurando como locadora Orlanda da Rocha Silvestre e locatário Francyes Danyel Guerreiro Xavier, em suas cláusulas 12 e 30, atesta a instituição de fiança, com indicação da caucionante Elena Maria dos Santos como responsável, de forma solidária, pela satisfação integral de todas as obrigações decorrentes do contrato (fls. 29/30 e 33).
Note-se que, a par da cláusula 12 instituir a caução real, a cláusula 30 foi expressa no sentido de imputar à caucionante a responsabilidade solidária ao fiel cumprimento das obrigações pactuadas na locação até a efetiva restituição do imóvel locado à locadora.
Resta evidenciada, assim, a instituição de duas garantias no mesmo contrato de locação (real e pessoal), o que é vedado pelo parágrafo único do artigo 37 da Lei n.  8.245/91:
“Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:
I. caução;
II. fiança;
III. seguro de fiança locatícia;
IV. cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.
Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação”.
Com efeito, a caução de imóvel possui natureza real, haja vista que vincula o bem imóvel ao cumprimento da obrigação (garantia qualitativa). A solidariedade, por sua vez, é indicativa do contrato de fiança, porquanto estabelece o cumprimento da obrigação pelo garante (garantia quantitativa), o qual não se insere nos polos do contrato de locação.
Desta feita, resta configurada a presença de dupla garantia na locação, a ensejar nulidade das garantias, por expressa sanção legal.
Convém destacar, neste ponto, que não se ignora o entendimento jurisprudencial que afasta a solidariedade contratual como dupla garantia, conforme acórdão prolatado pela 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, quando do julgamento de apelação interposta no processo de autos n. 1006975-51.2019.8.26.0100.
Contudo, no caso concreto, não houve apenas previsão de solidariedade contratual, mas estabelecimento de dupla garantia de forma expressa (pessoal fiança, e real caução), o que impede o ingresso do título.
Em suma, diante da nulidade, inadmissível a averbação da caução de imóvel.
Neste sentido, já decidiu a E. Corregedoria Geral da Justiça, em julgamento de caso similar:
“REGISTRO DE IMÓVEIS – Recurso de apelação recebido como recurso administrativo – Pretensão de averbação de caução locatícia – Contrato de locação que prevê dupla garantia – Impossibilidade – Inteligência do art. 37, parágrafo único, da Lei de Locações – Parecer pelo recebimento do reclamo como recurso administrativo e pelo seu não provimento.” (CGJ Recurso Administrativo n. 1020374-73.2017.8.26.309 Corregedor Geral da Justiça Des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco j. 06.12.2018).
Nesta mesma linha, esse juízo também já decidiu em casos análogos, como nos autos dos processos n. 1054261-20.2022.8.26.0100 e n. 0029112-05.2023.8.26.0100.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências, para manter o óbice registrário.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C.
São Paulo, 05 de março de 2025.
Renata Pinto Lima Zanetta
Juíza de Direito (DJe de 06.03.2025 – SP)
Fonte: DJE

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