Espécie: APELAÇÃO
Número: 1142902-13.2024.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1142902-13.2024.8.26.0100

Registro: 2025.0000059094

ACÓRDÃO -– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1142902-13.2024.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante LNM INVESTIMENTOS LTDA, é apelado 14º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 23 de janeiro de 2025.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1142902-13.2024.8.26.0100

Apelante: LNM Investimentos Ltda

Apelado: 14º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 43.688

Apelação – Registro de imóveis – Exigência de comprovação do pagamento do ITBI sobre o valor que excede o capital integralizado – Sentença mantida – Oficial que tem o dever de exigir a comprovação de quitação do ITBI – Declarações da municipalidade que atestam a não incidência do tributo, com ressalva quanto ao valor excedente do capital social integralizado – Recurso desprovido.

I. Caso em Exame.

1. Apelação contra sentença que manteve a recusa de registro de instrumento particular de contrato social para integralização de imóveis em capital de sociedade, devido à falta de comprovação do recolhimento do ITBI sobre valores que excedem o capital social integralizado e considerada a ressalva nas declarações do Município de São Paulo quanto à não incidência do referido imposto.

II. Questão em Discussão

2. A questão em discussão consiste em determinar se o Registrador pode exigir a comprovação do pagamento do ITBI sobre o valor dos imóveis que excede o capital social integralizado, ante as declarações da municipalidade sobre a não incidência do referido tributo, com ressalvas.

III. Razões de Decidir

3. O Oficial de Registro de Imóveis tem o dever de exigir a comprovação do recolhimento do ITBI, conforme legislação vigente, quando o valor dos bens excede o capital social integralizado.

4. As declarações de isenção apresentadas não comprovam o reconhecimento administrativo da não incidência do ITBI sobre o valor excedente do capital integralizado.

5. Existência de ressalva nas referidas declarações no sentido de que os Srs. Notários e Registradores somente deverão aceitar as declarações se as informações declaradas equivalerem as do negócio e se houver a prova do recolhimento do ITBI sobre a parcela do valor do imóvel que superar o capital integralizado.

IV. Dispositivo e Tese

6. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: 1. O registrador deve exigir prova do recolhimento do ITBI sobre o valor excedente do capital integralizado ou do reconhecimento administrativo da não incidência do tributo.

Legislação Citada:

CF/1988, art. 156, § 2º, I; Lei nº 6.015/1973, art. 289; CTN, art. 134, VI; Lei do Município de São Paulo nº 11.154/1991, art. 19.

Jurisprudência Citada:

STF, RE nº 796376/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 06.10.2020.

Trata-se de apelação interposta por LNM INVESTIMENTOS LTDA. contra a r. sentença proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente do 14º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL, que, na dúvida suscitada, manteve a recusa de registro de instrumento particular de contrato social, que visava à integralização, mediante conferência, dos imóveis matriculados sob os números 148.898 e 38.857 daquela serventia, de propriedade da sócia Maria Noemia Muniz.

A r. sentença (fls. 78/83) julgou procedente a dúvida suscitada para manter o óbice registrário, sob o entendimento de que: (i) aos registradores imobiliários é imposto o dever de exigir a comprovação do recolhimento do imposto de transmissão de bem imóvel – ITBI para registro da transferência da titularidade do domínio junto à serventia predial, conforme item 117 e subitem 117.1, do Capítulo XX das NSCJ, do artigo 289 da Lei n° 6.015/73 e do artigo 134, inciso VI, do Código Tributário Nacional; (ii) havendo previsão legal de exação, não cabe ao Oficial de Registro nem ao juízo administrativo decidir pela não tributação, o que deve ser debatido na via própria.

Em seu recurso de apelação (fls. 89/94), a recorrente alega, em síntese, que o próprio Município de São Paulo deferiu a isenção do ITBI, especialmente no que se refere aos valores arbitrados pelos sócios que compuseram e integralizaram o capital social da empresa, eis que foram emitidas as Declarações de nº 2024.019570/NI e 2024-019575/NI de fls. 50/51.

Diz, ainda, que a exigência no recolhimento do ITBI incidente sobre as parcelas dos valores dos imóveis que superaram o montante do capital integralizado extrapola a competência do Oficial Registrário. Pede, portanto, a reforma da sentença.

