Diversas são as modalidades de usucapião reconhecidas pelo ordenamento jurídico brasileiro – e os caminhos para o seu reconhecimento são o judicial e o extrajudicial
A usucapião ainda é (infelizmente) um assunto não tão compreendido, de forma geral, pela sociedade e por muitos operadores do direito; é muito triste constatar isso num contexto onde mais da metade dos imóveis do Brasil estão em situação de irregularidade, como inclusive já foi noticiado pela mídia (vide https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2019/07/28/interna-brasil,774183/imoveis-irregulares-no-brasil.shtml).
Como sempre falamos aqui, a situação de irregularidade registral dos imóveis é perniciosa para toda a sociedade e precisa ser melhor tratada. Usucapião é uma clássica solução que, desde 2015, teve seu acesso permitido através da via extrajudicial por obra do art. 216-A inserido pelo Novo Código de Processo Civil, com regulamentação pelo Provimento CNJ 65/2017. Reza o art. 216-A que,
“Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de RECONHECIMENTO EXTRAJUDICIAL DE USUCAPIÃO, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado (…)”
É importante recordar que a via extrajudicial não criou nenhuma modalidade/espécie nova: apenas abriu um novo caminho (facultativo, diga-se de passagem) para chegar à regularização imobiliária que até então só era alcançável através de um processo judicial muitas vezes longo e exaustivo. No que diz respeito às modalidades é preciso destacar que o ordenamento jurídico apresenta diversas, porém uma importante modalidade é a usucapião especial urbana, que exige 05 (cinco) anos de posse qualificada para seu reconhecimento, seja na via judicial, seja na via extrajudicial.
A usucapião especial urbana tem como requisitos objetivos, como se verá mais à frente “(i) posse ininterrupta, direta e exclusiva por cinco anos; (ii) imóvel urbano de até 250m²; (iii) destinação/utilização para moradia própria ou familiar; (iv) não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. A lei não exige justo título nem boa-fé por parte dos pretendentes/ocupantes. Não precisamos recordar que aqui também é necessário demonstrar os requisitos comuns em todas as modalidades: a coisa hábil e a posse qualificada (ânimo de dono).
O mestre e tratadista, Dr. Benedito Silvério (Tratado de Usucapião. 2012) assim esclarece com inegável acerto e respeitável autoridade, frisando ser desnecessário aqui o justo título e a boa-fé:
“O justo título e a boa-fé do Usucapiente não são cogitados na Lei, pelo que se DISPENSAM na modalidade usucapiatória aqui tratada [Especial Urbana]. (…) O justo título, em suma, é DISPENSADO, e a boa-fé, DESNECESSÁRIA. Dado o intento do legislador em BENEFICIAR com a usucapião urbana a pessoa de baixa renda e SEM MORADIA, que se apodera de TERRENO ou EDIFICAÇÃO já levantada para poder fixar residênciua, afigura-se JUSTA a dispensa no tocante a esses requisitos inerentes à prescrição ordinária”.
E arremata o ilustre ex-desembargador, especialista no assunto:
“Torna-se OPORTUNO e JUSTO, consoante frisado, que aquele que possui um terreno a título de acúmulo de capital e NÃO LHE DÊ UM APROVEITAMENTO SOCIAL por um longo tempo, que nem sequer tome conhecimento sobre o que se passa nele, PERCA O SEU DOMÍNIO para alguém que, não tendo onde se abrigar, faça ali a sua MORADA”.
A jurisprudência do TJ/DFT mais uma vez exemplifica o acerto interpretando os requisitos da modalidade de Usucapião ora comentada:
“TJDFT. Proc. 0032975-80.2012.8.07.0003. J. em: 28/02/2018. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. REQUISITOS OBJETIVOS. DEMONSTRADOS. BOA-FÉ E JUSTO TITULO. DESNECESSÁRIOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Nos termos do art. 183 da Constituição da Republica e do art. 1.240 do Código Civil, a usucapião especial urbana, forma de aquisição originária da propriedade, exige como requisitos objetivos (i) posse ininterrupta, direta e exclusiva por CINCO ANOS; (ii) imóvel urbano de até 250m²; (iii) destinação/utilização para moradia própria ou familiar; (iv) não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. 2. Demonstrados todos os requisitos objetivos para a aquisição originária da propriedade pela usucapião”pro moradia”, NÃO HÁ QUE SE FALAR na presença de boa-fé ou título justo, sendo DISPENSADOS neste tipo especial de ação para aquisição da propriedade. 3. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida”.
Fonte: Jornal Jurid
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