O vocábulo “interino” invoca a ideia de transitoriedade no exercício de função ou cargo. No âmbito da atividade notarial e registral, a concepção de interino identifica aquele provisoriamente responsável pela delegação de notas e registro, em período de vacância da unidade, até o seu ulterior preenchimento via concurso público.

A figura do interino foi inicialmente regulamentada pela Resolução nº 80/2009 do CNJ, que disciplina a vacância das serventias irregularmente outorgadas. A referida normativa, além de uniformizar, em nível nacional, os critérios para apuração da situação jurídica da serventia e sua respectiva vacância, serviu como instrumento moralizador e de aplicação imediata pelos Tribunais Estaduais.

No art. 1º, caput, a Res. CNJ nº 80/2009 é declarada a vacância dos serviços notariais e de registro cujos então responsáveis não tenham sido investidos por meio de concurso público de provas e títulos específico para a outorga de delegações de notas e de registro, na forma da CF/1988. As funções do interino somente são exercidas durante o tempo em que a delegação vagou e ainda não foi outorgado e investido o novo titular com atribuição de fé pública pelo Estado. A interinidade finda com a assunção da respectiva unidade pelo novo delegado (art. 3º da Res. CNJ 80/2009).

A figura do interino surge para compatibilizar duas exigências constitucionais: a) a exigência de aprovação em concurso público para a outorga da delegação de notas e registro; b) A proibição a que qualquer unidade fique vaga, sem abertura de concurso, por mais de seis meses (prazo reforçado pelo art. 67 do CNN) e vedação à manutenção da vacância por tempo indeterminado;

O interino permite a continuidade do funcionamento do serviço vago enquanto não ocorrer o efetivo provimento por titular concursado. Tem natureza jurídica de forma heterodoxa e precária de reversão do serviço ao Poder Público, excepcionando temporariamente o caráter privado do exercício dos serviços notariais e de registro (STF, MS 28959 – DF).

Em 2024, o Provimento n. 176, de 23.7.2024 promoveu uma série de alterações e inclusões no CNN, regulamentando de maneira mais minuciosa a interinidade. O art. 71-F reafirma a natureza do interino, indicando que ele, seja substituto ou delegatário, atua como preposto do Estado, devendo se submeter diretamente aos princípios da Administração Pública e ao regime de direito público.

A interinidade não confere ao interino qualquer direito adquirido à unidade, nem faz jus às mesmas prerrogativas do titular concursado. Antes da CF/1988, o art. 208 da CF/1967 previa que os substitutos das serventias extrajudiciais e do foro judicial tinham direito à efetivação no cargo de titular quando ocorresse a vacância, desde que contassem com cinco anos de exercício, nessa condição e na mesma serventia, até 31 de dezembro de 1983.

Porém, este dispositivo não foi replicado na nova ordem constitucional, que exige a realização de concurso público para o ingresso na atividade notarial e de registro (STF, RMS nº 46.377). Logo, inexiste um direito subjetivo do substituto legal à interinidade.

A nomeação constitui dever da autoridade encarregada pela fiscalização do serviço vago. Sendo uma função baseada na relação de confiança com o órgão designante, pode ser revogada a qualquer tempo se houver quebra dessa confiança (arts. 71-T do CNN).

A natureza jurídica provisória e precária da interinidade também reflete no exercício do gerenciamento da serventia. O interino desenvolve a função com limitações normativas de gerência, não exercendo, de forma plena, a gestão administrativa da unidade.

Essa gerência deve ocorrer de forma a manter a eficiência do serviço, sem onerar a unidade ou assumir compromissos futuros que vinculem o titular a ser futuramente investido (v. art. 3º, § 4º, da Res. CNJ nº 80/2009). Tanto que o Provimento nº 176 inseriu uma série de regras de relacionadas ao exercício da interinidade, principalmente no que tange aos aspectos trabalhistas.

Para garantir uma administração eficaz durante a interinidade, as Corregedoras-gerais das Justiças dos Estados e do Distrito Federal devem elaborar um Plano de Gestão. Deve o interino prestar contas da regularidade dos atos praticados, sob pena de caracterização de quebra de confiança (arts. 71-F do CNN/).

Nessa linha, os direitos e privilégios inerentes à delegação, inclusive a renda obtida com o serviço, pertencem ao Poder Público. Inclusive, o STF já se posicionou no sentido de que o interino, por não atuar como delegado do serviço notarial e registral, não preenchendo os requisitos constitucionais para tanto (art. 236, § 3º) age como preposto do Poder Público. Consequentemente, deve submeter-se ao teto remuneratório constitucional (Tese de repercussão geral – Tema 7791.

A questão da incidência do teto remuneratório ao interino foi diretamente endereçada no âmbito do CNNcujo art. 71-H, caput, incluído pelo Provimento n. 1762 assim dispõe: Ainda, o § 1º do dispositivo permitiu uma limitação estadual a esse teto3. Quanto à destinação dos valores eventualmente excedentes, devem ser repassados ao Tribunal de Justiça respectivo.