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 118/122).

É o relatório.

Decido.

Em 25/07/2024, LNM INVESTIMENTOS LTDA. requereu ao 14º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital de São Paulo, a transferência dos imóveis matriculados sob os números 148.898 e 38.857 para seu nome, apresentando o instrumento particular de contrato social de 25/04/2024 (fls. 22/32) e registrado na JUCESP sob nº NIRE 35264161580, em 14/06/2024 (fls. 15/19).

A referida transferência ocorreu em razão da integralização, mediante conferência de bens, levada a efeito pela sócia Maria Noemia Muniz, por ocasião do aumento de capital da sociedade já constituída, conforme certidão de inteiro teor emitida pela JUCESP de fls. 20/21.

Sobreveio a nota de exigência n° 925917, com o seguinte teor (fl. 08):

“NOTA DA CONFERÊNCIA”

– Adiamos o registro pretendido pelos seguintes motivos:

– Os imóveis conferidos das matrículas nºs 148.898 e 38.857 têm como valor de Referência atribuído pela Prefeitura R$ 1.811.689,00 e R$ 500.873,00 (valor em 25/07/2024 data da Prenotação), respectivamente. No instrumento particular de 25/04/2024 consta que os referidos imóveis foram conferidos pelos valores de R$180.000,00 e R$ 390.000,00, respectivamente, portanto, deverá a Conferente observar o Parecer Normativo da Secretaria Municipal da Fazenda – SF nº 1, de 21 de maio de 2021, que fixa interpretação quanto à aplicabilidade da imunidade tributária do ITBI, prevista no artigo 156, §2º, Inciso I, da Constituição Federal e no artigo 3º, inciso III da Lei Municipal nº 11.154, de 30/12/1991, e com fundamento no artigo 2º, inciso I, alínea “c” do Decreto Municipal nº 57.968, de 07/11/2017, e, considerando a decisão do Supremo Tribunal Federal STF, exarada no Recurso Extraordinário nº 796376/SC, com acórdão de 06/10/2020, transitado em julgado em 15/10/2020 (esta norma foi publicada no Diário Oficial do Município de São Paulo, em data de 25/05/2021), informamos ao Interessado que:

– A imunidade tributária em relação ao ITBI, prevista no inciso I, do §2º do artigo 156 da CF, não alcança o valor dos bens que excederem o limite do capital social integralizado, em razão disso, deverá a Interessado observar que a integralização feita pelo instrumento particular de contrato social da LNM INVESTIMENTOS LTDA. Datado de 25/04/2024, e registrado na JUCESP sob nº NIRE 35264161580, em 14/06/2024 excedeu o capital social integralizado da empresa, isto é, os valores dos imóveis das matrículas nºs 148.898 e 38.857 que estão sendo integralizados (R$ 1.631.689,00 e R$ 353.247,00) são maiores que o valor utilizado para a integralização (R$700.000,00 e R$110.873,00), daí, deverá o Interessado apresentar as guias do ITBI e os respectivos comprovantes dos pagamentos referentes as parcelas que excederam o capital social integralizado, caso ainda não recolhido, deverão ser com os encargos legais devidos pelo atraso no pagamento. Lembrando que o fato gerador é a data do instrumento de integralização datado de 25/04/2024.

Obs: O item 2 das declarações de isenção nºs. 2024.0195570/NI e 2024-0195575/NI apresentadas noticiam o acima exposto.”

A r. sentença julgou procedente a dúvida para manter a exigência de comprovação do pagamento do imposto de transmissão de bens imóveis (ITBI) sobre o valor dos bens que exceder o limite do capital social integralizado, aduzindo ser incumbência do registrador a fiscalização do pagamento do imposto, sob pena de responsabilização solidária, nos termos do que estabelecem o artigo 289 da Lei nº 6.015/1973 e o artigo 134, VI, do Código Tributário Nacional, bem como os itens 117 e 117.1 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ.

Com efeito, o Oficial de Registro de Imóveis está obrigado a solicitar a comprovação de recolhimento do imposto de transmissão de bens imóveis e direitos a eles relativos por força do disposto no artigo 134, VI, do Código Tributário Nacional, no artigo 289 da Lei 6.015/1973 e no subitem 117.1 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ.

