Até então, antes da recente decisão do STF, era impossível para as pessoas maiores de 70 anos escolherem um regime de bens afastando a separação legal. A restrição imposta é justamente por haver uma grande preocupação com possíveis golpes contra pessoas idosas.
O tema sempre foi controvertido, pois, de um lado, há a preocupação com discriminação e o preconceito com as pessoas mais velhas, como se a velhice, por si só, tornasse-as incapazes, o que sabemos que não é verdade. Essa situação acaba ocasionando discriminação, podendo até ser interpretada como uma ofensa à dignidade das pessoas mais velhas.
Por outro lado, existe também o receio de que os idosos, com o passar dos anos, sejam vítimas de sujeitos mal-intencionados, uma vez que, com o avanço da idade, pode aumentar a vulnerabilidade dessas pessoas, colocando-as em risco. Nota-se que a intenção de impor essa restrição de escolha de regime de bens está no sentido de proteger, e não discriminar ou ofender a dignidade.
Exatamente por existirem essas duas maneiras de interpretar essa restrição imposta pela legislação é que o tema foi parar no STF, a fim de que se apurasse a inconstitucionalidade ou não desse comando legal. Diante disso, o STF, apesar de não reconhecer a inconstitucionalidade, deu uma solução intermediária, garantindo ainda a proteção legal, mas criando a possibilidade de as pessoas maiores de 70 anos escolherem outro regime, desde que se manifestem expressamente e por meio de ato notarial, a escritura pública de pacto antenupcial para o casamento, a escritura pública para a união estável.
Antigamente a idade para a imposição do regime da separação obrigatória era de 60 anos, depois passou para 70 anos, o que mostra que esse tema nunca foi tranquilo, e que sempre houve as duas preocupações acima citadas. Por isso que se discutiu sobre a imposição de um regime protetivo em determinada idade, para não só proteger o patrimônio dessas pessoas em vida, com a separação ou divórcio, mas também em caso de morte, evitando a participação do cônjuge ou companheiro na sucessão um do outro. Isso para evitar o, popularmente conhecido, golpe do baú.
O ponto sensível que sempre esteve em jogo nesse tema é o patrimônio das pessoas mais idosas, que trabalharam e lutaram a vida inteira para conquistar, e que acaba proporcionando uma vida digna para eles quando já possuam uma idade avançada. É muito comum que a maioria das pessoas trabalhe uma vida inteira tentando construir um patrimônio, grande ou pequeno, não só para ter segurança em sua velhice, mas também para poder deixar alguma coisa para os seus filhos e netos. Esse é o desejo de quase todas as pessoas.
A nosso ver, o STF não só reconheceu a importância e a segurança jurídica advindas dos atos notariais, como tomou a decisão mais acertada para esse caso sensível e de grande relevância na vida dessas pessoas maiores de 70 anos, ao impor que tal escolha de regime diverso da separação legal deva ser feita, obrigatoriamente, por escritura pública de pacto antenupcial, se casamento, ou escritura pública declaratória, se união estável.
O próprio legislador escolheu o notário, com exclusividade, para lavrar os pactos antenupciais. Já as escrituras declaratórias de União Estável, que não são obrigatórias para as demais situações, foram colocadas na decisão como obrigatórias para essa escolha dos maiores de 70 anos em optar por um regime diverso da separação legal, e isso faz todo o sentido, demostrando o cuidado com que o STF tratou o tema, e, também, a confiança depositada no notário para essa missão.
Como já dito, o tema é muito sensível e tem várias preocupações envolvidas, o que comprova que essas pessoas com idade mais avançada precisam de orientação de um profissional de direito capacitado, que contenha vasto conhecimento sobre o tema, e, pensando nisso, quem melhor que os próprios notários? Portanto, escolheu-se esses profissionais do Direito, com exclusividade, pelo legislador, para lavrar os pactos antenupciais, e, mesmo em relação às uniões estáveis, por mais que não seja obrigatória a escritura, a grande maioria dos companheiros tem optado por fazer por escritura pública, pois se sentem muito mais seguros.