Conforme o art. 67, caput, do CNN, a designação do interino caberá à Corregedoria-Geral das Justiças dos Estados e do Distrito Federal ou ao juiz competente, se assim dispuser os atos normativos locais. Contudo, a designação do interino tornou-se mais complexa.

O STF estabeleceu uma diferenciação entre a situação de substituição temporária e de substituição prolongada por outro titular de serventia extrajudicial.

A primeira hipótese diria respeito à substituição por período, ou seja, à hipótese em que o substituto assume a condução da serventia durante o prazo de até 6 meses, durante o qual impõe-se a realização de concurso público para efetivo provimento da delegação. Nesse caso, o interino não é delegatário do serviço público, de modo que se aplicam todas as limitações apontadas, especialmente o teto remuneratório constitucional.

A segunda hipótese, por outro lado, diria respeito à substituição ininterrupta, ou seja, à hipótese em que a interinidade deve ser prolongar por mais de 6 meses. Quanto a essa situação, o STF entendeu, no julgamento da ADI 1183/DF, em 21/06/2021, que embora o art. 20 da lei 8.935/1994 seja constitucional, não pode ser interpretado de modo a admitir que “prepostos, indicados pelo titular ou mesmo pelos tribunais de justiça, possam exercer substituições ininterruptas por períodos maiores de que 6 (seis) meses.”

Nesse caso, de “longas substituições”, segundo a Corte, é imprescindível que o “substituto” seja outro notário ou registrador, observadas as leis locais de organização do serviço notarial e registral, e sem prejuízo da abertura do concurso público respectivo.

O Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta e julgou parcialmente procedente o pedido formulado, apenas para declarar inconstitucional a interpretação que extraia do art. 20 da lei 8.935/94 a possibilidade de que prepostos (não concursados), indicados pelo titular ou mesmo pelos tribunais de justiça, possam exercer substituições ininterruptas por períodos maiores de que 6 (seis) meses. Declarou, ainda, que, para essas longas substituições (maiores que 6 meses), a solução constitucionalmente válida é a indicação, como “substituto”, de outro notário ou registrador, observadas as leis locais de organização do serviço notarial e registral, ressalvada a possibilidade de os tribunais de justiça indicarem substitutos “ad hoc”, quando não houver interessados, entre os titulares concursados, que aceitem a substituição, sem prejuízo da imediata abertura de concurso público para preenchimento da(s) vaga(s). Por fim, reconheceu a plena constitucionalidade dos arts. 39, II, e 48 da lei 8.935/94. Tudo nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Marco Aurélio, que julgava procedente, em parte, o pedido, para conferir interpretação conforme à Constituição Federal ao artigo 20, cabeça e parágrafos 1º a 4º, da lei 8.935/1994, a fim de assentar a substituição eventual, por preposto indicado pelo titular, do notário ou registrador. Plenário, Sessão Virtual de 28.5.2021 a 7.6.2021.

Ou seja, no caso de substituições por períodos que excedam o limite de 6 meses, entendeu a Corte que a função de interino deve obrigatoriamente ser exercida por outro notário ou registrador.

Esse entendimento foi reforçado com a superveniência do Provimento n. 176/2024, que inseriu no CNN/CN/CNJ-Extra regra expressa prevendo que ultrapassado o prazo de 6 meses, a substituição deve ser realizada por outro notário ou registrador concursado, e o concurso público para provimento da vaga deve ser realizado imediatamente (art. 69).

Por fim, as hipóteses de revogação da designação do interino estão atualmente previstas no art. 71-F ao CNN. Essa revogação é feita de forma discricionária, mediante decisão motivada e individualizada, sem a necessidade de um processo administrativo que assegure ampla defesa e contraditório (art. 71-T).

A revogação da designação do interino é decorrência da quebra de confiança, já que é a confiança depositada no interino que sustenta a manutenção do seu vínculo com o Estado.

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1 “Os substitutos ou interinos designados para o exercício de função delegada não se equiparam aos titulares de serventias extrajudiciais, visto não atenderem aos requisitos estabelecidos nos arts. 37, inciso II, e 236, § 3º, da Constituição Federal para o provimento originário da função, inserindo-se na categoria dos agentes estatais, razão pela qual se aplica a eles o teto remuneratório do art. 37, inciso XI, da Carta da República”

2 “Art. 71-H. Durante o exercício da interinidade, o interino será remunerado como agente do Estado e preposto do Poder Judiciário e fará jus apenas ao recebimento da remuneração correspondente, no máximo, a 90,25% (noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) dos subsídios de ministro do Supremo Tribunal Federal, ainda que esteja no exercício de múltiplas interinidades. (incluído pelo Provimento n. 176, de 23.7.2024).”

3 “Art. 71-H. § 1º Norma da Corregedoria-Geral das Justiças dos Estados e do Distrito Federal poderá limitar a remuneração do interino em valor inferior ao limite de que trata o caput deste artigo, levando em consideração a renda da serventia e a natureza do serviço, contudo, em valor nunca inferior àquele fixado para o Programa de Renda Mínima na respectiva unidade da federação. (incluído pelo Provimento n. 176, de 23.7.2024).”

Fonte: Migalhas

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