A evolução tecnológica exige atualização do Direito para aceitar assinaturas eletrônicas, refletindo a realidade digital. A lei 14.063/20 classifica as assinaturas eletrônicas como dados eletrônicos ligados a outros, utilizados para assinar atos jurídicos

 

“Os tempos mudaram. A evolução tecnológica contemporânea condena veemente que o Direito continue a exigir dos indivíduos solenidades fisicamente presenciais para a prática de atos jurídicos quando as relações sociais e comerciais migraram substancialmente para formas de comunicação remotas. O Direito não pode esquecer de sua origem e vocação e caminhar em descompasso com a realidade: O Direito nasce dos fatos, como ensinavam os romanos (ex facto oritur jus)” 1.

 

A assinatura eletrônica é um exemplo claro dessa evolução tecnológica e tem se tornado cada vez mais relevante na era digital, facilitando transações de forma segura e eficiente.

 

  1. Classificação das assinaturas eletrônicas

 

A lei 14.063/202 define a assinatura eletrônica como “os dados em formato eletrônico que se ligam ou estão logicamente associados a outros dados em formato eletrônico e que são utilizados pelo signatário para assinar, observando-se os níveis de assinaturas apropriados para os atos previstos nesta lei”.

 

As assinaturas eletrônicas são classificadas conforme o nível de confiança transmitido. Assim, quanto maior a confiança, maior a certeza sobre a identidade e a manifestação de vontade do titular da referida assinatura.

 

Nesse contexto, a assinatura eletrônica simples permite identificar o signatário e associar dados a outros dados em formato eletrônico do signatário. Devido ao menor grau de confiabilidade, essa modalidade pode ser admitida nas interações com o ente público de menor impacto e que não envolvam informações protegidas por grau de sigilo.

 

Já a assinatura eletrônica avançada utiliza certificados não emitidos pela ICP-Brasil ou outros meios de comprovação da autoria e integridade dos documentos em forma eletrônica, desde que admitidos pelas partes como válidos ou aceitos pela pessoa a quem o documento é oposto, sendo suas principais características a associação unívoca ao signatário e a utilização de dados para a criação da assinatura que o signatário controla com elevado nível de confiança.

 

Por fim, a assinatura eletrônica qualificada utiliza certificado digital conforme o § 1º do art. 10 da MP 2.200-2/013.

 

A assinatura eletrônica qualificada é admitida em qualquer interação eletrônica com os entes públicos, sem necessidade de cadastramento prévio. Por ser a mais confiável, pode ser utilizada nas situações em que se admitem as demais assinaturas. Seu uso é obrigatório em atos assinados por chefes de Poder, ministros de Estado, titulares de Poder ou de órgão autônomo de ente federativo, na emissão de notas fiscais eletrônicas (exceto para pessoas físicas ou MEIs, onde é facultativo), atos de transferência e registro de bens imóveis, e outras hipóteses previstas em lei.

 

A Medida Provisória 2-200-2/01, instituiu a ICP-Brasil – Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira e estabeleceu que assinaturas digitais geradas por certificados emitidos pela ICP-Brasil têm presunção legal de validade. Entretanto, a MP também reconhece a validade de sistemas de certificação não vinculados à ICP-Brasil, desde que as partes envolvidas aceitem esse método e assegure níveis adequados de segurança. Essa flexibilidade permite a utilização de outras formas de assinatura eletrônica, alinhando-se aos princípios da autonomia privada e da liberdade contratual e da instrumentalidade das formas.

 

A validade das assinaturas eletrônicas feitas fora do âmbito da ICP-Brasil, desde que aceitas pelas partes, está expressa no art. 10, §2º, da Medida Provisória 2-200-2/01, o qual permite a aceitação de métodos alternativos de assinatura, respeitando a liberdade das partes envolvidas no acordo ou contrato eletrônico, desde que os referidos métodos garantam a segurança das transações.

 

Dessa forma, o art. 10, §2º, da MP 2-200-2/2001 é a base legal para assinaturas eletrônicas no âmbito da plataforma e-Notariado, cuja classificação é considerada como assinatura avançada, em linha com as disposições da lei 14.063/20.

 

Além das modalidades de assinaturas eletrônicas acima, uma inovação foi a criação da plataforma e-notariado.

 

  1. plataforma e-Notariado

 

O e-Notariado é uma plataforma de integração digital dos notários brasileiros, que permite a prática dos atos notarias de forma eletrônica e a distância, possibilitando o acesso e a popularização do certificado digital no Brasil, pois prevê a confecção gratuita do certificado digital notarizado, que permite a prática de todos os atos notariais no âmbito da plataforma4.

 

A plataforma e-Notariado5, instituída para modernizar os serviços notariais, é gerida pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal, dotada de infraestrutura tecnológica necessária à atuação notarial eletrônica, com o objetivo de:

 

interligar os notários, permitindo a prática de atos notariais eletrônicos, o intercâmbio de documentos e o tráfego de informações e dados;

aprimorar tecnologias e processos para viabilizar o serviço notarial em meio eletrônico;

implantar, em âmbito nacional, um sistema padronizado de elaboração de atos notariais eletrônicos, possibilitando a solicitação de atos, certidões e a realização de convênios com interessados.

O Sistema de Atos Notariais Eletrônicos (Procurações Públicas; Escritura Pública; Ata Notarial; Escritura de Compra e Venda; Alienação Fiduciária; entre outros) utiliza tecnologia para autenticar documentos online, garantindo integridade e plena validade jurídica.

