O artigo aborda o descumprimento de ordens judiciais por plataformas digitais, os impactos econômicos e jurídicos, e apresenta soluções para garantir o cumprimento e proteger os direitos dos usuários.

O Descumprimento Reiterado de Decisões Judiciais pelas Plataformas Digitais: Desafios e Soluções no Brasil e no Contexto Global

As plataformas digitais têm se tornado ferramentas indispensáveis para artistas, influenciadores e outros profissionais que dependem das redes sociais para exercer suas atividades econômicas. No entanto, o descumprimento reiterado de decisões judiciais por parte dessas empresas, especialmente em casos de determinações para reativação de perfis indevidamente suspensos ou removidos, tem gerado prejuízos significativos. Este artigo analisa o impacto desse fenômeno, abordando o contexto jurídico brasileiro e internacional, bem como as medidas legais previstas para forçar o cumprimento de tais obrigações. Também discute-se a ineficácia das indenizações diante do poder econômico das plataformas e a possibilidade de enquadramento no crime de desobediência, conforme previsto no Código Penal brasileiro.

O papel das redes sociais na sociedade contemporânea é indiscutível. Mais do que espaços de interação social, essas plataformas são ferramentas de trabalho para milhares de pessoas, incluindo artistas e influenciadores digitais. Contudo, o crescente número de casos em que empresas como Meta (responsável por Facebook e Instagram) ignoram determinações judiciais para reativação de contas tem revelado um grave problema: a falta de mecanismos efetivos para assegurar o cumprimento de tais ordens.

Impacto da perda de perfis para profissionais

A suspensão ou remoção indevida de perfis pode significar a interrupção de fontes de renda, perda de contratos e dano à reputação profissional. Para influenciadores e artistas, que muitas vezes dependem exclusivamente dessas plataformas para divulgar seu trabalho e interagir com o público, o bloqueio representa um obstáculo de proporções dramáticas.

Medidas legais para forçar o cumprimento

O ordenamento jurídico brasileiro prevê diferentes mecanismos para forçar o cumprimento de decisões judiciais:

1. Multas diárias (astreintes):O artigo 537 do Código de Processo Civil estabelece a possibilidade de aplicação de multas para compelir o cumprimento de obrigações. O dispositivo prevê que o juiz pode fixar multas diárias em caso de descumprimento, buscando um efeito coercitivo.

2. Indenizações por danos morais e materiais: Embora o pagamento de indenizações seja previsto no ordenamento jurídico, tal medida muitas vezes não atinge o objetivo punitivo ou educativo diante da magnitude financeira das empresas.

3. Bloqueio de valores: Conforme os artigos 536 e 854 do Código de Processo Civil, os tribunais podem determinar o bloqueio de valores nas contas bancárias das plataformas para assegurar a satisfação da obrigação.

4. Suspensão de operações: Com base no artigo 536, § 1º, do CPC, o juiz pode adotar medidas atípicas necessárias ao cumprimento da ordem judicial, incluindo a suspensão de atividades da plataforma no território nacional.

5. Configuração de crime de desobediência: O artigo 330 do Código Penal prevê penalidades para o descumprimento de ordem legal de autoridade competente. Apesar disso, a aplicação é rara em casos envolvendo grandes corporações.

A importância de uma postura coletiva do Judiciário

O Judiciário brasileiro precisa reconhecer a prática reiterada de descumprimento de decisões judiciais por parte de empresas como a Meta, controladora do Facebook e Instagram. Essa conduta negligente e sistemática evidencia uma estratégia que subestima as sanções pecuniárias impostas, tornando-as insuficientes para gerar efeitos práticos ou pedagógicos. A falta de respostas eficazes reforça a sensação de impunidade dessas corporações.

Urge um olhar coletivo do Poder Judiciário para compreender a dimensão desse problema e adotar medidas mais gravosas contra as plataformas. Além de aplicar sanções financeiras mais severas, é necessário recorrer a alternativas como bloqueios operacionais e até mesmo sanções criminais contra seus representantes legais. Esse movimento é fundamental para proteger o Estado de Direito e garantir a autoridade das decisões judiciais.

O contexto global

Internacionalmente, países têm enfrentado desafios semelhantes. Na União Europeia, por exemplo, o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) prevê multas expressivas para violações de normas, mas as plataformas frequentemente utilizam recursos judiciais para protelar o cumprimento. Nos Estados Unidos, a legislação privilegia a liberdade de expressão, mas casos de descumprimento de ordens judiciais também são comuns.

Legislação e doutrinas aplicáveis

– Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014): Estabelece os direitos e deveres de usuários e provedores de serviços na internet.

– Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): Regulamenta o tratamento de dados pessoais e pode ser usada para fundamentar decisões relacionadas à reativação de contas.

– Código de Processo Civil: Os artigos 536, 537 e 854 são especialmente relevantes para medidas de execução forcada.

– Doutrina: Juristas como Ronaldo Lemos e Patrícia Peck têm discutido amplamente o papel das plataformas no cumprimento de obrigações legais e os desafios da regulação digital.

Propostas de solução

1. Aprimoramento legislativo: É essencial criar normas específicas que imponham sanções mais severas e imediatas para o descumprimento de ordens judiciais.

2. Fortalecimento da fiscalização: Investir em órgãos reguladores para monitorar a atuação das plataformas digitais.

3. Cooperação internacional: Estabelecer tratados para assegurar a execução de ordens judiciais em nível global.

4. Postura proativa do Judiciário: Implementar estratégias mais rigorosas e coordenadas para combater o descaso das plataformas com decisões judiciais.

Conclusão

O descumprimento reiterado de decisões judiciais por parte de plataformas digitais representa uma afronta ao Estado de Direito e gera consequências graves para os usuários profissionais dessas redes. O enfrentamento desse problema exige a combinação de medidas legais, pressão regulatória e mobilização social para garantir que essas empresas respeitem as normas e os direitos dos cidadãos. O Poder Judiciário desempenha um papel central nesse processo, sendo imperativo que adote medidas mais rigorosas para combater práticas abusivas e reiteradas dessas corporações.

_______

1 BRASIL. *Código de Processo Civil.* Lei 13.105, de 16 de março de 2015.

2 BRASIL. *Marco Civil da Internet.* Lei 12.965, de 23 de abril de 2014.

3 BRASIL. *Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.* Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018.

4 LEMOS, Ronaldo. *Direito e Internet no Brasil.* São Paulo: Atlas, 2020.

5 PECK, Patrícia. *Direito Digital.* 7ª ed. São Paulo:

Fonte: Migalhas

Deixe um comentário