Com nova resolução do CNJ, inventários com menores podem ser feitos em cartório. MP-SP define regras e prazos para sua atuação. Entenda as mudanças
Com o advento da lei 11.441/071, percebeu-se uma grande desjudicialização2 dos procedimentos de inventário e arrolamento de bens em todo o País. Com a nova normativa, apresentou-se a possibilidade da realização extrajudicial desses procedimentos (inventários, partilhas e arrolamento de bens), ou seja, nos cartórios de notas.3
A realização de um processo de inventário pela via judicial, sempre foi visto, tanto por quem depende da resposta do Estado, como também pelos profissionais que hodiernamente atuam na área, como moroso e burocrático.
Não foram poucos os casos de processos judiciais de inventários suspensos ou mesmo arquivados sem que tenha havido sua finalização.
Em época não tão remota, de se lembrar que o próprio procedimento do protocolo físico de processo judicial era, digamos, um tanto quanto complicado e custoso às vezes (havia custo de tempo, deslocamento, papel, etc), e isso somado a demora na própria prestação jurisdicional que acontece por vários fatores como o alto índice de demandas, a insuficiência do aparelhamento material e humano, dentre outros. Portanto, mesmo em casos considerados simples, cenário muitas vezes comum (e pensemos no simples que já era complexo, com a licença da contradição), havia o fato de falecimento de herdeiros durante o trâmite processual o que concorria ainda mais para sua não finalização.
Após significativa alteração legislativa, eis que surge então a possibilidade da formalização do processo/procedimento do inventário pela via notarial em todo o território nacional. Essa alteração legislativa é de tamanha grandeza de mudança que, não só afasta, por assim dizer, a burocracia do processo de inventário, como também traz celeridade, e enaltece confiança que se espera do ato notarial. Veja que a medida, “afastou” do Poder Judiciário procedimentos correlatos aos inventários que não possuíam impugnação, ou seja, em que há o consenso das partes, trazendo, sem dúvidas, muitos benefícios. Porém, ainda havia um empecilho para uma maior debandada da via judicial de tais procedimentos: a existência de herdeiros menores de idade ou incapazes. Nesses casos em que havia menores ou incapazes, não era possível a sua realização de forma ou pela via extrajudicial, ainda que houvesse consenso de todos os herdeiros, o que demandava levar ao Poder Judiciário a sua realização.
Finalmente, durante a 3ª sessão extraordinária realizada no dia 20 de agosto de 2024 o Plenário do CNJ, aprovou a resolução 571/24 que trouxe significativa mudança quanto aos procedimentos de inventário extrajudicial em que figurem menores de idade e incapazes (além do divórcio e dissolução de união estável). Isso representa, sem dúvidas, celeridade e também segurança às partes envolvidas, prevendo apenas e tão somente a necessidade de autorização do Ministério Público, conforme expõe seu art. 12-A, in verbis:
Art. 12-A. O inventário poderá ser realizado por escritura pública, ainda que inclua interessado menor ou incapaz, desde que o pagamento do seu quinhão hereditário ou de sua meação ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados e haja manifestação favorável do Ministério Público.
§ 1º Na hipótese do caput deste artigo é vedada a prática de atos de disposição relativos aos bens ou direitos do interessado menor ou incapaz.
§ 2º Havendo nascituro do autor da herança, para a lavratura nos termos do caput, aguardar-se-á o registro de seu nascimento com a indicação da parentalidade, ou a comprovação de não ter nascido com vida.
§ 3º A eficácia da escritura pública do inventário com interessado menor ou incapaz dependerá da manifestação favorável do Ministério Público, devendo o tabelião de notas encaminhará o expediente ao respectivo representante. § 4º Em caso de impugnação pelo Ministério Público ou terceiro interessado, o procedimento deverá ser submetido à apreciação do juízo competente.
