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Artigo: O ITCMD na reforma tributária – Por Edgar Santos Gomes e Samuel Palatnic

A reforma tributária (Proposta de Emenda Constitucional nº 45 de 2019 — PEC 45/2019), aprovada pela Câmara dos Deputados em 7 de julho, e que hoje tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado , altera significativamente a tributação sobre o consumo, substituindo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), as contribuições ao Programa de Integração Social (PIS) e ao Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) por dois tributos incidentes sobre o valor agregado, quais sejam a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência estadual e municipal, além do Imposto Seletivo (IS), também de competência federal.

 

Embora esta tenha sido a mudança mais impactante da reforma tributária, também houve importantes alterações no Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

 

A primeira modificação relativa ao ITCMD está na definição da Unidade Federativa competente para a cobrança do imposto no caso de transmissão por herança, prevista no inciso II, do §1º, do artigo 155, da Constituição. Atualmente, este dispositivo dispõe que o ITCMD relativo a “bens móveis, títulos e créditos compete ao Estado onde se processar o inventário ou o arrolamento”. A nova redação dispõe que o imposto compete ao Estado “onde era domiciliado o de cujus”.

 

Esta modificação afasta a possibilidade de se escolher, em caso de inventário extrajudicial, para qual estado, ou Distrito Federal, o contribuinte recolherá o ITCMD. Com a redação atual, era possível recolher o imposto para a unidade federativa que aplicasse a menor alíquota, simplesmente optando por abrir o inventário extrajudicial em um cartório nele localizado.

 

Com a mudança, o que define o ente público competente para cobrar o ITCMD passa a ser o último domicílio do de cujus, o que torna mais difícil escolher um estado com tributação mais vantajosa.

 

Outra mudança surgiu com a inclusão do inciso VI ao mencionado §1º, dispondo que o ITCMD “será progressivo em razão do valor da transmissão ou da doação”. Com isso, a alíquota máxima atualmente prevista na Resolução nº 9/1992 do Senado, de 8%, não poderá ser cobrada indistintamente de todos os contribuintes e os estados e o Distrito Federal deverão criar alíquotas menores para valores abaixo de determinado limite. Em razão da progressividade obrigatória, a expectativa é que os Estados que ainda não aplicam a alíquota máxima de 8% assim o façam.

 

Esta alteração visa tornar o ITCMD mais compatível com o princípio da capacidade contributiva, passando a ser mais oneroso para quem, em tese, tem mais condições financeiras para contribuir para o Erário, do modo a incrementar a função de distribuidor de riqueza assumida por este imposto.

 

Outra consequência que pode decorrer da progressividade do ITCMD é a potencial majoração da alíquota máxima fixada pelo Senado. A alíquota de 8% já está vigente há mais de trinta anos e pode ser considerada baixa, quando comparada com as alíquotas aplicadas por outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, este tributo, apenas contando a esfera federal, é exigido em alíquotas progressivas de até 40%, porém com expressiva faixa de isenção, de até US$ 12,06 milhões (para o exercício de 2022).

 

Atualmente já está em tramitação a Proposta de Resolução do Senado nº 57/2019, que visa aumentar a alíquota do ITCMD para 16%. Ainda em 2015, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) enviou ao Senado o Ofício nº 11/2015, propondo uma alíquota de 20%. Estas iniciativas podem ganhar novo impulso com a progressividade obrigatória do ITCMD prevista na reforma tributária.

 

Ao incluir o inciso VII no mencionado §1º, do artigo 155, da Constituição, a reforma tributária também cria imunidade em relação ao ITCMD no caso de “transmissões e doações para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos, e por elas realizadas na consecução dos seus objetivos sociais”. As condições para a fruição desta imunidade serão definidas em lei complementar.

 

Por fim, o artigo 16 da reforma tributária trata de uma controvérsia relativa ao ITCMD já muito discutida na jurisprudência dos tribunais brasileiros, qual seja, a possibilidade de cobrança do imposto sobre bens situados no exterior.

 

O inciso III, do §1º, do artigo 155, da Constituição atualmente prevê que a incidência do ITCMD nos casos em que “o doador tiver domicílio ou residência no exterior” ou “o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior” depende de regulação por meio de lei complementar. Até hoje o Congresso não editou esta norma, fazendo com que alguns estados passassem a instituir esta hipótese de incidência em suas legislações locais. Contudo, o Supremo Tribunal Federal já enfrentou definitivamente esta questão no julgamento do Tema nº 825 da repercussão geral, declarando a inconstitucionalidade destas normas estaduais.

 

Com a reforma tributária, até que surja a referida lei complementar, o ITCMD já incidirá nestas hipóteses, competindo ao Ente Federativo em que: 1) situados os imóveis, ou respectivos direitos; 2) em que domiciliado o donatário, caso o doador seja residente no exterior, e em que localizados os bens caso ambos residam no exterior; e 3) em que era domiciliado o de cujus ou, este tendo sido domiciliado no exterior, em que domiciliado o herdeiro ou legatário.

 

Portanto, além da amplamente comentada unificação dos tributos sobre o consumo, também é necessário que o contribuinte acompanhe com atenção as mudanças que a reforma tributária pode trazer para a tributação das heranças e doações, tendo em vista a ampliação das hipóteses de sua incidência no caso de bens situados no exterior, a criação da regra de imunidade e a possível majoração da alíquota decorrente da progressividade do ITCMD, que se tornará obrigatória.

 

Diante do claro intuito da reforma tributária — reflexo da política fiscal do Governo em exercício — de aumentar a arrecadação do ITCMD, com a inclusão de bens no exterior no seu espectro de incidência e o possível aumento da alíquota máxima pelo Senado, o momento atual se torna especialmente oportuno para a elaboração e implementação de planejamentos sucessórios e tributários.

 

Fonte: Conjur

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