O Procurador da República, Robson Martins, começou a se interessar pelo mundo jurídico e concursos públicos na adolescência. Aos 18 anos foi aprovado no concurso público de Técnico da Justiça Federal no Paraná, quando atuou como servidor de secretaria e posteriormente oficial de gabinete de Juiz Federal. Ainda no 5º ano do curso de Direito foi aprovado em várias fases do concurso de Promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná. Então, na sequência, foi aprovado no concurso de Procurador da República do Ministério Público Federal, tomando posse em 2002 – estando em exercício no cargo até os dias atuais.

Em entrevista exclusiva ao Jornal do Notário, Robson Martins fala sobre a importância da atividade notarial para a sociedade, avalia a relação dos procuradores com as serventias extrajudiciais e fala sobre o artigo “REURB e Idosos: Direito Fundamental de Resgaste da Dignidade da Pessoa Humana”, que publicou na RDN (v.4, n.1). “O notário, como assessor jurídico das partes, presta serviço de qualidade, publicidade, autenticidade, eficiência e celeridade”, pontuou. “O artigo buscou trazer um ponto de resgate de dignidade para tais pessoas [idosos], as quais muitas vezes sofrem com falta de uma moradia digna. Assim, pelo Estatuto do Idoso, há prioridade no atendimento a todos os serviços públicos para tal camada da população”. Leia ao lado a entrevista na íntegra:

Jornal do Notário: O senhor poderia nos traçar um breve relato sobre a sua trajetória profissional? Quando e como iniciou a aproximação com a atividade extrajudicial?

Robson Martins: Nascido no interior do Estado do Paraná e filho de pai mecânico e mãe costureira, sendo o caçula com dois irmãos mais velhos, tive uma infância com muito amor no seio familiar, criado em uma cidade pequena e com poucos recursos financeiros. Mas, já na adolescência, e por necessidade, tendo como exemplo os meus irmãos (um servidor público da Justiça do Trabalho e outro empregado público da Caixa Econômica Federal) comecei a me interessar pelo mundo jurídico e os concursos públicos, talvez a única alternativa de se sobressair na vida para quem, em um país extremamente pobre como o Brasil, não possui família com recursos financeiros. Aos 18 (dezoito) anos fui aprovado no concurso público de Técnico da Justiça Federal no Paraná (22.09.1993 a 08.10.1999), sendo excelente o aprendizado como servidor de secretaria e posteriormente oficial de gabinete de Juiz Federal. Ainda no 5º ano do curso de direito fui aprovado em várias fases do concurso de Promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná (08.10.1999 a 18.02.2002). Então, na sequência, como sempre me interessei da área federal, fui aprovado no concurso de Procurador da República do Ministério Público Federal, na 7a colocação nacional, tomando posse em 18.02.2002 e estando em exercício no cargo até os dias atuais. Deveras, atualmente estou lotado em Curitiba, mas em cidades do interior atuei como membro do MPF em inúmeros procedimentos e ações envolvendo questões agrárias, usucapião, terras devolutas, quilombolas, indígenas, rios da União, parques nacionais, reservas biológicas e de patrimônio público. Assim é que num Inquérito Civil Público comecei a atuar em um caso de terrenos abandonados da antiga Rede Ferroviária Federal que estavam sendo invadidos, entre Cianorte e Guaíra, sendo que para se chegar aos reais limites da cadeia dominial de tais terrenos, precisei estudar a fundo a questão e me deslocar para os Registros de Imóveis de Umuarama, Cruzeiro do Oeste, Maringá, Peabiru e Foz do Iguaçu, além de documentos da própria Secretaria de Patrimônio da União. Também atuei em muitas situações envolvendo imóveis desapropriados em faixas de fronteira do Brasil com o Paraguai, de propriedade da União, mas cedidos pelo Estado do Paraná a particulares na década de 1950. Então comecei a estudar a Lei 6.015/73, a Lei 8.935/94 e os regimes jurídicos imobiliários desde o Império, bem como atas notariais e escrituras públicas do início de 1900, antes do Código Civil de 1916. Esse foi o início de uma grande paixão pelo estudo notarial e registral. Por fim, o fato de estudar no Doutorado em Direito da Cidade na Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ me aproximou de tal realidade notarial e registral, em face das pesquisas relacionadas à regularização fundiária urbana dos grandes centros.