 

Os atos notariais eletrônicos reputam-se autênticos e detentores de fé pública, conforme estabelecido pelo art. 411, inciso II, do CPC, “Considera-se autêntico o documento quando a autoria estiver identificada por qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei” (BRASIL, 2015).6

 

O avanço da digitalização tem permeado todas as esferas da sociedade, incluindo o setor jurídico, razão pela qual a plataforma e-Notariado se destaca como uma ferramenta fundamental para a realização de atos notariais de forma eletrônica. Esse desenvolvimento coincide com os esforços de modernização legislativa, como é evidenciado no projeto de reforma do Código Civil brasileiro, que dedica um capítulo exclusivo para o e-Notariado7. Este projeto visa adaptar a legislação às novas realidades tecnológicas e sociais, refletindo as mudanças necessárias para abraçar as possibilidades que a tecnologia oferece.

 

A integração do e-Notariado por meio do projeto de reforma do Código Civil representa um passo significativo para alinhar práticas notariais com os padrões digitais contemporâneos, ao oferecer um sistema de assinatura eletrônica que garante segurança jurídica e autenticidade, o e-Notariado facilita uma transição para um ambiente seguro, ágil e acessível.

 

III. Certificado Digital Notarizado

 

A plataforma e-Notariado disponibiliza um serviço gratuito de emissão de certificado digital notarizado – identidade digital de uma pessoa física ou jurídica, identificada presencialmente ou por videoconferência, por um notário a quem se atribui fé pública.

 

Com este certificado é possível assinar digitalmente, por meio do e-assina, atos notariais eletrônicos na plataforma do e-notariado. Além dos atos notarias propriamente ditos é possível assinar instrumentos contratuais, a exemplo de escrituras públicas de financiamento imobiliário com pacto adjeto de alienação fiduciária8-9.

 

Nesse sentido, a utilização do e-Assina, ferramenta do e-Notariado, em contratos digitaliza e simplifica o processo, permitindo a assinatura de contratos de maneira eletrônica com validade jurídica. Isso traz vantagens como a redução de tempo e custos, além de aumentar a segurança das transações, garantindo autenticidade e integridade dos documentos assinados eletronicamente.

 

Esse avanço representa um passo significativo na modernização das práticas imobiliárias, oferecendo maior comodidade e eficiência para todas as partes envolvidas.

 

  1. Conclusão

 

A utilização da plataforma e-Notariado como ferramenta para a assinatura de instrumentos contratuais representa um avanço significativo no setor financeiro e jurídico, alinhando-se com as tendências contemporâneas de informatização e segurança de processos.

 

A referida plataforma não só oferece uma alternativa eficiente e segura para a realização de atos notariais de forma eletrônica, mas também amplia o acesso aos serviços notariais, democratizando-os e tornando-os mais acessíveis para um público mais amplo.

 

O e-Notariado proporciona uma infraestrutura que garante a autenticidade e a integridade dos documentos assinados, fundamentais para celebração de contratos, onde a segurança jurídica é primordial. A validade jurídica das assinaturas eletrônicas realizadas através desta plataforma é assegurada pela legislação brasileira, especialmente pela lei 14.063/20 e pela MP 2.200-2/01, que estabelecem os parâmetros para as assinaturas eletrônicas e a ICP-Brasil.

 

Ao oferecer a possibilidade de realizar assinaturas de maneira eletrônica, a plataforma e-Notariado contribui para a redução de custos operacionais e de tempo. Além disso, essa ferramenta aumenta a eficiência dos processos ao eliminar a necessidade de presença física e utilização de documentos impressos, reduzindo também o impacto ambiental associado ao uso extensivo de papel.

 

Dessa forma, ao final, é possível concluir que a utilização da plataforma e-Notariado no processo de assinatura de instrumentos contratuais não apenas se alinha com as necessidades do mercado moderno por soluções tecnológicas, mas também reforça o compromisso com a inovação, a segurança e a eficiência nas relações jurídicas contratuais.

 

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1 OLIVEIRA, Carlos E. Elias de; BENÍCIO, Hercules Alexandre da Costa. Assinatura eletrônica nos contratos e em outros atos jurídicos. Migalhas, 20 jul. 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-contratuais/330879/assinatura-eletronica-nos-contratos-e-em-outros-atos-juridicos. Acesso em: 14 abr. 2024.

 

2 Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020. Dispõe sobre o uso de assinaturas eletrônicas em interações com entes públicos, em atos de pessoas jurídicas, em questões de saúde e em sistemas de certificados digitais. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 24 set. 2020.

 

3 Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001. Institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, transforma o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação em autarquia, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 ago. 2001.

 

4 Sistema eletrônico do registro público e sua regulamentação/ coordenação Luiz Felipe Salomão; autores Allan Nunes Guerra …[et al]. – 1.ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2024.p 110-111.

 

5 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Provimento nº 149, de 30 de agosto de 2023. Institui o Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), que regulamenta os serviços notariais e de registro. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5243. Acesso em: 14 abr. 2024.

 

6  BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União: seção 1, p. 1, 17 mar. 2015.

 

7  https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?codcol=2630, acesso em 15 abr. 2024

 

8  BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Art 17[…], § 1º O acesso ou o envio de informações aos registros públicos, quando realizados por meio da internet, deverão ser assinados com o uso de assinatura avançada ou qualificada de que trata o art. 4º da Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

  • 2º Ato da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça poderá estabelecer hipóteses de uso de assinatura avançada em atos que envolvam imóveis. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

BRASIL. Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020. Dispõe sobre o uso de assinaturas eletrônicas em interações com entes públicos, em atos de pessoas jurídicas, em questões de saúde e em sistemas de certificados digitais. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 24 set. 2020. Art. 17-A. As instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública e os partícipes dos contratos correspondentes poderão fazer uso das assinaturas eletrônicas nas modalidades avançada e qualificada de que trata esta Lei (Incluído pela Lei nº 14.620, de 2023)

 

Fonte: Migalhas

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