Ou seja, a resolução deixa claro, para que seja lavrada a escritura pública, a necessidade de apreciação e autorização do Ministério Público do respectivo Estado, prevendo ainda a expressa vedação a diferenciação na partilha, ou seja, a partilha deverá ser no formato “universal”, recebendo o menor seu quinhão hereditário em partes iguais aos demais eventuais herdeiros em cada um dos bens inventariados.
Ciente da necessidade, e também para garantir celeridade do procedimento extrajudicial, à luz da resolução do CNJ, o Ministério Público do Estado de São Paulo editou prontamente a resolução 1.919/24 em 18 de setembro de 20244, estabelecendo o procedimento de comunicação entre a Instituição e os cartórios de notas no Estado.
Pela resolução, o Tabelião de Notas deverá encaminhar a minuta do inventário com todos os documentos por meio eletrônico, devendo seguir rigorosamente os prazos para a manifestação ministerial e em caso de aprovação, deverá fazer menção junto a escritura pública da autorização outorgada. Havendo discordância, o Tabelião deverá remeter o procedimento ao juízo competente para sua apreciação e decisão.
No entanto, posteriormente, a Procuradoria Geral de Justiça-CGMP editou nova resolução de 2.051 de 25 de abril de 2025, considerando a necessidade de aprimorar a forma pela qual se dará a manifestação do Ministério Público no inventário extrajudicial, com o objetivo de garantir a celeridade desse processo e fomentar a desjudicialização, em que estabeleceu novas relevantes mudanças no procedimento, restando expresso que o menor receberá seu quinhão em parte igualitária em cada bem e havendo valores em dinheiro, deverá constar que seu levantamento só poderá ser realizado mediante autorização judicial ou maioridade.
Nesse ponto, cabe uma reflexão: Seria possível a realização da partilha de forma diversa da modalidade universal e igualitária, visto que o §2º do art. 8 da resolução 1.919/24 expõe que o “O promotor de Justiça poderá se opor à minuta de escritura” fazendo menção acerca da partilha igualitária?
Antevendo a própria resolução 571/24 do CNJ, essa condição de oposição deverá ser absoluta, na medida que seu art. 12-A expressa a necessidade de que o quinhão hereditário ou meação ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados.
Assim, a priori, é vedada qualquer partilha desigual mesmo havendo consensualidade dos genitores dos menores e demais herdeiros. Além disso, rememoremos que menores são considerados incapazes5, denominando-se menores impúberes. Desta forma até mesmo para atos judiciais (no caso, inventário ou arrolamento) há necessidade da figura dos representantes legais, já que são eles que podem gerir a vida do menor, sempre com a intervenção legal do Ministério Público.
Fato é, portanto, que independente da possibilidade ou não da partilha desigual, essa nova possibilidade de desjudicialização com toda certeza mudará definitivamente o procedimento de inventário.
Não há volta: o afastamento do judiciário de inúmeros casos em trâmite além dos novos procedimentos permite desafogar o sistema judicial e trazer a celeridade dos cartórios para todos as partes, inclusive para os advogados.
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1 Altera dispositivos da lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – CPC, possibilitando a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa. Publicada no D.O.U em 5/1/2007.
2 Movimento em que há a transferência ou deslocamento de competência/atribuição (mediante lei ou resolução) antes privativa dos Tribunais por exemplo, para outras esferas públicas ou privadas.
3 O Cartório de Notas, também conhecido como tabelionato de notas ou serviço notarial, nada mais é do que um estabelecimento onde podem ser elaborados instrumentos públicos, como lavratura de escrituras, tais como compra e venda de imóveis, doação de imóveis, divórcios, inventários, instituição de usufruto, instituição de emancipação, entre outros.
4 Resolução 1.919/24-PGJ, de 18/9/2024. Dispõe sobre a manifestação do Ministério Público em escrituras públicas de inventário e partilha extrajudiciais com menores ou incapazes. Publicada: Diário Oficial do Estado de São Paulo: caderno executivo – seção atos normativos, São Paulo: PRODESP, 19/09/2024, retificada no D.O.E. do dia 20/9/2024.
5 Art. 3 o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Fonte: Migalhas
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