 

Jornal do Notário: Como o senhor enxerga a importância dos serviços notariais para a sociedade?

Robson Martins: Os serviços notariais prestam excelente atendimento à população em geral. É o lado do Estado mais próximo do cidadão. Dada sua capilaridade e profilaxia, estão amplamente arraigados como segurança jurídica para toda a população, sendo de fácil acesso e praticidade. O notário, como assessor jurídico das partes, presta serviço de qualidade, publicidade, autenticidade, eficiência e celeridade. É claro que sempre existem pontos para melhoria, assim como qualquer outro serviço ou atividade, mas o que percebo é que tais serviços tendem a cada vez mais ganhar corpo, consistência, pois o fenômeno da desjudicialização ou justiça multiportas não tem volta, ou seja, cada vez mais atividades antes reservadas somente ao Juiz serão destinadas aos Tabeliães e Registradores. O Judiciário não tem condições de resolver todos os problemas sociais do País, é necessário delegar algumas atividades para os serviços notariais e registrais. Exemplo disso é a possibilidade mudança de nome, inventário, partilha, divórcio e usucapião serem efetivados de maneira administrativa, ou seja, sem intervenção judicial.

 

Jornal do Notário: Como o senhor avalia a relação dos procuradores com as serventias extrajudiciais? O que esses serviços ajudam no cotidiano da Procuradoria?

Robson Martins: O Ministério Público tem uma atuação muito importante perante os serviços notariais e registrais, são como instituições irmãs. Percebemos isso não apenas no que tange aos Registros Civis de Pessoas Naturais, tal como na habilitação para o casamento, mas também na instituição de fundações, terras indígenas, quilombolas, litígios pela posse coletiva de terras, socioafetividade, retificações, imóveis expropriados em questões envolvendo o narcotráfico, suscitação de dúvidas, questões ambientais, apuração de crimes de falso nas serventias, questões de improbidade administrativa, lesões ao erário etc. Não se pode esquecer também do Provimento 88 do CNJ, em que os notários e registradores são ponto vital de importância para o combate ao terrorismo e à lavagem de dinheiro, auxiliando o Ministério Público para a posterior persecução penal. Portanto, o elo entre o serviço notarial/registral e o Ministério Público é deveras intenso, já que um necessita do outro para atingimento de seus fins constitucionais e deve existir cooperação entre todos os envolvidos, em busca do bem comum da sociedade.

 

 

Jornal do Notário: Qual é a importância do incentivo a discussões e estudos sobre a rotina dos notários e registradores no âmbito jurídico? Qual o papel da Revista de Direito Notarial (RDN) dentro dessa esfera?

Robson Martins: As discussões acadêmicas e também na Revista de Direito Notarial são vitais para a manutenção da excelência da atividade, bem como seu aprimoramento. Veja-se que muitas inovações legislativas, tais como da Lei 14.382/2022 são fruto de intensos estudos e propostas feitas pelo CNJ e também pelos próprios notários e registradores. O estudo sistemático e continuado de todas as funções dos Tabeliães oxigena a atividade, efetiva segurança e consiste em evolução do direito notarial, objetivando uma prestação cada vez melhor de seus serviços. Assim é que, em face das demandas da própria sociedade, e em virtude de um tempo em que as pessoas estão sem tempo, tivemos o surgimento do e-notariado, através do Provimento 100 do CNJ. Tenho convicção de que muitas outras melhorias para a atividade surgirão exatamente de tais estudos da RDN.

 

Jornal do Notário: O senhor publicou na RDN (v.4, n.1) o artigo “REURB e Idosos: Direito Fundamental de Resgaste da Dignidade da Pessoa Humana”. De que forma o procedimento de REURB assegura o direito à moradia para idosos – pessoas que, em tal ciclo de vida, encontram maiores dificuldades?