Os atos notariais são tabelados, não são os notários que colocam o valor aos atos que praticam, e os notários são obrigados a cumprir exatamente o que está na tabela, não podendo cobrar nem menos, nem mais. O valor do pacto antenupcial em todo território brasileiro é relativamente baixo se pensarmos que o que se busca é uma proteção patrimonial das pessoas. A título de exemplo, trazemos a seguir uma pesquisa feita em 2023, contendo os valores cobrados nas tabelas de todos os Estados.
Valores dos pactos antenupciais nos Estados (2023):
MA = R$ 146,35. RO = R$ 340,18. SP = R$.551,50. MG = R$.590,00. RN = R$.491,13. DF = R$ 161,44. PR = R$.216,00. MT = R$.239,50. PB = R$.129,31. MS = R$.178,35. CE = R$.112,34. SC = R$.54,90. PA = R$.708,55. GO = R$.267,05. AL = R$.73,80. RS = R$.95,40. RJ = R$267,47.
Estes são os valores totais cobrados em cada Estado, dele são extraídos muitos recolhimentos feitos a órgãos públicos e entidades. Nada mais é cobrado pela assessoria jurídica realizada pelo notário, o valor já engloba essa assessoria e o ato notarial realizado.
Por se tratar de um tema de alta relevância, o qual envolve várias situações a serem explicadas para cada regime de bens existente em nosso ordenamento jurídico, e, ainda, as possibilidades de regimes mistos, onde escolhem um regime de bens, mas criam exceções e regras específicas, certamente o caminho mais seguro é terem esse acompanhamento jurídico adequado, realizado por algum profissional do Direito que possa explicar a eles as consequências e regras de cada regime de bens existente no ordenamento jurídico pátrio.
Nesta linha de valorizar os atos notariais, por serem praticados por profissional do Direito altamente capacitado, o renomado jurista Carlos E. Elias de Oliveira, em artigo publicado no site do Migalhas, trouxe a seguinte afirmação:
O notário tem o dever de apurar a capacidade dos declarantes (art.215, §1º, II, CC), fato que reduzirá os riscos de golpes contra a pessoa idosa. Trata-se de cautela importante diante da maior vulnerabilidade a que podem estar expostas as pessoas idosas.
Concordamos plenamente com o mestre Carlos Elias e podemos complementar lembrando que o notário tem o dever de promover a segurança jurídica, evitar litígios, assessorar juridicamente as partes, ser imparcial, e, o mais importante, tem a fé pública em todos os atos que pratica.
Por todo o exposto até o momento, nota-se que o valor cobrado pelo pacto antenupcial, por exemplo, chega a ser irrisório perto do valor do patrimônio que as partes desejam proteger, principalmente se tratando deste caso específico de pessoa maiores de 70 anos, que certamente trabalharam a vida toda para poder conquistar os bens que atualmente possuem, e que se trata de tudo que elas possuem e não desejam perder, tendo, para elas, um valor inestimável.
Defendemos como acertada a decisão do STF em exigir a escritura pública para esse caso das pessoas maiores de 70 anos que queiram escolher regime diverso do legal, uma vez que os notários são profissionais altamente capacitados, além de terem o dever de ser imparciais e responderem com o patrimônio próprio por qualquer eventual dano que possam causar a terceiros em caso de culpa ou dolo na prestação de seus serviços.
O mais importante é que os notários atendem todos os dias a população, não importando a classe social das partes, e os valores cobrados pelos atos que praticam são tabelados, não podendo eles decidirem o montante a ser cobrado pelos atos. Além disso, diariamente os notários orientam, ajudam, dão conselho, e muitas vezes nada recebem, pois acabam não praticando nenhum ato, uma vez que não podem cobrar pela consulta e orientações dadas.
Desse modo, fica evidente que a imposição de atos notariais, ao contrário do que muitos tentam propagar, são muito mais benéficas para a sociedade, pois certamente estarão sob a orientação de um profissional de reputação ilibada, imparcial e que possui a fé pública nos atos que pratica, e que não pode cobrar o que quiser dos atos que irá praticar, e sim seguir uma tabela estadual imposta por lei.
Encerramos esse singelo artigo com a esperança de que muitos profissionais do Direito passem a seguir o exemplo do legislador, do STF nessa recente decisão, e de muitos que realmente estudam o Direito Notarial e Registral e, portanto, sabem de sua importância, de valorizar os atos notariais e explicar sobre todas as vantagens de sua utilização.
Fonte: Migalhas
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