Há registros de exigência de ITBI sobre imóveis integralizados ao capital social de empresas que, posteriormente, alocaram tais ativos ao pool hoteleiro, mediante participação, como sócias ocultas, em sociedade em conta de participação (SCP) constituídas para a exploração da atividade hoteleira.

A incorporação de bens ao capital social é imune ao ITBI, mas o imposto tende a ser exigido caso a empresa receptora dos imóveis exerça preponderantemente atividade de locação ou compra e venda de imóveis, conforme dispõe o artigo 156, § 2º, I, da Constituição.

Mas o Fisco vem reconhecendo que os dividendos provenientes da SCP hoteleira são receitas de locação, afastando a imunidade e obrigando os contribuintes a recolherem ITBI sob a integralização no capital social dos bens imóveis.

A nosso ver, esse entendimento é equivocado, por diversas razões.

Sociedade em conta de participação

A SCP une partes que se complementam para a execução da atividade econômica. Esse modelo envolve dois participantes: o sócio ostensivo, que desenvolve a atividade econômica; e o sócio oculto, que aloca ativos ao empreendimento e não realiza atividade ou gestão.

O pool hoteleiro representa um modelo de gestão de unidades hoteleiras destinadas à hospedagem, no qual proprietários individuais de unidades (sócios ocultos) alocam seus imóveis em SCP explorada por operador hoteleiro (sócio ostensivo).

Logo, quem explora economicamente as unidades hoteleiras é o sócio ostensivo. A receita do sócio oculto decorre do resultado do negócio: caso a operação hoteleira seja lucrativa, ele recebe parte dos lucros, proporcional à sua participação na SCP. Independe, inclusive, da ocupação específica dos seus imóveis especificamente.

Não há pagamento fixo, regular e constante, nem vínculo contratual de locação entre as partes. Assim, não há que se falar em aluguéis, mas sim em rendimentos provenientes de investimento realizado com a alocação de imóveis ao pool hoteleiro.

Pela perspectiva que vem sendo desenvolvida pelo Fisco, as receitas do pool hoteleiro seriam de locação, o que afastaria a imunidade do ITBI sobre a integralização desses imóveis ao capital social do sócio oculto de SCP que cede o uso dos bens imóveis para a exploração da atividade hoteleira.

O Fisco tergiversa sobre os aspectos fundamentais que distinguem a locação tradicional e a atividade hoteleira.

Diferença entre atividade hoteleira e imobiliária

Primeiro, a atividade hoteleira representa prestação de serviços, tanto que está no rol de serviços da Lei Complementar nº 116/2003 (item 9.01), mas a locação de bens imóveis não se sujeita à incidência do Imposto sobre Serviços (ISS).

Segundo, a prestação de serviços na hotelaria possui caráter abrangente, não se restringindo ao valor das diárias, mas englobando uma série de serviços adicionais, como limpeza, alimentação, manutenção, recepção, gestão de reservas e, em muitos casos, estrutura para eventos, como centros de convenções, entre tantos outros.

Terceiro, a locação de imóveis provém de um contrato típico de locação, previsto no Código Civil e mantendo características próprias, e também regulada pela Lei do Inquilinado (Lei nº 8.245/1991). O contrato de locação tem como objeto a cessão onerosa do uso do bem imóvel, percebidos os frutos pelo locador — o aluguel, de prestação fixa e mensal.

Por outro lado, a atividade hoteleira é uma prestação de serviços, regulada por normas específicas do setor de turismo, como a Lei nº 11.771/2008 (Política Nacional de Turismo), e pelo Código de Defesa do Consumidor.

Quarto, ao contrário das atividades de locação, a atividade hoteleira está sujeita ao Perse, nos termos do artigo 4º da Lei nº 14.148/2021, que veiculou o benefício fiscal aos Cnaes nºs 5510-8/01 (hotéis), 5510-8/02 (apart-hotéis) e 5611-2/01 (restaurantes e similares).

A prevalecer a equiparação da receita hoteleira à de aluguéis, todos os contratos de locação impactados pela pandemia poderiam, em tese, pleitear a habilitação no Perse, caso ainda estivesse vigente, assim como ocorreu com o setor hoteleiro. O que obviamente não é possível e não mantém relação com a interpretação teleológica: o legislador conhece a diferença entre a locação e a hotelaria.

Quinto, no âmbito federal, os lucros obtidos pela sócia oculta por meio de investimentos em SCP são isentos do Imposto de Renda, conforme artigo 161 do Decreto nº 9.580/2018 e a Solução de Consulta Cosit nº 56/2019.

Se os lucros obtidos por meio de uma SCP fossem equiparados a receitas de locação, estariam sujeitos à tributação pelo Imposto de Renda. Isso, porém, não ocorre, pois os lucros decorrem de retorno positivo de investimento.

Nesse contexto, há imunidade sobre a integralização de imóveis ao capital social de empresas que, posteriormente e na condição de sócias ocultas, alocaram esses ativos em SCP operada e administrada por sócia ostensiva que explora economicamente as unidades que formam o pool hoteleiro.

Fonte: Conjur

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