Robson Martins: Os idosos, infelizmente, são muitas vezes esquecidos pela sociedade brasileira, relegados à própria sorte. Conforme o IBGE, temos mais de 30 milhões de pessoas idosas no Brasil, ou seja, uma parcela muito grande de nossa sociedade e que não recebe a atenção devida. O artigo buscou trazer um ponto de resgate de dignidade para tais pessoas, as quais muitas vezes sofrem com falta de uma moradia digna. Assim, pelo Estatuto do Idoso, há prioridade no atendimento a todos os serviços públicos para tal camada da população. O fato é que muitos desses idosos moram em favelas nas grandes cidades, que são agrupamentos irregulares, mas que podem ser regularizados, conforme lei 13.465/2017. Na medida em que houver a regularização fundiária proposta pelo Município ou DF, o quê se sugeriu no artigo é que tais situações envolvendo idosos tenham prioridade também na análise pelo Registro de Imóveis, auxiliando para que tais pessoas tenham assegurado o direito fundamental à moradia, o quanto antes. É uma forma de amenizar a dor e o sofrimento de pessoas que deram sua vida pelo país.

 

Jornal do Notário: Diversas adaptações foram necessárias no setor extrajudicial por conta da pandemia de Covid-19. Que avaliação geral o senhor faz dessas últimas novidades dentro da atividade notarial (“cartório digital” / e-Notariado / e-Not Assina)?

Robson Martins: O e-Notariado foi uma verdadeira revolução para a atividade notarial, precisava acontecer, as pessoas solicitavam tal possibilidade. Acredito que tenha sido uma das mais significativas mudanças nos últimos 10 anos para os tabeliães de notas. O fato é que ainda existe o analfabetismo digital, o desconhecimento de tal possibilidade, bem como a dificuldade em uma internet de qualidade para o usuário e também para o delegatário, muitas vezes deficitário e que se encontra em locais de difícil acesso. Assim, o e-notariado é vital para a manutenção rápida e eficiente da sociedade, mas ela precisa vir em conjunto com outras políticas públicas de acesso à informatização, educação, plataformas públicas e à internet de alta velocidade. Por isto a importância de que o Conselho Nacional de Justiça, as serventias extrajudiciais e o poder público sentem em mesas de negociação e consigam melhorar tais situações, em conjunto, para o bem da própria sociedade.

 

Jornal do Notário: Como o senhor vê o futuro do notariado?

Robson Martins: Sempre comento com meus amigos que a atividade do Tabelião de Notas, além de ser a mais antiga, verdadeira gênese do extrajudicial, realmente é a mais bonita de todas. Ela deflui a vontade das pessoas, concatena as ideias, subsume os fatos à norma e exterioriza o ato formalmente para posterior registro público. Embora existam pessoas que sejam pessimistas e acreditem no apocalipse da atividade notarial e registral, penso justamente o contrário. O mundo mudou, pessoas não querem mais ficar anos esperando uma sentença ou decisão judicial para conseguir algo simples. Elas precisam dos seus atos para aquele momento, tem prazos curtos para angariar seus anseios. Somente a atividade notarial e registral consegue se adequar a tal praticidade e eficiência, no momento adequado e com capilaridade para tanto, em todos os Municípios do Brasil. São delegatários do serviço público e tem maior flexibilidade, inclusive orçamentária e de gestão de pessoas. O Estado, conquanto seja vital para a regulamentação da vida das pessoas, deve-se ater a atividades vitais, como segurança, fiscalização, educação, justiça e saúde, precisando se aperceber que não é célere, tem regras internas que o tornam muitas vezes ineficiente até para comprar água para a repartição, assim, a ampliação e efetividade dos serviços notariais e registrais é uma realidade presente nos dias atuais, que se tornará, cada vez mais, imprescindível para a sociedade brasileira, que quer e precisa de serviços rápidos e adequados.

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