O regime da comunhão parcial de bens, padrão no ordenamento jurídico brasileiro e regido pelos artigos 1.658 a 1.666 do Código Civil, estabelece uma distinção clara entre o patrimônio particular de cada cônjuge e o patrimônio comum do casal. Quando um dos cônjuges falece, a sucessão se torna um processo complexo, onde o cônjuge sobrevivente pode figurar, simultaneamente, como meeiro e como herdeiro, a depender da origem de cada bem deixado pelo falecido.
A primeira distinção a ser feita é entre bens comuns e bens particulares. Os bens comuns são aqueles adquiridos onerosamente (comprados) durante o casamento. Sobre este acervo, o cônjuge sobrevivente tem direito à meação, que corresponde a 50% de todo o patrimônio comum. É fundamental compreender que a meação não é herança; trata-se de um direito próprio, decorrente do regime de bens, onde o sobrevivente apenas retira a metade que já lhe pertencia. A outra metade, que cabia ao falecido, compõe a herança a ser partilhada, destinada ao herdeiros, observadas as regras do CCB.
Por outro lado, os bens particulares são aqueles que cada cônjuge possuía antes do casamento, bem como os que recebeu durante a união por meio de doação ou herança. Estes bens não se comunicam e pertencem exclusivamente ao cônjuge que os adquiriu ou recebeu. Com o falecimento, a totalidade dos bens particulares do “de cujus” integra a sua herança, sem que o cônjuge sobrevivente tenha direito à meação sobre eles.
É na interação entre esses dois tipos de patrimônio que reside a regra sucessória crucial. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao interpretar o artigo 1.829, I, do Código Civil, pacificou o entendimento de que, no regime da comunhão parcial, o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes (filhos) do falecido na herança apenas sobre os bens particulares. Onde o cônjuge é meeiro (nos bens comuns), ele não é herdeiro. Onde não é meeiro (nos bens particulares), ele se torna herdeiro.
Essa regra visa equilibrar a distribuição do patrimônio, garantindo que o cônjuge sobrevivente não fique desamparado, ao mesmo tempo em que protege o direito sucessório dos filhos. Portanto, a herança deixada pelo falecido será dividida em duas massas distintas para fins de partilha: a meação dos bens comuns, que será destinada exclusivamente aos filhos, e o acervo de bens particulares, que será dividido entre os filhos e o cônjuge sobrevivente.
Para ilustrar: imagine um patrimônio deixado pelo falecido composto por um apartamento de R$ 600 mil (comprado durante o casamento) e uma casa de R$ 400 mil (recebida por herança antes de se casar). A partilha ocorreria da seguinte forma:
1. Sobre o apartamento (bem COMUM): O cônjuge sobrevivente recebe R$ 300 mil a título de MEAÇÃO. Os outros R$ 300 mil compõem a HERANÇA e serão divididos integralmente entre os filhos do falecido.
2. Sobre a casa (bem PARTICULAR): O valor total de R$ 400 mil compõe a HERANÇA e será dividido entre o cônjuge sobrevivente e todos os filhos do falecido, em quotas iguais.
Nessa linha, decisão paradigma do STJ que esclarece bem o alcance da concorrência do(a) viúvo(a) na parcela do monte destacada a título de herança (que não se confunde com a parcela da Meação):
“STJ. REsp: 1368123/SP. J. em: 22/04/2015. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTES DO CÔNJUGE FALECIDO. CONCORRÊNCIA. ACERVO HEREDITÁRIO. EXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES DO DE CUJUS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1 .829, I, DO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. (…) 2. Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. 3. A referida concorrência dar-se-á EXCLUSIVAMENTE QUANTO AOS BENS PARTICULARES constantes do acervo hereditário do de cujus. 4. Recurso especial provido.”
A complexidade da partilha, a correta classificação de cada bem como comum ou particular (especialmente em casos de sub-rogação ou aquisições complexas), e a aplicação precisa das regras sucessórias tornam o processo de inventário um terreno fértil para disputas. A avaliação patrimonial, a análise de documentos e a interação com os demais herdeiros exigem um conhecimento técnico aprofundado para evitar prejuízos e garantir que os direitos de todos sejam integralmente respeitados.
Por essa razão, a assistência de um Advogado Especialista em Direito de Família e Sucessões é absolutamente indispensável. Este profissional não apenas conduzirá o inventário de forma técnica, mas atuará como um estrategista, garantindo a correta classificação do patrimônio, defendendo a meação do cônjuge sobrevivente sobre os bens comuns e assegurando sua participação na herança sobre os bens particulares. Contratar um especialista é o investimento mais seguro para proteger o patrimônio dos envolvidos e garantir tranquilidade em um momento já tão delicado.
Fonte: Julio Martins


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