No último 15 de setembro, a Corregedoria Nacional de Justiça publicou o Provimento nº 150/23, com o objetivo de estabelecer e regular os procedimentos relacionados a adjudicação compulsória de imóvel pela via extrajudicial. A adjudicação compulsória consiste em uma medida legal que permite que um comprador ou um vendedor adquira ou transfira, respectivamente, a propriedade de um imóvel prometido em contrato, ainda que a contraparte se recuse a cumprir sua parte do acordo. O Provimento 150 publicado recentemente dispõe sobre referida medida legal, quando utilizada de forma extrajudicial, ou seja, sem a necessidade de ajuizamento de uma ação perante o Poder Judiciário.
O instituto jurídico da adjudicação compulsória extrajudicial foi incluído no ordenamento jurídico por meio da Lei nº 14.382 de 2022, mediante a introdução do artigo 216-B na Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015 de 1973). O novo provimento desempenha um papel importante ao aprofundar os requisitos formais e materiais necessários para o ingresso do procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial, bem como ao detalhar as diretrizes e procedimentos introduzidos pela Lei nº 14.382 de 2022.
O Brasil enfrenta um grande desafio no que se refere à regularização de imóveis, sendo bastante comum a realização de acordos privados sem a posterior escrituração e registro da transmissão da propriedade dos imóveis, pelo promitente vendedor ao promitente comprador. A ausência de escrituração e registro dos imóveis objeto de acordos e promessas de compra e venda (e de instrumentos correlatos) prejudica e, por vezes, impede os respectivos adquirentes de disporem de seus ativos (i.e., transmitirem seus imóveis a terceiros, darem seus imóveis em garantia, registrarem contratos de locação etc.), vez que não há, junto às matrículas de referidos imóveis, o registro atual de sua propriedade. Nesse sentido, o Provimento 150 representa um importante marco infralegal no que se refere à desburocratização dos procedimentos necessários à regularização de imóveis no país.
No que se refere à aplicabilidade de referido instituto jurídico, vale destacar que a adjudicação compulsória extrajudicial poderá ser utilizada quando verificado o descumprimento de instrumentos de promessa de compra e venda, promessa de permuta, bem como eventuais cessões ou promessas de cessão, ocasionando na não celebração do título de transmissão da propriedade plena de determinado imóvel, e desde que não haja direito de arrependimento nos acordos e negócios celebrados.
Podem requerer a adjudicação compulsória extrajudicial o comprador ou qualquer dos seus cessionários e sucessores ou então, o vendedor, hipótese da adjudicação compulsória inversa, sendo certo que a parte requerente deverá, necessariamente, ser representada por um advogado.
O pedido deverá ser instruído com os seguintes documentos: 1) instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão; 2) prova do inadimplemento (i.e., da não celebração do título de transmissão da propriedade plena) no prazo de 15 dias contados da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel; 3) ata notarial, lavrada por tabelião de notas, contendo a identificação do imóvel, o nome e a qualificação da parte interessada, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de transmitir ou receber o título de propriedade; 4) certidões forenses emitidas na comarca na qual se localiza o imóvel e na comarca de domicílio do requerente, que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato que fundamentou o pedido de adjudicação; 5) comprovante de pagamento do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), a ser apresentado antes do registro do título no Registro de Imóveis; e 6) procuração com poderes específicos.
Importante observar o artigo 440-G do Provimento 150, que aprofunda os requisitos que deverão ser considerados quando da elaboração da ata notarial acima mencionada, dos quais destacamos: 1) a referência à matrícula ou à transcrição, e a descrição do imóvel com seus ônus e gravames; 2) a identificação dos atos e negócios jurídicos que dão fundamento à adjudicação compulsória; 3) as provas do adimplemento integral do preço ou do cumprimento da contraprestação à transferência do imóvel; e 4) a identificação das providências que deveriam ter sido adotadas pelo requerido para a transmissão de propriedade e a verificação de seu inadimplemento. Ainda, esse mesmo artigo indica, em seus parágrafos e incisos seguintes, informações adicionais relacionadas a ata notarial acima mencionada, bem como disciplina o passo a passo a ser adotado pelo Cartório de Registro de Imóveis quando da apresentação do requerimento.
A Seção II, Subseção I do Provimento 150, diz respeito ao procedimento em si, que se inicia mediante a apresentação dos documentos acima indicados junto ao Cartório de Registro de Imóveis. O processo poderá ser realizado tanto por meio físico como por meio eletrônico, via Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (Serp). Por fim, ressalta-se que o requerimento deverá conter, expressamente, o pedido de que o requerido seja notificado a se manifestar, no prazo de 15 dias úteis.
Ato contínuo, o Cartório de Registro de Imóveis verificará se o requerimento atende aos requisitos da Lei 14.382 de 2022 e do Provimento 150 e, em caso positivo, aprovará o pedido e dará andamento no procedimento, sendo o cartório o responsável por notificar o requerido sobre a adjudicação compulsória pretendida. A anuência do requerido poderá ser declarada por instrumento público ou particular, assinado fisicamente ou por meio eletrônico. Ainda, referida anuência poderá ser declarada perante o oficial de registro de imóveis, em cartório, ou perante o preposto encarregado da notificação. Alternativamente, o requerido poderá apresentar uma impugnação ao pedido de adjudicação compulsória, por escrito, no prazo de 15 dias úteis.
Não havendo impugnação ou superada eventual impugnação, o oficial de registro de imóveis expedirá uma nota devolutiva ao requerente para que sejam verificadas e superadas eventuais exigências que ainda existirem em relação ao procedimento pretendido; ou então deferirá ou rejeitará o pedido, em nota fundamentada, no prazo de até dez dias úteis.
Nota-se que tanto a Lei de Registros Públicos (Lei Federal nº 6.015 de 1973) como o Provimento 150 têm o intuito de promover um maior dinamismo na regularização de imóveis, bem como para arejar procedimentos anteriormente exclusivos do sistema judiciário, permitindo um maior acesso e engajamento da população junto aos tramites de regularização fundiária, ao implementar o procedimento extrajudicial analisado no presente artigo. Desse modo, há grandes expectativas de que o advento do instituto jurídico da adjudicação compulsória extrajudicial seja uma importante ferramenta de transformação do cenário de irregularidade fundiária atualmente existente no país.
Fonte: Conjur
Deixe um comentário