De outra parte, a legislação municipal de São Paulo estabelece que compete ao Registrador verificar a existência da prova do recolhimento da não incidência, da imunidade ou da concessão de isenção com referência ao ITBI, nos termos do artigo 19 da Lei do Município de São Paulo nº 11.154/1991:

Art. 19. Para lavratura, registro, inscrição, averbação e demais atos relacionados à transmissão de imóveis ou de direitos a eles relativos, ficam obrigados os notários, oficiais de Registro de Imóveis ou seus prepostos a:

I – verificar a existência da prova do recolhimento do Imposto ou do reconhecimento administrativo da não incidência, da imunidade ou da concessão de isenção; (grifei)

A hipótese vertente é semelhante à apreciada nos autos da Apelação nº 1006060-52.2022.8.26.0114, de relatoria do então Desembargador Corregedor Geral da Justiça, Dr. Fernando Antonio Torres Garcia, na qual ficou expressamente consignado que:

(…)

“Embora a imunidade prevista no art. 156, § 2º, I, da Constituição Federal pareça ser aplicável à espécie, o art. 19, I, da Lei do Município de São Paulo nº 11.154/1991, que dispõe sobre o ITBI, assim preceitua:

Art. 19. Para lavratura, registro, inscrição, averbação e demais atos relacionados à transmissão de imóveis ou de direitos a eles relativos, ficam obrigados os notários, oficiais de Registro de Imóveis ou seus prepostos a: I – verificar a existência da prova do recolhimento do Imposto ou do reconhecimento administrativo da não incidência, da imunidade ou da concessão de isenção;

Ou seja, mesmo em caso de imunidade do ITBI, cabe ao registrador, na forma do art. 289 da Lei nº 6.015/733, exigir prova do reconhecimento administrativo da não incidência do tributo”

Na espécie, verificado que o valor dos bens imóveis conferidos ao patrimônio da sociedade excedeu o limite do capital social integralizado, o Registrador exigiu a comprovação do pagamento do ITBI, e o fez corretamente, já que as declarações do Município de São Paulo, sob nº 2024.019570/NI e 2024-019575/NI (fls. 50/51), não atestam o reconhecimento administrativo da não incidência, da imunidade ou da concessão de isenção quanto ao ITBI nos termos deduzidos pela recorrente.

As declarações da Municipalidade quanto à não incidência, imunidade ou concessão de isenção que estão a fls. 50/51 noticiam o recebimento de informação sobre as transações lá descritas, consistentes na incorporação ao patrimônio da pessoa jurídica LNM INVESTIMENTOS LTDA. dos imóveis matriculados sob nº 148.898 e 38.857 no 14º Registro de Imóveis, nos valores de, respectivamente, 180.000,00 e 390.000,00, com a ressalva no sentido de que os Srs. Notários e Registradores somente deverão aceitar as declarações se as informações declaradas equivalerem aos do negócio jurídico e se houver a prova do recolhimento do ITBI sobre a parcela do valor do imóvel que superar o capital integralizado.

Diante da ressalva contida nas declarações, competia ao Oficial de Registro exigir a comprovação do pagamento do ITBI incidente sobre o valor dos imóveis que excedeu o capital social integralizado, como bem exposto na nota devolutiva transcrita.

A ressalva contida nas declarações em apreço está de acordo com o Parecer Normativo SF nº 1, de 21/05/2021, da Secretaria Municipal da Fazenda do Município de São Paulo, cujo artigo 1º dispõe:

“Art. 1º A imunidade em relação ao Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), prevista no inciso I do § 2º do artigo 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que excederem o limite do capital social a ser integralizado.

Art. 2º Este Parecer Normativo, de caráter interpretativo, é impositivo e vinculante para todos os órgãos hierarquizados desta Secretaria, produzindo efeitos para fatos que ocorrerem após a data da publicação deste ato.”

Ademais, no julgamento do tema 796, o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese:

“A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”.

Assim, sendo correta a exigência oposta pelo Oficial ao registro do instrumento apresentado, é de rigor a manutenção da r. sentença proferida.

Ante o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (Acervo INR – DJe de 03.02.2025 – SP)

Fonte: DJE

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